Paulo Serra
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O país
dos paradoxos
Se tivesse de dar um cognome ao Portugal de hoje, chamar-lhe-ia
“o país dos paradoxos”. Para não
enfadar o leitor com os milhares de exemplos que poderia
aqui deixar, vou referir-me apenas a um deles. O actual
Governo – ou será já ex-governo? –
fez do combate ao défice o seu grande e quase único
objectivo. Nas várias medidas concretas para o
combate a esse défice situava-se o redimensionamento
da rede do ensino superior. Havia instituições
de ensino superior a mais, cursos a mais e alunos a menos,
dizia-se. E, em muitos aspectos, não sem razão
– embora sem indicar as razões dessa razão,
a maior parte das quais remonta à “política”
(?) de ensino superior do governo de Cavaco Silva - exactamente
o mesmo que mandou construir os IPs ao lado dos quais
se constróem, agora, auto-estradas.
Eis senão quando o país é surpreendido
com o anúncio da criação de uma Universidade
Pública em Viseu – em Viseu, pasme-se, que
já tem três instituições do
ensino superior.
O argumento publicamente invocado por Durão Barroso,
para tal criação, foi o de que se tratava
(trata) tão-só do cumprimento de uma promessa
eleitoral. Mas contra esse argumento bastaria lembrar
que, e para referir apenas este aspecto, também
a redução dos impostos foi uma promessa
eleitoral, e das não menos importantes.
Mas como um paradoxo nunca vem só, os jornais da
última semana noticiaram que o site do Ministério
da Educação prevê a criação
de mais um série de Escolas de Ensino Superior
um pouco por todo o país (não verifiquei
se a pequena aldeia onde nasci também é
contemplada, mas é muito possível).
Poder-se-á invocar, em relação à
criação destas Escolas, que elas são
indispensáveis para um desenvolvimento mais equilibrado
do país, e que se trata, por conseguinte, de “investimento
público produtivo”. Mas esse é um
dos principais argumentos que o actual governo responsabiliza
pelo défice que afirma querer combater –
pelo que não fará muito sentido invocá-lo.
Há, é claro, uma forma de explicar os paradoxos
anteriores – e muitos outros que hoje por aí
andam à solta. Diríamos, adaptando um célebre
dito de Pascal, que a política tem economias que
a economia desconhece. Por outras palavras: parece hoje
cada vez mais evidente que a verdadeira justificação
da invocação do “défice”
e do “combate ao défice” não
é económica, mas política –
trata-se, em sentido pleno, daquilo a que, no seu tempo,
Marx chamava “economia política”. Em
linguagem mais comum: lá ele haver défice,
há; resta é saber para quê e para
quem...
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