O administrador dos SASUBI tem planos para o futuro da Acção Social
Entrevista com o Administrador dos Serviços de Acção Social, Silva Raposo
"A bolsa não substitui o apoio dos pais ou familiares”

Silva Raposo falou ao Urbi et Orbi do cargo que ocupa há quase 19 anos na UBI e das dificuldades decorrentes dos cortes orçamentais.


Por Ana Maria Fonseca e Daniel Sousa e Silva


Urbi et Orbi - Quais são as decisões que tem de tomar enquanto administrador dos Serviços de Acção Social (SASUBI)?
Silva Raposo- Esta é uma das funções mais ingratas da universidade. É o primeiro choque que os alunos têm com os serviços prestados.
Costumo dizer que são duas as pessoas mais criticadas nesta universidade: o administrador dos serviços sociais, e o director dos serviços académicos. São os dois sítios onde o serviço prestado é muito controlado e julgado pelo aluno. Depois é o conceito de que a acção social tem de ser gratuita. Este serviço implica gerir 300 mil refeições por ano, 470 camas, que com as da nova residência passarão para 800, gerir as bolsas de estudo...
O orçamento do Estado dá para bolsas de estudo e para pagar ao pessoal, não dá para mais nada.
Depois há as receitas próprias, que cobramos na refeição nas cantinas, cujo preço é definido pelo Estado, nós adoptamos o preço mínimo. Depois nas outras unidades alimentares há outros pratos. Estipulam-se preços também abaixo do preço de custo e assim tenta-mos facilitar a vida ao aluno.
Relativamente às bolsas, a nível das universidades públicas, somos, a seguir à Madeira, os serviços de acção social com maior percentagem de bolseiros. Este ano devemos rondar os 1700 bolseiros, cerca de 36 por cento. Isto significa que mais de um aluno em cada três é bolseiro.
A função de administrador é bonita, porque presta apoio aos estudantes e, ao mesmo tempo, ingrata.

U@O- O que mais lhe agrada e desagrada nesta função?
S.R.- Isto é a frustração de um economista. A minha função é reduzir custos. E tentar gerir interesses, porque quando se sobe o preço de uma coisa tem de se baixar o de outra e vice-versa.
As decisões têm de ser tomadas, mas muitas vezes o estudante, ou o utente da cantina ou do bar acha que está tudo caro. Só que desconhece que o dinheiro que vem do Estado e o que ele manda subsidiar, são bolsas de estudo a fundo perdido. Põe um preço fixo para os bolseiros nas residências e depois estipula um preço mínimo para as refeições nas cantinas. A partir daí liberta-se, e nós temos de gerir o que nos resta.

U@O- Os bares e as cantinas podem realmente ser considerados sociais ou esse conceito não é bem compreendido pelos estudantes?
S.R.-
A refeição de cantina é subsidiada, essa é que é verdadeiramente social. Depois, se uma refeição nas cantinas e nos snacks, fica ao final do ano em cerca de 3 euros, tendo em conta custos de funcionamento, e se um utente paga uma refeição abaixo dos 3 euros, está a pagar um preço social.
Quando o aluno diz que o café ou que a sandes são caros, não entende que não é o custo do pó do café que está em causa, mas todos os custos com o funcionamento.
Se o orçamento que vem do Estado dá para pagar ao pessoal, o funcionamento das residências, das cantinas, toda a comida e toda a bebida, tem de ser centrado nas receitas que se geram.

U@O- Com os cortes efectuados este ano e o aumento das propinas, as bolsas serão suficientes, principalmente no que diz respeito aos alunos mais carenciados?
S.R.-
A bolsa média irá situar-se entre os 125 e os 135 euros, é pequena. A bolsa não substitui o apoio dos pais ou familiares. Nós temos uma das maiores percentagens de bolseiros, mas a bolsa é uma ajuda, um apoio e, segundo o programa e as decisões que o Governo está agora a adoptar, a bolsa de estudo é uma ajuda que o aluno, mais ou menos carenciado recebe, conforme o rendimento per capita definido a nível nacional. O estado resolveu que o bolseiro irá receber dos Serviços de Acção Social todos os meses um duodécimo da propina mínima que irá pagar. O diferencial do que os SASUBI dão ao bolseiro, será depois entregue directamente à instituição pelo Ministério.
Mas penso que as bolsas são pequenas. Talvez fosse preferível haver menos, mas melhores bolsas. Naturalmente, a bolsa mínima dá para pagar a propina, a bolsa máxima pode ir até aos cerca de 350 euros.

U@O-Relativamente à concessão da Cantina da Boavista, que balanço faz passado mais de um ano?
S.R.-
Posso-lhe dizer que depois da concessão, a Cantina da Boavista é capaz de produzir refeições mais baratas que nós. O pessoal no regime privado trabalha oito horas. Na função pública trabalham sete.
Em segundo lugar, a concessão obri-gounos a um patamar de controlo de qualidade que não tínhamos até aqui. Neste momento temos inspecções regulares da direcção geral da qualidade alimentar, e obrigaram-nos a obras de reformulação. Agora, os circuitos de quem fornece refeições públicas são mais rigorosos do que na nossa casa, ou do que num café ou snack da cidade.
Claro que alguns estudantes continuam a criticar e recebo sugestões e críticas todas as semanas.
Mas hoje, o aluno da UBI tem várias opções. Se quer comer uma refeição social numa cantina, tem essa possibilidade. Pode ir a um snack, onde tem diversos patamares de qualidade. Tem serviço de buffet na Ernesto Cruz, e ao fim de semana, se quiser, vai comer ao restaurante com a senha da cantina. Tem quatro à escolha na cidade.
Nós estamos a tentar fornecer uma refeição minimamente de qualidade, e não uma refeição topo de gama, é uma refeição normal, o mais higiénica possível. A nível do controlo higiénico-sanitário não tenho dúvidas. As cantinas dos serviços sociais, devido às obras que tivemos de fazer e à implantação do sistema de controle de qualidade, são dos sítios onde os controlos estão a ser feitos com mais rigor.

U@O- Existe a possibilidade, apontada pelo Reitor, de construir uma residência (junto à futura Faculdade de Ciências da Saúde) em parceria com privados. O que pensa dessa hipótese?
S.R.-
Estou totalmente de acordo com tudo o que seja construir estruturas para apoiar a universidade. Neste momento temos uma residência em fase de conclusão, a Pedro Álvares Cabral. Passamos a ter uma melhor oferta para os alunos deslocados, com cerca de 800 camas. É quase duplicar a capacidade que temos hoje em dia.
O ideal seria construir mais residências, mas dada a crise que atravessamos, não vejo a curto prazo o Estado a apoiar mais residências. Tenho todo o interesse em criar mais residências, seja em parceria com privados ou não, mas também poderá ser construída noutro local da cidade.
De qualquer forma, e dada a contenção que existe, há prioridades, como o desporto e a saúde, por exemplo.

U@O- Quando estará concluída a residência Pedro Álvares Cabral e como está estruturada?
S.R.-
Penso que em Janeiro deverá estar concluída. Quando puder abrir, abrirá, mesmo sabendo que a meio do ano os alunos já têm quartos.
Na residência nova, os quartos têm uma estrutura tipo duplex, camas em cima e secretárias em baixo. Cada conjunto de dois quartos, tem um hall com casa de banho comum. No corredor abre-se uma porta para esse hall e daí para os quartos, ou seja, cada conjunto de quatro utentes terá uma certa privacidade.
Penso que este é um sistema muito agradável, e que a residência é muito bonita. Ao fim de cada piso há uma cozinha e uma sala de estudo.
Hoje em dia confunde-se muito a residência com um apartamento, mas não se pode, em nenhuma residência cozinhar nos quartos, excepto nos apartamentos que têm cozinha própria. Esta residência vai ter apoio de cozinha ao final do piso, onde o aluno poderá perfeitamente aquecer leite, fazer uma sandes, etc..
Penso que o sistema é agradável e vai funcionar muito bem.

U@O- Como gostaria de ver os Serviços de Acção Social daqui a alguns anos?
S.R.-
Gostaria, a nível pessoal, que os SASUBI, fossem os melhores do País, a nível de serviços e qualidade. Gostaria de ir à procura do que os utentes precisam. Penso que a Acção Social está a modificar-se e que deveria diversificar-se por três grandes áreas: saúde, desporto e cultura. Vamos tentar duplicar o apoio a nível de planeamento familiar, onde há listas de espera. Também tentaremos fazer acordos para apoio psicológico. Depois, na área desportiva, queremos implementar uma variedade de oferta. Se tivéssemos verbas, apostaríamos na cultura. Sou a favor da promoção de trocas culturais entre universidades portuguesas e estrangeiras.
Também gostaria que houvesse uma espécie de provedor, uma pessoa que conseguisse detectar as necessidades dos utentes. Poderia ser mesmo um aluno.
É preciso saber qual é o principal problema do aluno e tentar resolvê-lo.





Perfil



Nasceu e cresceu no Ferro. Só saiu desta aldeia próxima da Covilhã para estudar no liceu de Castelo Branco, seguindo depois para o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, em Lisboa, onde se licenciou em Finanças. “Foi este o meu percurso estudantil, com a tropa pelo meio. Fiquei no Ultramar durante quatro anos”, lembra.
Depois da licenciatura, em 1973, teve de optar entre ficar em Lisboa numa empresa multinacional, ou aceitar o convite do fundador do Instituto Politécnico da Covilhã, Duarte Simões para o Grupo de Trabalho e Planeamento da Cova da Beira. “Era um grupo que fazia estudos e planeava o desenvolvimento da Cova da Beira e, na altura, vim fazer estudos na área das empresas do sector têxtil”, recorda.
No ano seguinte, 1974, ingressou no então Instituto dos Têxteis que tinha um gabinete de estudos e licenciava o comércio a nível de importações e exportações têxteis. “Estava ao mesmo tempo na área do licenciamento e no Gabinete de Estudos”, refere. Nesse intervalo, foi docente durante um semestre no então Instituto Politécnico da Covilhã. “O Dr. Duarte Simões praticamente obrigou-me”. Leccionou a disciplina de Planeamento Regional e Corporativismo. “Na altura era chefe de divisão do Gabinete do Instituto de Estudos e Licenciamento do Comércio, da delegação do Instituto dos Têxteis da Covilhã”. Aí permaneceu até 1985, altura em que foi convidado para dirigir os Serviços de Acção Social. “Já lá vão quase 19 anos”.
Desde aí, Silva Raposo tem exercido a sua função como administrador “acompanhando a evolução dos serviços. De 85 para cá, cresceu e mudou muito, a nível de alunos, de funções, e de serviços prestados”, sublinha.
Nos tempos livres, o administrador foge para o campo, ao encontro das suas árvores de fruto. “Tenho umas cerejeiras e umas oliveiras e assim me entretenho”.
Silva Raposo afirma-se “regionalista a 100 por cento. Penso que a Beira Interior é hoje um dos sítios onde pode haver uma qualidade de vida superior até à dos grandes centros, e sou defensor de toda a descentralização possível para que a nossa região não seja sempre aquela região pobre e esquecida dos poderes políticos”, defende.