A Veneza

Algarvia




Tavira










Por Nélia Sousa



Das ameias do histórico castelo a vista abrange um infindável panorama que se estende pela Ria Formosa e pelo Oceano Atlântico, recortado, aqui e ali, pelos triângulos dos típicos telhados de tesoura e pelas torres das múltiplas igrejas que fazem de Tavira a cidade religiosa por excelência. As 32 igrejas são um importante testemunho da forte devoção católica do povo algarvio. Quem visitar a "cidade das igrejas", nome pela qual é designada, não pode deixar de visitar os seus valiosos monumentos.
O meio de transporte ideal para chegar a Tavira é, sem dúvida, o comboio. Tome-o em Faro e deixe-se envolver pela beleza paisagística que esta zona oferece, começando pela pureza intocável do Parque Natural da Ria Formosa, seguindo-se as múltiplas salinas, as extensas hortas embelezadas pelo oiro das laranjas, as charnecas cobertas de figueiras e amendoeiras, as casas brancas e as chaminés algarvias, um autêntico legado deixado pelos árabes.
Chegando à estação ferroviária, a nossa sugestão para iniciar a viagem por esta cidade, recheada de arte e história, passa pela Avenida Dr. Teixeira de Azevedo. Depois de a percorrer, encontra no lado sul a Praça Zacarias Guerreiro onde está situada a Igreja de São Francisco. De origem medieval a Igreja e o Convento de São Francisco, o mais antigo da cidade e talvez mesmo de todo o Algarve, pertenceram aos Templários até 1312. Uma grande janela de moldura ogival é o elemento mais interessante no troço do edifício. Siga agora em direcção à Rua Tenente Couto, na face leste da Praça Zacarias Guerreiro. Aqui depara-se com a Igreja de São José do Hospital, construída no final do século XVIII e de onde se destaca o portal em estilo "rocaille", o altar-mor, com pinturas em "trompe l'oeil", e algumas esculturas do século XVIII. Anexa está a antiga Ermida de São Brás com uma abóbada manuelina. Desça agora a Rua Tenente Couto e entre na Rua da Liberdade onde avistará a Ermida de Nossa Senhora da Consolação dos Presos cujo património é constituído por azulejos polícromos dos séculos XVI/XVII e por uma harmoniosa imagem da padroeira. Finda a visita rume à Rua D. Paio Peres Correia, conquistador da cidade aos mouros. Começe por visitar a Igreja de Santiago, erguida, segundo a tradição, no local da mesquita menor. Arquitectónicamente pobre, as suas maiores riquezas cingem-se às peças de arte sacra e às talhas do retábulo da capela-mor ou da capela das Almas. Um pouco mais acima avista a Igreja de Santa Maria do Castelo, provavelmente construída no local da antiga mesquita. A sua edificação data do século XIII, mas foi alvo de algumas transformações devido ao terramoto de 1755. Segundo a história, foi nesta igreja que os filhos de D. João I foram armados cavaleiros, após a conquista de Ceuta. Na capela-mor encontra-se o túmulo de D. Paio Peres Correia e dos sete cavaleiros cristãos assassinados pelos mouros.
Ao lado da igreja encontra-se o Castelo, antiga fortificação moura, reconstruído por D. Dinis no século XIII. Bem conservado, o Castelo é hoje um belo espaço ajardinado oferecendo a quem o visita um vasto panorama sobre Tavira e a paisagem circundante.
Em seguida, desça a Travessa da Fonte. Ao fundo avista o melhor edifício renascença do Algarve, a Igreja da Misericórdia. Destaca-se o interessante pórtico, tendo ao centro a imagem de Nossa Senhora da Misericórdia. Lateralmente estão os escudos de Portugal e de Tavira e dois altos relevos representando São Paulo e São Pedro. Interiormente é revestida por interessantes azulejos do século XVIII.
Tome agora a Rua Dr. Marcelino Franco e visite a Ermida de São Pedro Gonçalves Telmo (ou das Ondas), contígua à Casa de Pescadores, antiga dependência do Compromisso Marítimo. Pensa-se ter sido construída no reinado de D. Manuel I.
Parta agora à aventura, caminhando pelas ruas estreitas, terreiros e becos, bairros populares, cheios de lojas e mercearias oferecendo aos turistas um pouco dos produtos típicos algarvios. Espante-se com a invulgaridade das portas de reixa, fruto da influência mourisca. Adornadas com desenhos geométricos, estas portas possuem uma portada interior, com a função de encerrar o espaço, e outra exterior, com um rendilhado de ripas de madeira sobrepostas que permitia, simultaneamente, arejar e iluminar o interior das casas, não expondo as ocupantes femininas a olhares indiscretos, conforme exigiam os rígidos códigos morais islâmicos.
Procure agora o Campo Mártires da Pátria. Nele encontram-se a Igreja de Santo António e a Capela de São Sebastião. A primeira foi convento de franciscanos e alberga no seu interior um conjunto de figuras em barro de tamanho real, designadas por Trânsito de Santo António, descrevendo passos da vida do santo do século XVII. A segunda é arquitectónicamente interessante pela forma cúbica da capela-mor. As telas sobre a vida e martírio do orago e passos da vida de Jesus e sua mãe levaram à sua adaptação a Museu de Pintura Sacra.
Volte agora para trás, continuando a apreciar o traçado das ruas e alguns sumptuosos palácios que as preenchem, e rume à Praça da República, junto ao Rio Gilão, onde se encontra o edifício da Câmara Municipal, de construção importante, com arcadas medievais. Num canto do edifício existe uma cabeça de guerreiro esculpida que a tradição diz representar D. Paio Peres Correia. Do lado esquerdo da Praça está o jardim, mais à frente o antigo Mercado, reabilitado e transformado num precioso espaço comercial e de lazer, cujos traços arquitectónicos foram salvaguardados, depois a lota, a seguir o cais, de onde partem os barcos de passageiros para a ilha de Tavira, e mais adiante os estaleiros.
Encaminhemo-nos para a Ponte, o ex-líbris da cidade de Tavira, popularmente atribuída aos romanos, mas de origem medieval e que une a parte mais alta e antiga da cidade com a parte mais baixa e recente. Do outro lado do rio pode visitar o Lagar-Museu (Casa das Artes) e apreciar a antiga tecnologia de extracção do azeite proveniente das oliveiras de Tavira, que integra ainda uma sala de exposições e oficina de gravura; a Capela de Santa Ana; a Igreja do Carmo, cujo interior é um raro exemplo da beleza do rococó; a Ermida de Nossa Senhora do Livramento, com uma fachada revestida por azulejos azuis do século XVIII e o Forte do Rato, destinado a defender a entrada do porto.





Da pesca do atum à caça do turismo



Tavira é hoje um importante pólo turístico, mas houve tempos em que a sua riqueza económica e social era comparável às grandes urbes do país. Depois de um longo domínio muçulmano, a cidade é conquistada aos mouros em 1242 por intermédio do Mestre da Ordem de Santiago, D. Paio Peres Correia.
A posição privilegiada do seu porto leva-a a adquirir, a partir do século XIII, uma importância assinalável, chegando a desempenhar, nos séculos XV e XVI, um papel fundamental como porto de apoio às guarnições portuguesas, aquando da conquista de Ceuta e de outras praças fortes do Norte de África. Por outro lado, era considerada, igualmente um importante centro exportador de peixe salgado e frutos secos (amêndoas e figos) vinho e outros produtos que chegavam a atingir portos de Itália e da Flandres. Este intenso bulício económico, social e demográfico fizeram-na alcançar o estatuto de cidade em 1520, outorgado pelo rei D. Manuel I. A situação inverter-se-á nos séculos seguintes, motivada pelo assoreamento da barra do Gilão, pelo terramoto de 1755 e pela epidemia da peste de 1645/46.
Depois veio o ciclo do atum, no século XIX, de que Tavira foi o centro por excelência. Encerradas as fábricas, a cidade vira-se para o turismo, a actividade mais rentável, ainda que continue a ser uma cidade piscatória, comercial e agrícola. Mas é o turismo que lhe traz os frutos do desenvolvimento.
Cidade ligada à faina piscatória, Tavira oferece uma gastronomia rica e variada baseada essencialmente no peixe. Atum de cebolada, arroz de marisco, cataplana de polvo, açorda de petinga, arroz de chocos, xerém com conquilhas ou amêijoas, sopa de beldroegas, sopa de lingueirão são algumas das sugestões que aqui deixamos. Se não for muito apreciador de peixe e preferir a carne então não deixe de pedir a perna de carneiro no tacho. Uma verdadeira delícia. Na doçaria, o destaque vai para os caranchos, as bolachas ou folhados de Tavira, o colchão de Tavira, as bailarinas, os beijinhos, as bolas de figo, os famosos Dom Rodrigos e as delicías de Tavira.
Quando achar que está na hora de partir não deixe de levar uma lembrança. No concelho fazem-se inúmeros objectos de palma e esparto, rendas, flores atificiais e vários utensílos de ferro.


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