O Urbi@Orbi, quis saber como é que tem
sido a vivência dos estudantes timorenses na comunidade académica.
O frio e a língua foram duas dificuldade apontadas pelos entrevistados, como
causa da difícil adaptação. "Aperfeiçoar a língua
portuguesa e conhecer melhor a cultura do povo português, são os meus
principais objectivos", afirma Carlitos Mota, natural de Dili e estudante do
2º ano da licenciatura em Língua e Cultura Portuguesa. Com 40 anos,
casado e pai de três filhos, "não tem sido fácil a nossa
adaptação, porque além das características climatéricas
serem diferentes das nossas, a barreira linguística é de facto a nossa
pior inimiga", confessa. Embora Mota fosse professor de Português numa
Escola Secundária, em Bécora - Dili - onde trabalhava como tradutor,
reconhece que a dificuldade na integração dos timorenses nas diversas
universidades portuguesas, prende-se sobretudo com a língua. "Durante
a ocupação indonésia, o Português foi uma língua
proíbida em Timor. Havia quem falasse português, como os meus pais,
mas às escondidas, sob pena de serem presos pelos militares indonésios",
explica, acrescentando que o regime indonésio, considerava a lingua portuguesa
um instrumento de política que os guerrilheiros da FRETILIN - Frente da Libertação
Nacional- nas recônditas montanhas de Timor, utilizavam para comunicar com
os seus apoiantes.
Antes de vir para Portugal frequentava o curso de Matemática, na Universidade
de Dili. Afirma-se satisfeito por estudar em Portugal e contactar novas culturas,
"isso só nos enriquece", frisa Fernando Mousinho Gama, natural
de Lospálos - ponta leste de Timor- é estudante do 1º ano de
Matemática Ensino. Mas confessa que tem enfrentado grandes dificuldades,
na adaptação sobretudo no domínio da língua. Porém
à medida que o tempo passa, vai ultrapassando esses constrangimentos, embora
reconheça que não tenha sido nada fácil, na medida em que "o
choque cultural é muito forte. Temos uma cultura muito diferente da portuguesa",
sublinha. Para este jovem, continuar a estudar em Portugal, apesar dos problemas
é o seu grande propósito. "Timor precisa dos seus filhos, por
isso pretendo regressar no final do meu curso, para dar o meu contributo ao desenvolvimento
do país", garante. Todavia deixa um aviso à governação
timorense: "se o país não tomar uma posição séria,
para fazer com que a democracia seja respeitada, a grande parte dos quadros não
irão regressar, ficando o desenvolvimento do país adiado" Há
um sentimento de impunidade, decorrente da falta de justiça e da inércia
do Governo, segundo Fernando Gama. Aliás, "os acontecimentos de 13 de
Dezembro último foram elucidativos, de que o país precisa de uma maior
cultura democrática", sublinha.
Francisco Gonçalves, natural de Dili, 22 anos, frequenta o 1º ano da
Sociologia. Falou pouco por não conseguir expressar-se muito bem em português.
Comunga da mesma opinião dos colegas de que o maior constrangimento tem sido
a língua. Segundo Gonçalves a proibição da língua
portuguesa pela Indonésia leva a que estejam "a pagar uma factura muito
cara com a nossa integração na sociedade portuguesa". Apesar
da barreira linguística, aliada ao factor clima, este jovem não vai
desistir de lutar para conseguir o objectivo que o trouxe à Portugal.
"Estou a preparar o meu regresso"
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Os timorenses encontram na Língua a principal dificuldade
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"Se as coisas continuarem assim, vou regressar a Timor", garante Laura
Santos, natural de Dili, 19 anos, que frequenta o 1º ano de Sociologia e
uma das três mulheres que fazem parte da comunidade timorense na UBI. Fez
os estudos secundários na Indonésia e em 2000 entrou para a Universidade
de Dili. "Embora os meus pais soubessem falar português, eu não
aprendi", confessa. "Não estou a gostar do curso, porque não
se pode gostar de uma coisa quando não se percebe nada acerca dela",
frisa.
A Laura já não vai às aulas desde Outubro, alegando a vergonha
de estar numa sala de aula, onde a maior dos seus colegas participa, colocando
e respondendo a questões. "Não é que não saiba
mas a dificuldade linguística impossibilita-me de elaborar uma resposta
lógica para o professor", afirma. Daí não descartar
a possibilidade de regressar a Timor nos próximos tempos. Aliás,
"neste momento estou a preparar os meus pais para o meu eventual regresso",
disse, garantindo que ainda vai tentar mudar para um curso profissional, como
forma de aperfeiçoar a língua durante pelo menos dois anos e depois
retomar os estudos universitários. Não sendo possível o regresso
a Timor a possibilidade de estudar na Indonésia torna-se imperativa.
Laura coloca a hipótese de mudar para um
curso profissional
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Os alunos deveriam ter um "ano zero"
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Antonieta Garcia, professora no Departamento de Letras da UBI, defende um "ano
zero" onde os alunos, entre outras coisas, fossem preparados do ponto de vista
linguístico para a sua entrada na universidade. "O erro começa
quando mandam alunos para uma universidade estrangeira e estes não sabem
a língua".
Para os estudantes que estão já na UBI encontrou-se uma forma de os
apoiar que consiste numa maior flexibilidade no sistema de avaliação.
Ou seja, os dois primeiros anos serviriam de apoio à integração
, que passaria por uma presença e participação sistemática
nas aulas. Esses pressupostos, no entender de Antonieta Garcia, "vão
permitir progressivamente uma maior conhecimento da língua portuguesa, já
que o contacto interpessoal é indispensável para aprendizagem de uma
língua". Por outro lado é uma forma de "não frustrar
a expectativa futura desses estudantes bem como do país" - Timor -,frisa,
acrescentando que "é preciso ter alguma tolerância".
Para Paulo Serra, docente no Departamento de Comunicação e Artes,
"os alunos deveriam ter um "ano zero" apenas dedicado à aprendizagem
e aprofundamento da língua portuguesa e, nos anos da universidade, aulas
de apoio de português". De acordo com o professor, dos quatro alunos
timorenses que tinha no primeiro semestre, na discplina de Epistemologia do curso
de Sociologia, dois desistiram logo no início a todas as disciplinas. Esses
alunos, sentiram que não conseguiam acompanhar o curso, tendo decidido por
uma formação de índole profissional. "Pela minha experiência
pessoal e pela de alguns colegas com quem tenho conversado, a língua é,
de facto, a grande barreira", afirma Serra, sublinhando que "é
bom não esquecer que existem, na UBI, pelo menos dois alunos que estão
a fazer, com êxito, o curso de Língua e Cultura Portuguesas e que serão,
portanto, futuros professores de português em Timor".
No entender de Anabela Ferreira, docente no Departamento de Gestão e Economia,
"a barreira linguística torna difícil a comunicação
entre o docente e o aluno". Contudo, "há um receio por parte dos
alunos em colocar as dúvidas e cabe aos professores trabalhá-las com
os alunos", sublinha a docente.
Qualquer integração numa cultura diferente requer um esforço
de duas partes. É nesta perspectiva que está a ser ministrado um curso
de português básico para estrangeiros, destinados a esses alunos, organizado
pela universidade. Para Antonieta Garcia, este curso é insuficiente para
quem esteja a preparar para ensinar o português no futuro.
O GÉNESIS - um Espaço de Espiritualidade e Cultura, sob a orientação
do Pe. Henrique Rios da Paroquia de S.Pedro, quis também associar a esta
iniciativa no apoio aos estudantes timorenses. Por isso, conseguiu junto de uma
professora de português do ensino secundário, que voluntariamente aceitou
o convite para dar umas aulas.
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