"A vida não acaba, apenas se transforma",
lê-se no suplemento do folheto informativo do Génesis. Foi em torno
desta proposição que, durante dois dias, os participantes reflectiram
sobre as diversas transformações que ocorreram no século XX
e vaticinaram de forma optimista acerca do século XXI. "Há motivo
para continuar a ter uma esperança radical na Humanidade", defende Domingos
Terra, sacerdote Jesuíta que apresentou uma comunicação no
primeiro dia da conferência. Segundo este Jesuíta, a história
já teve sinais de opressão e de grande desânimo em que o ser
humano se viu impotente, quando confrontado com experiências terríveis
que o levaram a interrogar-se sobre a existência de Deus. "É preciso
ter em conta que faz parte da condição humana, não ter respostas
para esse tipo experiências", sublinha.
O fenómeno da globalização e o poder dos media no século
XX foram também assuntos debatidos durante as conferências. "O
mundo vive governado pelos mecanismos económicos e pelo poder dos media.
A mobilidade geográfica e a possibilidade de estar on-line conduzem ao enraizamento
do indivíduo perdendo as raízes tradicionais", afirma Domingos
Terra alertando as sociedades tradicionais do Terceiro Mundo para esse novo desafio
que a Humanidade enfrenta. Nas palavras deste sacerdote, seria desastroso se essas
culturas perdessem o que têm de rico e de belo. As pessoas têm que aprender
a conviver com a realidade da mundialização e com realidades exteriores
que se cruzam com o universo histórico particular onde elas se integram.
"A Igreja tem um papel importante na ajuda a estas pessoas para que não
percam as suas raízes culturais tradicionais, a sua forma de estar na vida,
na história e no mundo para que elas também possam, a partir da sua
riqueza particular, participar nessa "aldeia global", realça.
O padre Jesuíta chama ainda atenção para a fragilidade dos
órgãos de soberania dos estados, dos códigos sociais em crise
de valores, para um individualismo exacerbado, tudo fruto da dinâmica dessa
mundialização. Robustecer o indivíduo através de uma
comunicação com o outro foi uma das recomendações deixadas
por Domingos Terra.
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Castro Henriques acredita que a globalização surgiu com a
conquista do espaço
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No segundo dia, sexta feira, 4, foi a vez de Mendo Castro Henriques, doutorado
em Filosofia Política pela Universidade Católica Portuguesa, apresentar
a sua comunicação. Mendo Henriques entende que a "globalização
não é um fenómeno novo. Ela nasceu há 46 anos com
a conquista do espaço, altura a partir da qual, o mundo passou a ser um
só". Questionado sobre a possibilidade de haver uma esperança
para a Humanidade, socorreu-se de um adágio popular: "a esperança
é a última a morrer", acrescentando que a esperança
é também a primeira a viver. Ou seja: "a acção
humana não é cega, é movida por referências (ideais
e valores). Os acontecimentos do século XX permitiram a selecção
dos valores positivos e dos valores negativos. Aquilo a que se chama esgotamento
das ideologias num certo consenso com as grandes ideias sociais e económicas
actuais é, sobretudo, o afastamento das ideologias unilaterais, e, a exigência
de visões que tenham uma justiça mais abrangente", frisa. Para
este professor as ideologias deixaram de ter o apoio de uma certa ciência
e dos exemplos do Nazismo e do Apartheid. Mas a sociedade continua a "sofrer
com restos ideológicos e com dificuldade de encontrar uma visão
conjunta", refere. Segundo este filósofo, a concepção
de uma ética tradicional assente no bem, na tolerância, na caridade
e na felicidade, está ultrapassada face a uma nova estrutura das sociedades
contemporâneas. O avanço das ciências e o advento das novas
tecnologias de informação e comunicação contribuíram
para uma ruptura com a ética tradicional impondo uma nova ética
que "garante as condições da dignidade humana"
Sobre a guerra no Iraque, Mendo Castro é peremptório ao dizer que
o povo iraquiano tem mostrado sabedoria no conflito porque se percebe que não
apoia Saddam Hussein, mas também não está interessado em
ter uma solução puramente externa trazida pelos anglo-americanos.
A dúvida que paira no ar é se este povo terá as forças
suficientes para construir o Iraque no pós guerra.
No final do 2º Encontro da Primavera, o padre Henrique Rios, grande mentor
deste evento, estava visivelmente satisfeito. "Esta cidade também
tem lugar para temáticas sobre pensamentos", defende Henrique Rios
acrescentando que conseguir trazer à Covilhã duas pessoas oriundas
de diferentes quadrantes de pensamentos filosóficos e teológicos
é de facto importante para a cidade. "Há uma certa magia. O
homem precisa de ritmos e este ritmo de séculos pode trazer um reforço
de esperança", conclui.
Rita Moutinho, um dos cerca de 50 participantes presentes na conferência,
considera que esses eventos são importantes na medida em que permitem às
pessoas um novo olhar sobre o futuro e desmistifiquem a forma negativista de perspectivar
a Humanidade.
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