Anabela Gradim

Educação e empreendedorismo


Uma sondagem recente revelava que os portugueses estão cada vez mais preocupados com "a crise", preocupação essa insuflada pelos números do desemprego, que não param de crescer. Mais interessante ainda era um facto de uma parte substancial dos inquiridos achar que os principais culpados do estado de coisas eram, também, os portugueses - "os outros", entenda-se, não eles - que "não gostam de trabalhar"; e ainda o facto de haver "doutores a mais".
É certo que devemos este belíssimo rombo na auto-estima lusa à última campanha eleitoral e, pasme-se, a estratégia averbou vitória a um candidato até então não muito popular, o que diz bem do carácter melancólico da alma nacional. Mas enfim, a parte que verdadeiramente me pasma é a percepção dos "doutores a mais", quando se sabe que a recuperação, em relação aos parceiros europeus, no número de licenciados é um fenómeno muito recente, e que em geral a nossa mão de obra é pouco qualificada. Que os números do abandono escolar - quer na escolaridade obrigatória, quer no secundário - continuam a ser perfeitamente aterradores. E que há concelhos, no norte do País, onde mais de 50% dos jovens não terminam o 9º ano. Presumo que rumem alegremente para as obras. Serão esses os tais eleitos que "gostam de trabalhar"?
Nos países muito desenvolvidos, como a Suécia, ou os Estados Unidos, mais de 90% dos jovens possuem o ensino secundário completo. Por cá, apesar dos esforços - nem sempre bem conduzidos, aliás - hão-de passar gerações até possuirmos números que lhes sejam comparáveis. Mas a obsessão nacional pelo "excesso de canudos", que aliás tem sido sinistra e sabiamente alimentada nos últimos tempos, fascina-me, pois se é certo que o número de licenciados à procura do primeiro emprego tem de facto crescido, o número total de desempregados também. Nem está provado que se esses jovens tivessem desaguado no mercado de trabalho 10 anos mais cedo estariam agora melhor. Mas menos preparados estariam certamente.
Os trabalhos conduzidos com uma dimensão temporal mais alargada também demonstram que em Portugal, País de salários baixos, uma licenciatura remunera comparativamente mais que em qualquer outro país europeu, e que os jovens com formação superior possuem, ao fim de algum tempo, maior estabilidade profissional, e estão menos sujeitos a serem flagelados pelo desemprego.
Também sofremos um crónico problema de "empreendedorismo", e é surpreendente que existindo perto de uma centena de licenciaturas nas áreas de Economia e Gestão, surjam depois comparativamente poucas empresas criadas por esses formandos. Por isso é um passo inovador, e no caminho certo, que a UBI também prepare os seus licenciados de certas áreas para a criação das próprias empresas. Porque se 5%, ou ainda menos, dos licenciados dessa tal centena de cursos criarem a própria empresa, aumentará o emprego, a riqueza dos próprios, e também a do País.
Desengane-se pois o senso comum, e a pequenina ronha contra o canudo do filho da vizinha, porque não é dos school droppers que a riqueza nacional há-de sair. Esse estratagema funcionou nos anos 60 quando havia uma Europa a reconstruir. Mas agora já não. Agora não há remédio, nem para tarefeiros da Europa servimos. O único remédio é seguir em frente e criarmos nós próprios a nossa riqueza. Ah, e pelo caminho, se não for pedir muito, vê-la bem distribuída far-me-ia muito feliz.