Por terras algarvias










Monchique, o Oásis escondido



Por Nélia Sousa


Longe do rebuliço exaustivo do litoral, espreitando por entre alfarrobeiras, figueiras, amendoeiras, sobreiros, castanheiros, medronheiros e carvalhos, "desabrocha" a pequena vila de Monchique, no coração da serra a que lhe dá o nome, em pleno barlavento algarvio, a 25 quilómetros de Portimão, a segunda cidade mais desenvolvida e importante do Algarve.
Em Monchique deleite-se com a frescura do ar, inundado pelo perfume das estevas e dos medronheiros que abundam por aquelas paragens, a arquitectura do casario branco, as janelas e portas emolduradas de azul e as chaminés rendilhadas, ao mesmo tempo que percorre as estreitas e labirínticas ruas de calçada. Aqui ainda se pode apreciar o típico Algarve de outrora, que aos poucos vai desaparecendo na zona litoral, sufocado pela construção desordenada e descaracterizadora, apetecível aos olhos do turista.
Do seu património histórico cabe destacar a Igreja Matriz, edificada nos séculos XV/XVI. O pórtico é de estilo manuelino, decorado invulgarmente com cinco pontas que formam ângulos em volta da parte superior. No retábulo da capela-mor (século XVIII) dois anjos seguram a Lua e o Sol. Esta igreja possui um tesouro sacro composto por objectos de culto que pertenceram ao antigo Convento de Nossa Senhora do Desterro.
Siga, posteriormente, pela Rua de Santo António e visite a Igreja de São Sebastião, que guarda no seu interior uma expressiva imagem de Nossa Senhora do Desterro, proveniente do antigo convento franciscano e datada do século XVII.
Entrando na Rua do Viâdor encontra a Igreja da Misericórdia onde se destacam duas grandes telas do século XVIII, o conjunto de talha do altar, do púlpito e do baldaquiano, e uma imagem de São Francisco. Se quiser continuar o seu percurso pelo património religioso deve seguir em direcção à Rua de São Sebastião, local onde está edificada a Ermida do Senhor dos Passos, possuidora de uma arquitectura muito simples e com uma imagem de Cristo em tamanho natural.
Envolvido por um vasto arvoredo, mas com um panorama lindíssimo para a vila de Monchique e das serranias vizinhas, encontra-se o Convento de Nossa Senhora do Desterro, um convento franciscano construído no século XVII e dotado ao abandono, depois do terramoto de 1755 que o deixou completamente danificado e em ruínas. Na antiga quinta do convento encontra-se uma notável fonte - a Fonte dos Passarinhos, revestida de azulejos, mostrando aves em diversas posições e uma importante magnólia, talvez a maior da Europa.


No alto da Fóia


Mas Monchique é, também, uma terra de artesanato. Desde os cestos de vime, colheres, facas e outros objectos úteis em madeira, há ainda as típicas cadeiras de tesoura (bancos de madeira que se fecham como tesouras), presumivelmente um legado dos romanos que habitaram este concelho do interior algarvio.
Passar por Monchique e não provar a sua rica e variada gastronomia é perder parte da essência do que é esta vila. Há que saborear os pratos de arroz com feijão ou com castanhas, as papas moiras, o feijão com carne, a assadura, farinheiras, morcela, chouriço e presunto curado. Muitos são os restaurantes espalhados ao longo da estrada que nos levam até Monchique, e quem optar por um deles não deixe de pedir o famoso frango à piri-piri, é de deixar água na boca. No final, e após uma boa refeição, nada melhor que um bom digestivo. A nossa sugestão passa pela famosa aguardente de medronho, fruto do medronheiro, colhido na serra e artesanalmente destilado em alambiques de cobre que pode muito bem ser acompanhado pelo típico bolo de tacho ou pelo pudim do famosíssimo mel de Monchique.
Conhecer Monchique implica subir até à Fóia, o ponto mais alto do Algarve, a 903 metros de altitude, de onde se avista, em dias de céu limpo, o Cabo de São Vicente, a serra da Arrábida e Faro. Vales selvagens, precipícios e prados com uma enorme variedade de vegetação é tudo aquilo com o qual a nossa visão se pode deleitar. É aqui que o verdadeiro Algarve, intacto, puro e de costas voltadas para o betão, que vai desfigurando as localidades vizinhas, lá mais para o sul, se mostra aos seus visitantes. A tranquilidade da serra só é interrompida pelo barulho constante da água pura e clara que corre das nascentes que alimentam as numerosas ribeiras.
Os Romanos, que atribuíram o nome a esta vila, Mons Cicus, descobriram os seus poderes milagrosos nos tempos de Augusto César e construíram a seis quilómetros de Monchique um importante balneário, conhecido pelas termas das Caldas de Monchique. A comprovar a permanência deste povo estão os inúmeros achados arqueológicos que se têm vindo a descobrir, desde ferramentas pré-históricas, moedas, restos de construções a numerosos 'dolmens'.
Sabe-se que vários reis e rainhas de Portugal visitaram Monchique desde a Idade Média para beneficiar das águas medicinais. Em 1495 D. João II veio tratar dos seus padecimentos nas Caldas de Monchique.
Totalmente renovado, o complexo termal das Caldas e Monchique oferece, hoje, a quem o visita, vários benefícios que contribuem para o bem-estar físico, psíquico e social da pessoa, ajudando a resolver problemas de reumatismo, afecções das vias respiratórias e do aparelho digestivo. O maior atractivo das Caldas é a pequena praça rodeada de muitas árvores e belas sombras. O local é propício a um agradável piquenique nas mesas de pedra espalhadas por toda a colina num dia de sol radioso.
De rara beleza paisagística e oferecendo vistas inesquecíveis, Monchique é, sem dúvida, um dos últimos recantos do Algarve onde se pode contactar directamente com a tipicidade da arquitectura e das suas hospitaleiras gentes. Por isto e muito mais merece, com certeza, uma visita.