Anabela Gradim
|
Fixar médicos no Interior
O ministro da Saúde esteve na Covilhã e visitou a Faculdade de Ciências
da Saúde da UBI, que conta hoje com 120 alunos, e deverá receber
mais 100 já no próximo ano lectivo. É claro que são
necessárias condições materiais e humanas para o bom funcionamento
de qualquer faculdade - no caso vertente a construção de raiz do
edifício onde o curso de Medicina será ministrado; e a existência
de docentes e profissionais suficientes nos estabelecimentos de saúde onde
tal formação é feita. Não tenho dúvidas de
que todas essas necessidades serão satisfeitas a seu tempo. O Interior
já tem o mais importante, a licenciatura e a comunidade de mestres e estudantes
que ela implica - e obtê-lo implicou vontade política e uma nova
percepção dos problemas que encontrou não poucas resistências.
É importante lembrá-lo porque, há poucos anos, quando se
discutia a possibilidade e a localização de dois novos cursos de
medicina, não faltaram vozes avisadas do sector clamando contra um putativo
excesso de profissionais, que a médio prazo esses cursos provocariam, de
nefastas consequências (mas quais? E para quem? Certamente não os
utentes, nem os que assim tivessem possibilidade de se licenciar em área
da sua eleição).
Portugal seguiu, pelo menos desde os anos 80, uma política suicidária
na formação de médicos e enfermeiros, frustrando pelo caminho
milhares de vocações, e distorcendo mesmo o são acesso aos
cursos da área - são banais os casos de escolha de formação
em saúde não por vocação, mas por "ter média",
e parecer um desperdício "gastá-la" noutra coisa qualquer.
Se tal estado trouxe algum benefício, foi para um grupo restrito. No geral,
o País perdeu, ficou mais pobre, e frustrou a vocação de
muitos estudantes de qualidade que ficaram fora do sistema. Acresce que não
é fácil emendar a mão, pois falamos de formações
muito longas: 6 anos de licenciatura, mais 2 de internato geral, e entre 3 a 6
para a especialidade. Uma enormidade. São precisos 11 anos para formar
um clínico geral, e 14 para um cirurgião. Por isso não é
fácil emendar a mão, mas é precisamente essa a via que terá
de ser seguida: aumentar as oportunidades de formação. Esse é
o único "incentivo à fixação de médicos
no interior" que reúne condições para funcionar. Repare-se
que Espanha, que nesta área seguiu uma política bem distinta, e
hoje não tem especialidade nem emprego para todos os seus licenciados em
medicina, está a exportar profissionais de saúde para Portugal.
E eles vêm, e fixam-se, pelo menos durante algum tempo, na raia, no interior
e no litoral. Do mesmo modo, não há qualquer dificuldade em colocar
professores na mais recôndita aldeia de Portugal. Se houver médicos
em número suficiente, eles fixar-se-ão onde forem necessários.
Claro que até lá, há um problema para resolver, e isso sai-nos
hoje certamente mais caro - em termos económicos e sociais - do que tê-los
formado em devido tempo.
|