Francisco Paiva

Design, investigação, desenvolvimento e outras "boutades"


Entrando recentemente no discurso político, o design transformou-se em panaceia para a falta de valor intrínseco da produção industrial nacional.
Relaciona-se assim a qualidade dos produtos com a eficácia dos processos de projecto. A acentuada lucidez desta premissa levar-nos-ia a supor seriedade da parte do Estado na definição de um objectivo que, em princípio, poderia ser uma prioridade: aumentar as exportações, fazendo coisas que os estrangeiros desejem e queiram comprar.
Vejamos alguns casos práticos que provam o contrário:

a) "ICEP escolhe americanos para promover Portugal". Título do DN de Sábado (Negócios p.25), dando conta da preferência do Instituto de Comércio Externo de Portugal (entidade que deveria ser integrada nos serviços consulares do MNE, de acordo com protocolo público estabelecido entre Martins da Cruz e Carlos Tavares, em virtude dos seus supérfluos gastos e iníquos ganhos) por uma agência americana na criação da marca "Comércio de Portugal". Veja--se o paradoxo: contrata-se um estrangeiro, que nem representação possui no país, para defender e promover empresas e identidade nacionais. Simultaneamente, pede-se auto-confiança aos portugueses, procurando influenciar os consumidores a darem preferência ao que é nacional.
Lamentamos este facto por duas razões, por não corroborar a auto-estima e por não estimular a internacionalização das muito premiadas agências de design de comunicação portuguesas.

b) Mais um lamentável exemplo do descrédito público nas empresas portuguesas é dado pela MTS - Metro Transportes do Sul (do Tejo) que, sem salvaguardar o interesse nacional, adquire 24 composições ferroviárias "Combinos" fabricadas pela Siemens austríaca - avaliadas em 60 milhões de euros. Negócios deste tipo deveriam assegurar algumas contrapartidas para os estados, envolver equipas técnicas na concepção do material electromecânico e circulante e exigir a montagem dos equipamentos por indústrias locais, formando técnicos para a respectiva manutenção e minimizando os custos de transporte (216 mil euros). De novo satisfeitos com a construção civil!

Bastariam estes dois exemplos, se mais não houvesse, para demonstrar quão esclerosado e alienado anda o meio político. Lamentamos que os decisores públicos votem os especialistas portugueses ao ostracismo, ignorem que só há branding sustentado pela qualidade do produto e que esta se projecta, antecipa-se e prepara-se com conceitos de inovação e design integrados.
Com exemplos destes, só pode manter-se o pudor de aventar soluções para a "crise".