Pedro Homero
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Muito para Oriente já é Ocidente
Tão perto de nós e no entanto tão diferentes nos mais variados
assuntos. Cheguei a Madrid há 5 meses e este pouco tempo serviu já
para notar algumas das diferenças - e parecenças - que marcam a
distância dos dois povos.
Compreende-me, amigo leitor - nem isto é um documento sociológico
nem as generalidades aqui referidas apontam para uma homogeneidade nos espanhóis.
Falo apenas das tendências de que me apercebo. E reporto-me só à
Comunidade de Madrid, claro.
Uma das diferenças mais interessantes que parece existir
é o extremar de posições que aqui noto e que me parece muito
mais suave em Portugal. Os partidos e organizações extremistas (tanto
à esquerda como à direita) parecem ter muita mais expressão
que do 'nosso' lado da fronteira, ideia reforçada pela quantidade de posters,
folhetos e garatujas nas paredes. Além do mais, organizam manifestações,
que não chegam aos milhares de assistentes mas que se ficam pelas largas
centenas. Se extrapolarmos este número para o total de pessoas que ficaram
em casa e não deram a cara (típico comportamento cobarde neste tipo
de movimentos ditatoriais), o problema ganha contornos um pouco mais sinistros
do que seria desejável.
Seja como for, esta faceta mais obscura do 'cubo' espanhol parece ser o preço
a pagar por algo maior e muito mais importante - a cidadania. A sensação
que tenho até agora (e a manifestação anti-guerra de anteontem,
onde nem nos conseguíamos mover no meio de 2 MILHÕES de almas, corrobora-a)
é que a noção de cidadania está fortemente implantada
numa grande maioria de espanhóis. Os problemas que os afectam - directa
ou indirectamente - são fonte de preocupação e debate e acções
concretas. Parece-me que um terreno como este é tão fértil
que a participação cívica possa descambar, nalguns casos,
em tendências anti-democráticas, mas creio que é um pequeno
preço a pagar, tendo em conta que a grande maioria das formas de expressão
de cidadania procuram soluções e não mais problemas.
No meio disto tudo, uma grande mancha, mais negra e mais espessa
que a do Prestige, cobre de vergonha - e muitas vezes de luto - toda a nação:
falo, é claro, do problema da ETA.
Por mais complexos que sejam os conflitos (e este parece ser um dos difíceis)
tenho sempre a sensação que há certas noções
básicas que são bastante claras. Uma delas é a violência
física e psicológica exercida pela ETA a todos aqueles que ousam
levantar a voz e dizer em público o que acham dessa organização
e dos seus métodos. Eu devo ser muito básico, mas a verdade é
que uma organização que mata ou mutila ou tortura ou rapta pessoas
não tem qualquer tipo de justificação para existir e ser
respeitada. Ou isto é absurdo? É que o mais estranho é que
não estamos a falar da geração dos 70, onde parecia que só
à lei da bala é que se poderiam resolver as coisas. Não,
estamos a falar de 2003, e estamos a falar de pessoas de um país desenvolvido,
com recursos e com bastante qualidade de vida (nem vou comparar a vida que o espanhol
médio tem com a do nigeriano ou da iraquiana) e que moram mesmo aqui ao
lado. E que são terroristas. E que matam friamente pessoas. E que colocam
bombas em carros que matarão quem quer que passe ao lado do carro na hora
H. Juro que não percebo.
Não conheço bem a história de Espanha para perceber as razões.
Sei por alto da existência dos GAL (organização terrorista
estatal) que foram, ao que parece, tão criminosos como a ETA. Comprei uns
livros sobre o assunto, mas desconfiado, pois também já me disseram
- e não me espantava - que os media por aqui estão quase todos comprados
e vinculados a partidos ou ideologias.
Vou lê-los, a ver se percebo melhor isto, pois faz-me tudo muita confusão.
Felizmente, temos o outro lado da moeda. Organizações
bascas anti-eta (algumas ferranhamente independentistas, mas opostas ao uso da
violência), organizações pela paz, pelo apoio a emigrantes,
enfim, por tudo e mais alguma coisa, um verdadeiro oceano de gente com vontade
de que não se repitam, imagino, erros do passado.
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