O estudo sobre o Ensino Superior anuncia algumas medidas que prometem gerar polémica
Estudo sugere mudanças para o Superior
Universidades podem ter Conselho Estratégico com presidente nomeado pelo Governo


"Ensino Superior: Uma Visão para a Próxima Década" é o estudo que vai servir de base para a discussão sobre a reforma no Ensino Superior. O aumento das propinas é uma das medidas apresentadas, mas estudantes e Governo têm opiniões diferentes nesta matéria. Santos Silva, reitor da Universidade da Beira Interior, concorda com o aumento "se este for acompanhado por mecanismos adequados de acção social".


Por Catarina Rodrigues


Propina progressiva que penaliza os alunos que reprovam, avaliação das instituições e cursos com consequências financeiras, e criação de um Conselho Estratégico cujo presidente é nomeado pelo Governo. Estas são algumas das medidas propostas no livro "Ensino Superior: Uma Visão para a Próxima Década". Trata-se de um estudo encomendado por Guilherme d' Oliveira Martins, ministro da Educação no Governo de António Guterres, a que o actual ministro da tutela, Pedro Lynce, deu acolhimento.
José Veiga Simão, António de Almeida Costa e Sérgio Machado dos Santos são os autores da obra que vai servir de base para a discussão anunciada por Lynce para a reforma do Ensino Superior.
O aumento das propinas é uma das medidas propostas, e é também uma das que mais polémica promete gerar entre os estudantes. Os autores do documento sugerem a criação de uma propina progressiva ligada ao desempenho escolar dos estudantes, ou seja, penalizando os alunos que chumbem.
Manuel Santos Silva, reitor da Universidade da Beira Interior, concorda com o aumento das propinas "se este for acompanhado por mecanismos de acção social" que possam dar igualdade de oportunidades a todos. Uma ideia que foi também defendida pelo primeiro ministro Durão Barroso, na apresentação do livro que decorreu na passada quarta feira, em Lisboa.
Ana Cruz, presidente da Associação Académica da Universidade da Beira Interior (AAUBI), é contra o aumento do valor das propinas, "ainda mais quando esta subida está relacionada com o insucesso escolar". A dirigente associativa sustenta que "é importante averiguar as causas do insucesso, porque os alunos não são os únicos culpados".
O reitor da UBI defende que "o Ensino Superior deve ter um financiamento tripartido", responsabilidade essa dividida entre o Estado, estudantes e famílias. Se as propinas devem ou não aumentar "é um problema político que cabe ao Governo definir". Actualmente o valor das propinas é de 358 euros, o que equivale ao salário mínimo nacional.
No passado dia 15 de Janeiro o ministro Pedro Lynce reuniu com associações académicas de todo o País, do ensino público, privado, de universidades e politécnicos. Os estudantes colocaram questões relacionadas com as propinas, com a fórmula de financiamento, e com a lei da autonomia. A AAUBI esteve presente e Ana Cruz lamenta que "as questões colocadas não tenham sido respondidas e passada uma semana seja lançado este livro". Este o motivo que levou a que no Encontro Nacional de Direcções Associativas (ENDA), realizado no passado fim de semana, fosse aprovada uma moção contra esta "atitude do ministro". O ENDA reuniu na Faculdade de Engenharia do Porto representantes de cerca de cem associações de estudantes de todo o País que em referendo votaram contra qualquer aumento de propinas diferente do que está previsto na lei actual.

"A autonomia das universidades públicas não pode ser posta em causa"

Santos Silva concorda com a representação da sociedade civil na instituição

"Ensino Superior: Uma Visão para a Próxima Década" apresenta também a proposta de criação de um Conselho Estratégico composto por 11 elementos, cujo presidente é nomeado pelo Governo. Cinco dos membros seriam internos à instituição, e os outros cinco seriam da comunidade exterior, numa escolha feita pelo Governo em conjunto com o reitor e com o presidente do novo Conselho Estratégico. Os autores da obra recomendam que membros da sociedade civil estejam representados nas universidades e tenham poder de decisão.
Santos Silva concorda a representação da sociedade civil e com a obrigatoriedade de consultar esses elementos quando se trata de decidir sobre estratégias da instituição. Para o reitor esta situação não é nova. "Na UBI temos membros da sociedade civil representados no Senado e sempre que discutimos os planos de desenvolvimento e a criação de novos cursos, esses elementos pronunciam-se".
Quanto à criação de um Conselho Estratégico em que a figura nomeada pelo Governo pode ser o número dois da universidade, a seguir ao reitor, Santos Silva tem dúvidas. "Não sei se essa será a melhor forma de exercer a autonomia da universidade", sublinha. Para o reitor esta situação poderia criar "conflitos " dentro da instituição. "As universidades públicas portuguesas têm dado mostras de que sabem gerir os recursos que têm à disposição, e a autonomia das universidades públicas não pode ser posta em causa", frisa.

Alteração na fórmula de financiamento

O financiamento do ensino superior é também um tema tratado no livro assinado por José Veiga Simão, António de Almeida Costa e Sérgio Machado dos Santos e como é habitual levanta alguma discussão.
Actualmente existem vários factores que entram na fórmula de financiamento, mas a componente principal é o número de alunos de cada instituição. Uma situação que se verifica desde 1993, mas que num futuro próximo pode ser alterada. As universidades e politécnicos podem passar a ser financiados em função da "produtividade". A avaliação das instituições e respectivos cursos pode também ter consequências financeiras, isto é, com mais apoios ou penalizações.
Santos Silva lembra que "foi por iniciativa das universidades públicas que se iniciou a avaliação do Ensino Superior em Portugal". O reitor considera que "o processo de auto-avaliação melhorou a qualidade do ensino na UBI".
A discussão está lançada e terá como base o livro "Ensino Superior: Uma Visão para a Próxima Década". Dentro de três meses o executivo entregará os projectos de diploma na Assembleia da República. O objectivo é a reforma do Ensino Superior.