José Geraldes

Confiança


Temos, de uma vez por todas, que nos convencer que a época das "vacas gordas" que vivemos, foi completamente artificial

Confiança. Será esta a palavra-chave que vai definir o ano 2003, há pouco iniciado?
No debate Prós e Contras, emitido na passada segunda-feira pela RTP, uma votação via telemóvel apresentava uma alta confiança para 2003.
As percentagens desta votação atingiam a fasquia de quase 70 para 30 por cento a favor da confiança. Importa notar que este tipo de votações é desprovido de valor científico. Mas de qualquer maneira assinala-se uma tendência a ter em conta.
A coincidir com esta votação, também os autarcas da Cova da Beira, em declarações à Comunicação Social regional, haviam revelado confiança para o novo ano.
A nível nacional, nas suas mensagens de Ano Novo, quer o Presidente da República quer o Primeiro-Ministro tinham já manifestado o seu optimismo institucional.
É bom que se mantenham as expectativas de confiança. Esta atitude mobiliza os cidadãos e impede que se caia na depressão social. E até se impõe como um dever o apelo à confiança.
Mas temos de ser realistas. O espírito de confiança não pode impedir-nos de ver e observar os factos à nossa volta.
E que vemos ? Situações de pobreza, que tendem a multiplicar-se. Empresas que fecham. Menos investimentos. Negócios que não se fazem. Casas que não se vendem. Estagnação económica. E os especialistas já dizem que estamos no caminho da crise de 1993 e que o ideal seria adormecermos para que 2003 passe o mais depressa possível. Um político que vai sempre contra a corrente, Pacheco Pereira, é mais radical ao dizer que os portugueses têm de interiorizar o espírito de sacrifício por largos anos.
"Nem tanto ao mar nem tanto à terra." O problema não é só nosso. E a recuperação da economia põe-se a nível mundial. Mas temos, de uma vez por todas, que nos convencer que a época das "vacas gordas" que vivemos, foi completamente artificial. Gastava-se mais do que se produzia. Daí o endividamento das famílias. E o arreigado hábito de poupança do português foi à vida. Quantos dos nossos jovens foram educados a poupar ? E sabem ainda hoje o que isso significa ? O que os pais lhes ensinaram foi gastar sem limites. Aqui reside um problema que a sociedade portuguesa deve resolver. A mudança de mentalidade impõe-se. O saber gerir o dinheiro faz parte da vida.
Isto não significa que se apele à retracção do consumo. Mas tudo tem as sua medidas. E o saber moderar-se nos gastos supérfluos implica uma disciplina interior. As crises podem servir de pedagogia para a orientação da vida. Pelas indicações disponíveis, tudo leva a crer que 2003 seja um ano difícil. E, se houver guerra no Iraque, o que é cada vez mais certo, maiores complicações vão surgir. Mas não nos deixemos invadir pelo pessimismo. Fazer o que se puder é já andar caminho. Hemingway dizia que um homem pode ser destruído mas nunca derrotado.
Aos discípulos medrosos Cristo disse : "Tende confiança." Eis a palavra orientadora do tempo actual.