José Geraldes
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Indignação e
horror
O caso de pedofilia da Casa Pia (...) constitui um alerta para a sociedade portuguesa.
Alerta para que situações semelhantes deixem de acontecer. E cuja
denúncia se impõe o mais depressa possível
O caso da pedofilia da Casa Pia de Lisboa, revelado ao País por uma investigação
jornalística do Expresso e da SIC, constitui um alerta para a sociedade
portuguesa. Alerta para que situações semelhantes deixem de acontecer.
E cuja denúncia se impõe o mais depressa possível. Não
se podem admitir silêncios a este respeito nem qualquer tipo de contemplações.
O cerco aos pedófilos, sejam eles quem forem, tem de ser apertado para
que pais e educadores cumpram a sua missão. O facto de haver pessoas importantes
ou de alta sociedade ou com responsabilidades públicas envolvidas em caso
algum pode servir de pretexto para silêncios comprometedores.
Destruir, com a exploração sexual, vidas de crianças é
não só um acto criminoso do mais baixo nível, mas também
um atentado à inocência, ao sonho e ao direito de futuro sem traumas
psicológicos. E a pedagogia ensina que é melhor um "prato partido
do que uma criança traumatizada". A Convenção dos Direitos
da Criança, aprovada em 1989 e ratificada por 179 países, estabelece
uma série de direitos económicos e sociais entre os quais figura
a protecção no caso de exploração sexual. Não
há pois que temer a denúncia. É mesmo um dever. E um direito.
No mundo, calcula-se em um milhão o número de crianças que
anualmente caem nas malhas das redes internacionais da exploração
pedófila, gerando lucros no valor dos cinco mil milhões de euros.
Em Portugal, os casos de pedofilia tendem a aumentar. Só de Janeiro a Setembro
de 2002 a Polícia Judiciária registou 341 casos contra 322 de 1933
a 2001. Nota-se o facto positivo de os caso terem sido detectados pois há
muitos que permanecem no silêncio por causa do medo e de coacções
de vária ordem.
O caso da Casa Pia tem contornos à primeira vista incompreensíveis.
Como é possível que tenha havido um manto de silêncio durante
quase 30 anos quando os indícios do facto eram mais que evidentes? Quem
tinha interesse em ocultar o crime? Se as primeiras denúncias tinham sido
efectuadas em 1980, como explicar a inacção das entidades competentes?
E, dado a natureza deste crime, porquê destruir o processo no Tribunal de
Cascais, em 1993? E se a mãe do Joel (nome fictício) não
falasse, o caso permanecia esquecido mas tínhamos crianças a continuarem
a ser objecto de sevícias e carregarem para toda a vida pesadelos de morte.
E se o Expresso e a SIC não avançassem corajosamente para a investigação
do facto, os meninos da Casa Pia viam os seus sonhos de criança a serem
transformados em noites sem madrugadas. E os criminosos à solta. E as autoridades,
pelo que se vai sabendo, não tinham actuado. É triste e vergonhoso
verificar que, depois da revelação do Expresso e da SIC, tanto tempo
mediasse para a investigação por parte das autoridades. Porquê?
Perante este cenário, só a indignação e a revolta
traduzem o nosso sentimento. E o horror em face de um laxismo num assunto de tanta
importância para a saúde mental e espiritual da nossa sociedade.
Esperemos que esta investigação seja uma chicotada no torpor de
um País que se acomodou ao mais fácil e a um sucesso superficial.
E ao dinheiro e aos "big-brothers". Como diz ShasKepeare em Hamlet:
"Há qualquer coisa de podre no reino da Dinamarca".
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