José Geraldes
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Luxo, segurança e mentira
O mínimo que se exige é que os vendedores esclareçam os potenciais
compradores das diferenças existentes. Trata-se de um dever ético
Afinal, as causas das mortes nas nossas estradas não
são apenas devidas à falta de civismo dos condutores, ao estado
deficiente das estradas e ao envelhecimento do parque automóvel, mas também
aos poucos equipamentos de segurança de série incorporados nos modelos
vendidos em Portugal.
A revelação deste facto ajuda a explicar a média de cinco
mortos por dia no País em acidentes na estrada.
O estudo feito pela DECO, organismo de defesa dos consumidores, e pelo Instituto
Superior Técnico, fornece dados que dão que pensar e que , mais
tarde ou mais cedo, obrigam a serem tomadas medidas adequadas pelos departamentos
estatais do sector.
Como se compreende que os mesmos carros vendidos em Espanha e A lemanha não
tragam os mesmos equipamentos dos comercializados em Portugal? E estamos a falar,
nada mais nada menos, dos 50 modelos mais vendidos em Portugal. Ou seja, os carros
que, em boa fé, compramos, já trazem um destino de morte.
Os airbags que amortecem o choque em caso de colisão, o ABS que bloqueia
as rodas, os sistemas de controlo de estabilidade, tracção e pressão
dos pneus não constam nas marcas a que a DECO atribui cartões vermelhos
e amarelos. Estes elementos fundamentais para a segurança na condução
e nos casos de choque e capotamento, são substituídos por acessórios
de luxo como o ar condicionado, fechos eléctricos e tectos de abrir.
As marcas com cartões vermelhos incluem a Citroen, Daeweoo, Fiat, Ford,
Hyundai, Nissan, Peugeot, Renault, Seat e Toyota. À BMW, Mitsubishi, Opel,
Rover e Skoda são atribuídos cartões amarelos. Metade desta
marcas têem menos equipamentos de segurança do que os modelos vendidos
em Espanha. E a diferença em relação à Alemanha atinge
os 74 por cento. É de ver que, em caso de acidentes, estes carros oferecem
resistência mais débil. E o número de mortos tende naturalmente
a aumentar.
Perante este estudo, o mínimo que se exige é que os vendedores esclareçam
os potenciais compradores das diferenças existentes. Trata-se de um dever
ético.
Claro que o comprador português também tem culpas, pois atribui mais
importância aos acessórios de luxo para dar nas vistas junto dos
amigos vizinhos e familiares. A atitude é fruto de uma cultura parola muito
típica entre nós de mostrar só aparências que não
se manifesta nos alemães e espanhóis.
Pode-se passar mal em casa, não ter o essencial do conforto e estar endividado
até aos cabelos. Mas o dinheiro para a "bomba" de forma a causar
inveja aos vizinhos não falta.
Compra-se o automóvel com luxos a partir de uma mentalidade superficial.
Razão tinha o imperador romano que, ao referir-se aos portugueses, em termos
políticos dizia que era um povo que não se deixava governar nem
se sabia governar. Na vida prática, também tem aplicação
esta máxima.
Passam-se dificuldades em casa para se ter o carro da ostentação.
Se o vizinho tem, não se fica atrás.
É o reino da mentira em todo o seu esplendor. Mente quem vende os automóveis.
Aceitam a mentira por uma questão de vaidade quem os compra. Jean-François
Revel, filósofo francês, acerta em cheio: "A primeira de todas
as forças que governam o mundo é a mentira."
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