José Geraldes
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Psicose da crise
Enquanto dão dinheiro (as confecções),
conservam-se. Caso contrário, mudam-se ou fecham. Foi este o processo que
aconteceu
A palavra crise está na rua. Na Cova da Beira sobretudo
devido ao fecho de várias unidades de confecções. E também
na Guarda e em Gouveia. E noutras localidades da Beira Interior onde se registaram
falências ou dificuldades de empresas.
Na Covilhã, ainda a "Manchester Portuguesa", há sinais
de problemas nos lanifícios, aliás, historicamente cíclicos,
ao lado empresas classificadas entre as 300 melhores do País e com penetração
dos seus produtos nos mercados mais exigentes da Europa.
Por isso, pode perguntar-se se não está a cair-se no abuso da palavra
crise para retratar a situação social e laboral, nos tempos actuais,
da Beira Interior. O que não significa o reconhecimento factual de uma
época menos afortunada para o pleno emprego. Mas o pleno emprego, segundo
dizem os economistas, não é panaceia universal para o crescimento
industrial.
O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia
de Ciências de Lisboa, define assim a palavra crise : "Fase grave,
complicada, difícil ; momento de tensão ou de impasse na vida de
uma pessoa, de um grupo social, na evolução de determinadas situações."
A definição afasta logo à partida a ideia de uma situação
catastrófica. Mas aparece bem explicitada a gravidade, o impasse -e convém
repeti-lo- "na evolução de determinadas situações."
O que a Beira Interior atravessa neste momento situa-se numa fase grave e evolutiva.
Devido a razões de procura de mão-de- obra barata nas confecções
e, de acordo com os especialistas, por uma ausência de estratégias
de venda nos próprios lanifícios, o desemprego instala-se, deixando
famílias inteiras em situação difícil financeira.
E é dos livros e da experiência económica que o ramo das confecções
não oferece grande estabilidade, pois muda-se facilmente para locais de
menores custos, além de ser para muitos industriais uma ocasião
de ganhar dinheiro. E com agravante de não contribuir para um crescimento
económico sustentado. Em termos práticos, enquanto dão dinheiro,
conservam-se. Caso contrário, mudam-se ou fecham. Foi este o processo que
aconteceu. E pode vir a repetir-se, caso não haja ligação
a uma empresa-mãe sólida.
Vera Nobre da Costa, perita de nível internacional em "marKeting"
dizia, recentemente, numa conferência na UBI, que a Covilhã produzia
entre os melhores tecidos do mundo mas que não havia uma marca própria
a impô-los nos mercados internacionais.
Que fazer então ? Não se pode, à boa maneira portuguesa,
esperar que o Estado venha resolver problemas de gestão das empresas. Ou
sirva de muleta com os eternos subsídios. Veja-se o que aconteceu com o
Plano Mateus. Perdoaram-se dívidas ao fisco e contam-se pelos dedos as
empresas recuperadas. O que se deve exigir, em situações de crise,
e num tempo determinado, são medidas de discriminação positiva.
E ao mundo dos empresários, e também dos trabalhadores, uma mudança
de mentalidade. E capacidade de iniciativa e criatividade.
E ter em conta a nova realidade da globalização. E saber que a mobilidade
no emprego será uma constante no futuro. Nos Estados Unidos e nos países
desenvolvidos da União Europeia, muda-se de emprego quatro a cinco vezes
ou mais na vida.
Para uma região em dificuldades, o uso e abuso da palavra crise mata a
auto-estima e cria um clima psicológico de declínio. É um
convite à psicose. Por isso, fez bem Jorge Sampaio, Presidente da República,
na visita ao distrito da Guarda, em atacar a lamúria e queixume. Para que
o dramatismo das situações não leve à depressão
e à estagnação.
A Beira Interior felizmente, apesar de região periférica, não
está, como bem referiu a Associação dos Industriais de Lanifícios
, em estado de "calamidade". Daí o aproveitar a formação
profissional prevista no pacote de Bagão Félix para trabalhadores
mais qualificados,ou seja, mais competitivos.
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