Nos espaços onde decorrem as sessões há sempre muitos símbolos, normalmente religiosos

 

 

 

 

O destino na palma da mão



A leitura da mão é a
forma mais antiga de adivinhação do futuro


J. lê a palma da mão. Funcionário da UBI e licenciado por esta universidade, diz que a quirologia é uma ciência embora não seja exacta, que apareceu na sua vida há já 25 anos. "Quando vi uma pessoa a fazer isso fiquei completamente fascinado", lembra.
A quiromancia (ou quirologia), mais conhecida como a leitura da mão ou da sina, é apresentada na Enciclopédia de Parapsicologia e Ciências Ocultas (EPCO) como a forma mais antiga de adivinhação do futuro.
"A quiromancia baseia-se na interpretação de toda uma série de sinais contidos na mão do homem desde o seu nascimento e que dificilmente podem alterar-se. Estes sinais indicam-nos como decorrerá a nossa vida até ao momento da morte".
J. tem uma regra de ouro que é nunca dizer às pessoas quando é que vão morrer. "Primeiro porque pode acontecer que estejamos errados, e depois porque isso cria uma "semente de morte" na pessoa", refere.
Além disso, ao contrário do que pode ler-se na EPCO, este quirólogo afirma que as linhas "são mutantes e a sua forma tem uma duração de cerca de seis meses. Só a partir dos 18 anos, quando as linhas estão mais ou menos definidas, pode ler-se a mão", explica.
Curioso, é o facto de um simples anel de ouro ter a capacidade de mudar o rumo à vida. J. diz que um anel de ouro colocado no dedo certo pode "encaminhar a linha para o sítio desejado". Todos os dedos são bons para usar anéis, excepto o dedo médio.
Uma característica que considera interessante é o facto de ficar registado "tudo o que aconteceu" com a pessoa no passado.
A quirologia não serve só para ler o que está escrito na mão, mas também para orientar quanto ao caminho certo, para ajudar. "Quando estou a ler uma mão, estou a receber o que a outra pessoa me está a transmitir. Há algo que faz funcionar a intuição", revela.
Linha da Vida, linha do Coração e linha da Mente são consideradas as linhas primárias. "Mas para quem está a ler, não são as que têm mais interesse", assinala.
Além destas linhas principais, há muitos outros pormenores a captar de uma mão. Deste o tipo ( se é quadrada, elementar, cónica, espatulada, nudosa, afusada ou mista), que revela as faculdades inerentes a cada indivíduo, através da personalidade, passando pelos montes (de Vénus, de Júpiter, de Saturno, de Apolo, de Mercúrio, de Marte e da Lua). Quanto mais proeminentes forem, mais intensa é, na pessoa, a virtude a que cada um se refere.
J. acredita que saber ler é um dom e que há ciganos que já nascem com ele. No entanto, "daí a dizerem o que lá está vai uma grande diferença", comenta.
As suas consultas, que duram sensivelmente duas horas, são dadas em casa e o preço está fixado em 35 euros.
Quando começou a ler, era procurado por todo o tipo de pessoas. Médicos, professores e até um padre chegaram a consultá-lo. Nessa altura as consultas custavam 15 euros.
O quirólogo diz que era procurado por tanta gente que foi obrigado a aumentar o preço. "Passei a cobrar cinco mil escudos" (25 euros).
À medida que a população de classe média alta que antes o procurava deixava de ir às suas consultas, começou a receber pessoas das quintas e aldeias vizinhas. O número de pessoas continuou a aumentar.
Os actuais 35 euros que cobra atraem pessoas "de todas as classes e de todas as idades, inclusive crianças, cujas mãos eu não leio porque só atendo pessoas a partir dos 18 anos".

Videntes revelam métodos e crenças
Entre o real e o oculto

Vêem para além do que os nossos olhos podem ver e dizem que têm "guias". São clarividentes, conhecem o que o futuro nos reserva e curam através de métodos naturais não convencionais.
Do passado ao futuro, traçam as linhas da vida de muitas pessoas que a eles recorrem aconselhando, prevendo, curando, desde males de amor a doenças. É a fé que cura, garantem, e é ao bem que obedecem. Estes homens e mulheres "de virtude" que exercem o seu "dom" na Covilhã ou em localidades próximas, vivem todos os dias, naturalmente, entre o real e o oculto.


Por Ana Maria Fonseca e Catarina Rodrigues



Desde os 14 anos que "Avó Preta", agora com cerca de 60, prevê acontecimentos. Antes na Guiné Bissau e agora no Paul, as visões aparecem-lhe através de espíritos que lhe dizem o que vai acontecer.
Ainda na Guiné, o pai, que pensava que ela estava "com a doideira" levou-a a um centro espírita para "fechar o corpo". Lá, disseram-lhe que não a podiam "fechar" porque o "dom" tinha nascido com ela. "Se me fechassem ou ficava maluca ou morria. O meu pai disse na altura que se soubesse que eu morria, antes me queria ver morta do que a sofrer como eu sofria", lembra.
Mesmo assim "taparam-na" até aos 20 anos. Durante essa altura, embora não tivesse premonições sentia "o corpo pesado, sabia que ia acontecer alguma coisa que não podia ver nem dizer".
Só aos 50 anos começou a deitar as cartas porque primeiro o pai, e depois o marido não a deixavam trabalhar. "A toda a hora via coisas que iam acontecer, dizia ao meu marido, estou a ver mortes, estou a ver isto e aquilo, e ele dizia, - lá começas tu, fui casar com uma bruxa!, mas eu não sou bruxa".
"Avó Preta" sentia que era pecado poder ajudar e não o fazer. "Uma pessoa quando vê alguma coisa e pode ajudar devia fazê-lo. Ver uma pessoa a sofrer, amanhã a pessoa morre, e eu fico com remorsos, sabendo que podia salvar aquela alma. Mas ele não me deixava, e só depois de separada é que comecei a fazer as coisas", conta.
A clarividência é definida na Enciclopédia de Parapsicologia e Ciências Ocultas (EPCO), como a capacidade de "efectuar uma viagem mental a lugares fechados, ver coisas escondidas aos olhos dos outros através das faculdades extra sensoriais. Nenhuma barreira física pode ser obstáculo suficiente para que a mente clarividente possa penetrar no recinto, por mais recôndito que seja, e desvendar o que se encontra no seu interior".
A premonição, por seu turno, aparece como um fenómeno pelo qual a mente pode "viajar no tempo e ter acesso a factos que vão produzir-se no futuro".

A cura pela oração

No Paul, como em qualquer outro lugar onde procurámos por estes homens e mulheres "de virtude", qualquer pessoa nos sabia explicar onde podíamos encontrar "o vidente". Chegados ao local onde decorrem as "consultas", há sempre um compasso de espera, porque são muitos os que procuram ajuda espiritual.
"Avó Preta" diz que há dias em que recebe mais de vinte pessoas. "As pessoas vêm cá saber da vida, das doenças. Se for doença médica, eu digo, essa doença eu não posso curar, é de médico. Se for coisa que eu possa fazer, faço".
São de todas as idades e estratos sociais as muitas pessoas que procuram os videntes. Ajudar, é a missão no mundo dos que vislumbram para além do que está à vista. Uma obrigação com que nascem todos aqueles que possuem "o dom".
Vêem-se como intermediários entre uma força maior, geralmente Deus, e os homens, e têm "guias" que lhes mostram o que o comum dos mortais não pode ver. Entre o passado e o futuro, ouvem, tocam, contam, aconselham, curam.
Os problemas que afligem os "pacientes" são, na maioria, relacionados com amor e saúde, mas há outros, como o dinheiro e o futuro. Certo é que encontramos pessoas que regularmente consultam o mesmo médium.
Nos espaços onde decorrem as sessões há sempre muitos símbolos, normalmente religiosos. Altares com diversas imagens de santos, acompanhados de Nossa Senhora, de Jesus e de cruzes.
No fim da consulta, tal como em qualquer outra troca de serviços, vem a conta. A maioria dos videntes que consultámos pedem "o que a pessoa quiser dar", outros têm preços estabelecidos.
As curas passam principalmente pela oração e por produtos que variam entre ervas, sabonetes e velas.
Num estudo sobre "Bruxas, Mediuns e Curandeiras em terras da Cova da Beira", efectuado por alunos finalistas da licenciatura em Sociologia da Universidade da Beira Interior (UBI), Léon Denis, citado por Donizete Rodrigues, docente da UBI, caracteriza o médium como sendo "o intermediário obrigatório entre dois mundos. O espírito, separado pela morte da matéria grosseira, já não pode agir sobre ela nem se manifestar no meio humano sem o auxílio de uma força, de uma energia que vai buscar ao organismo de um ser vivo. Qualquer pessoa susceptível de fornecer, de exteriorizar essa força, está apta a desempenhar um papel nas manifestações físicas: deslocações de objectos sem contacto, contributos, pancadas, mesas giratórias, levitações, materializações. É essa a forma mais comum, mais espalhada, da medianidade".
Estes homens e mulheres movem-se naturalmente no quotidiano do aqui e do além e as suas visões fazem parte do dia a dia de quem os conhece.


"Sou uma pessoa igual a vocês, mas tenho outra pessoa dentro de mim, um guia, que me diz as coisas", diz "Santo de Caria"



Ervas vindas de África

É a partir do nome da mãe do cliente, símbolo de verdade e da origem de cada um de nós, que "Mestre Africano" começa a primeira consulta de quem venha à procura da sua ajuda. Nessa primeira abordagem, procura o tipo de estrela da pessoa. "Cada um tem a sua estrela, que pode estar na água, no sol, no céu, na terra, ou em qualquer outro lugar", explica. Depois de apurados estes dados, bem como o nome e a data de nascimento do cliente, "Mestre Africano" vai averiguar as causas do problema, mas há coisas que nem ele, nem ninguém, garante, consegue resolver. Problemas de cabelo, de sangue e da alma são os seus limites, bem como o mal. "Fazer o mal é contra o meu princípio", diz.
"Mestre Africano" estudou sobre a clarividência e as plantas e garante que consegue ver 20 anos do passado e 20 do futuro de uma pessoa.
Enquanto conversámos, numa casa no centro da cidade da Covilhã, frisou que não podíamos ficar ou tirar fotografias no local onde dá as consultas, para que os espíritos não se inquietassem.
Vestido de branco dos pés à cabeça, a cor escura da pele contrasta com o alvo da roupa. Do quarto secreto onde não podemos permanecer, exala um forte odor a incenso que persiste até muito depois de virmos embora.
Depois da primeira consulta, que custa 25 euros, procede-se ao tratamento. Orações, baseadas nos seus livros sagrados, mensagens dos espíritos que o guiam e ervas vindas de África ajudam a curar os males do corpo e do coração.
O "Mestre", que em 1988 veio para Portugal por aventura, não desvenda muito sobre o seu conhecimento. Certo é que muitos são os que o procuram, em todas as condições, tal como encontrámos em Caria.

Psicologia e vidência

Psicólogo de profissão, este ainda jovem vidente residente em Caria recebeu-nos numa pequena sala recheada de santos que revelam a origem católica do vidente que esteve quase para ser padre.
Já no seminário, aos 11 anos começou a ter visões e premonições que os padres não aceitavam. Mesmo assim, continuou a sua formação a caminho do sacerdócio e só quando estava quase a ser ordenado desistiu, e seguiu outro caminho.
Este "Santo de Caria", como ouvimos chamar-lhe, diz que foi escolhido por Deus quando ainda estava no ventre da sua mãe. Considera-se um intermediário entre Deus e os homens, mas garante que o que cura as pessoas é a sua própria fé. Para esse efeito usa apenas uma cruz e a oração. Simpático, sai para a rua depois de cada consulta e conversa descontraído com as pessoas que esperam pela sua vez.
Procurado por muitas e diferentes pessoas, como pudemos comprovar quando o visitámos num dia de semana, ao início da tarde, onde já esperavam pela consulta cerca de dez pessoas, o vidente e psicólogo salienta "sou uma pessoa igual a vocês, mas tenho outra pessoa dentro de mim, um guia, que me diz as coisas. Às vezes aparecem cá pessoas desesperadas e tento dar-lhes conforto espiritual", conclui.
Tal como "Avó Preta", apesar de ser um homem de fé, "Santo de Caria" vai ao Centro Espiritual regularmente, um local de encontro e de oração onde convive com pessoas como ele.
Para "Avó Preta", ir ao Centro, de três em três meses, é como "ir à missa, rezar", num encontro que se realiza sempre durante a noite.
"Mestre Africano" prefere a mesquita. Muçulmano, ora cinco vezes por dia e respeita os escritos, por isso garante que não faz mal a ninguém.
O bem é o que move os videntes com quem falámos. Todos eles dizem que não fazem mal, nem que lhes paguem muito dinheiro.
"Unir é de Deus, fazer mal é do demónio", diz "Avó Preta".
Para fugir ao demónio, esta simpática avó não trabalha nem às terças, nem às sextas feiras, os dias do demo, quando "sai tudo baralhado". Também não quis lançar as cartas porque corríamos o risco de "levar pancada" dos espíritos.

Feitiçaria ou doença?

"O feitiço é o elemento mais importante da magia"

"Avó Preta" diz que há doenças que não são do corpo, mas resultam de feitiçaria.
"Já curei um homem que tinha uma angina, estava para ser operado e ficou bem. Depois o médico perguntou-lhe o que ele tinha feito à angina. Uma noite ele estava ao pé da garagem e viu passar um gato preto. Atirou uma pedra ao gato e essa pedra era o que ele tinha na garganta. Era feitiço. O gato não era gato. No dia em que eu o curei, ele nem comia. Depois de eu curar, já comia bem e quando foi fazer a operação, já não tinha a angina. O médico perguntou-lhe o que tinha acontecido e ele disse, - foi uma senhora que me curou, e o médico disse, - então deixa-te estar assim que estás bem", conta.
A feitiçaria é, segundo a EPCO, "uma capacidade, um poder que pode atingir negativamente os outros por meios invisíveis e à distância, o uso deliberado de magias maléficas para fazer os outros sofrerem. Estão ligados à feitiçaria sentimentos viciosos como a inveja, o ódio, a malícia, a ambição, a raiva".
"Deus é o único pai que eu tenho. Ele é que me ajuda", assegura "Avó Preta".
"A magia - pode ler-se na mesma enciclopédia - (palavras mágicas, fórmulas, feitiços, encantos) desperta no homem forças mentais desconhecidas, esperanças milagrosas e crenças nas misteriosas possibilidades humanas. A crença na magia constitui sempre a (re)afirmação do poder do homem para provocar determinados efeitos concretos, por intermédio de ritos específicos, de um feitiço e outras práticas. O feitiço é o elemento mais importante da magia".
Principalmente ervas, mas também velas e sabonetes, "Avó Preta" mostra um manancial de produtos que se podem usar para ajudar na cura dos mais variados males. Visitada por todo o tipo de pessoas, as que mais procuram são mulheres jovens com problemas de amor. Através das cartas, recebe os espíritos que a orientam. Depois da consulta, quem tem problemas de amor pode levar para casa sabonetes como "abre o meu caminho" ou velas "grande paixão" que ajudam a (re)acender a paixão.
Para outros males também há sabonetes contra o "mau olhado e a inveja", "comigo ninguém pode, só Deus" e "abre meu caminho da fortuna".
"Avó Preta" garante que resultam se forem usados com fé.
De África vêm as ervas que "Mestre Africano" receita aos seus clientes. Comparando-as aos remédios dos médicos, garante que mais natural não pode haver.




"Os chakras são centros de energia "



Medicina tradicional e alternativa em conflito

 

"Ajudar as pessoas a olhar para dentro em harmonia com a natureza" é o objectivo de Diogo Alçada, gerente e terapeuta do Esonatural- Centro para a difusão do bem. Uma sala de terapia onde é feita a "cura pelo toque". Diogo Alçada é mestre em Reiki e assegura que esta disciplina não é mais do que "pôr as mãos em cima das pessoas". No Reiki, o terapeuta serve de canal, ligando a energia ao cliente que está a tratar. O que cura é a própria energia da pessoa. Diogo Alçada alerta para a necessidade de avisar quem se vai tratar, para a chamada "crise da cura". Se o doente está no princípio de uma gripe, faz o tratamento e no dia seguinte parece que tem uma pneumonia. Mas, três dias depois "encontra-se completamente curado". O Reiki "não faz desaparecer nada, desperta a energia e isso faz acelerar o problema. O terapeuta do Esonatural, uma firma situada num bairro residencial da cidade da Covilhã, afirma ter visto as mais diversas reacções. "Há quem chore, há quem tussa e até há quem vomite, mas tudo isso são processos de libertação", assegura.
Diogo Alçada lembra que existe um conflito entre a medicina tradicional e medicina alternativa. A principal diferença que aponta entre ambas são os recursos utilizados. As terapias que faz são naturais. Não há intervenção de químicos nem remédios. Apenas usa as mãos, a cabeça e essências florais. Auxilia o Reiki com cristais (cristalografia), com as cores (cromoterapia) e com os chakras que são os responsáveis pelo corpo não físico. Os chakras são centros de energia e por isso a primeira coisa que o terapeuta faz a quem experimenta o Reiki é o alinhamento dos chakras. "O doente tem de ajudar à sua própria cura e isso até os médicos sabem", diz.
As pessoas que recorrem a este tipo de tratamentos aparecem fragilizadas emocional ou fisicamente. Diogo Alçada acredita que há quem se aproveite destes casos para extorquir dinheiro, mas ele tem uma filosofia diferente. Prefere ser sincero com o cliente e dizer que o tratamento pode ou não resultar.
Existe ainda muita confusão em relação a estas terapias. "Quando quis abrir o Centro tive sérias dificuldades" afirma o terapeuta. Está colectado como prestador de serviços porque a legislação é insuficiente e estas actividades não se enquadram nas leis existentes. Diogo Alçada considera que a legislação sobre esta matéria devia ser elaborada porque se trata de um negócio muito grande que começa a difundir-se em muitos casos, à margem da lei.