António Fidalgo
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Contradições
de uma lei
Está em cima da
mesa a proposta de lei sobre o regime jurídico
do desenvolvimento e qualidade do ensino superior. Parece
que irá à Assembleia da República
já na próxima quinta-feira.
Ora a lei, começando bem no preâmbulo, reafirmando
como propósito primeiro do ensino superior "não
só a capacidade de formar técnicos altamente
especializados, mas, acima de tudo, formar pessoas que
sabem pensar cientificamente os problemas da sociedade,
das organizações e das pessoas", é
incapaz de resolver um dos problemas fundamentais do aqui
e agora da sociedade portuguesa, a saber, o da distinção
entre ensino universitário e politécnico.
A proposta de lei diz "o ensino universitário
assenta na investigação científica
fundamental (...) enquanto o ensino politécnico,
sustenta-se antes na investigação aplicada,
orientada para a resolução de problemas
de raiz tecnológica, com forte ligação
ao mundo empresarial." Mas isso é um dislate.
Essa diferença não é, nem pode ser
a diferença entre universitário e politécnico,
mas entre ciências fundamentais, como a física
e química, e engenharias! Porventura não
é a investigação de ponta hoje em
dia, tal como é feita nas grandes universidades
americanas, uma investigação orientada para
as tecnologias? Não estão porventura essas
universidades ligadas ao mundo empresarial, na Califórnia
ou na área de Boston? A inovação
tecnológica em Portugal deve-se muito mais às
universidades que aos politécnicos. Vejam-se os
casos do IST, da Universidade de Aveiro ou da Universidade
do Minho.
Ainda outra diferença, segundo a lei, é
que a " universidade deve organizar os planos de
estudo dos seus cursos no que se convencionou designar
por banda larga, enquanto o ensino politécnico
deverá privilegiar a banda estreita, altamente
especializada". Nada a opor a esta distinção,
mas isso significa que não podem ter a mesma dignidade,
ao contrário do que a lei diz. É que, quer
o Ministério queira ou não queira os cursos
de banda larga significam muito mais trabalho para os
alunos, muito mais disciplinas de matemática e
de física - "hic opus, hic labor est"
e que traduzido livremente dá "aqui é
que a porca torce o rabo".
Esta é a realidade e não há lei que
decrete a realidade.
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