José Geraldes


Loucos

A "desestruturação familiar na sociedade ocidental" surge como outra causa: "Os miúdos crescem cada vez mais sem a presença dos pais para lhes impôr limites e regras"

Portugal é um País de maus condutores de automóveis. Esta verdade já faz parte da realidade nacional. Lá fora também não nos livramos da fama. Ainda esta semana, uma nota consular aos turistas e expatriados dos Estados Unidos da América considerava a condução dos portugueses "um perigo especial" a "altas velocidades" em "estradas mal sinalizadas".
Ultimamente os casos de circulação em contramão agravaram o problema, causando receios a quem se desloque pelas auto-estradas. O que se passou no IC1 de Viana do Castelo, com um jipe em contramão a alta velocidade conduzido por um jovem de 24 anos, causa arrepios. E os treinos que se faziam em Abrantes para circular no IP6, leva-nos a considerar que há razões a descobrir como possíveis causas deste tipo de iniciativas.
Qual a sua explicação? Psicólogos sociais e clínicos começam a debruçar-se sobre a questão e a desvendar as suas raízes. E a opinião comum é a "patologia limite". Ou seja, trata-se de jovens que "odeiam regras, limites e retiram prazer da destruição do outro". Além disso, a patologia revela que "a conduta viril na condução corresponde a um sentimento de pobreza de auto-estima sexual. A velocidade é inversamente proporcional à virilidade".
A "desestruturação familiar na sociedade ocidental" surge como outra causa: "Os miúdos crescem cada vez mais sem a presença dos pais para lhes impôr limites e regras, as quais acabam por ser assimiladas pela convivência com o grupo da rua."
A paixão pelas corridas a velocidades extremas vem de um movimento do Japão sob o nome de street racing. Os condutores consideram-se mais rápidos do que a polícia e usam artimanhas para não serem detectados. Tranformam os carros, colocando-lhes acessórios que custam milhares de euros. Fazem apostas para ver quem é mais rápido e comunicam pela Internet numa linguagem codificada. E têm locais onde realizam as corridas a 230 Km/h de ponteiro.
Quem são estes jovens? Normalmente filhos de famílias da classe média a quem os pais fizeram todas as vontades em crianças. Vestem roupa de marca e juntam-se em grupos exclusivamente masculinos. A distinção dos outros jovens baseia-se apenas na loucura pelas altas velocidades.
Duas reflexões se impõem a partir desta situação. A primeira diz respeito às facilidades com que os jovens acedem aos carros topo de gama e aos acessórios caros que lhes adicionam. Quem lhes dá o dinheiro necessário? E qual a consciência dos pais que esbanjam assim somas enormes em coisas tão supérfluas ? Será que estes pais ganham dinheiro a rodos para se permitirem tais extravagâncias ? E será justo que tal aconteça? Temos que dizer que se trata de um comportamento eticamente reprovável.
A segunda reflexão tem a ver com a educação familiar. Se os filhos "odeiam regras" e não se orientam por ideais que dão sentido à vida que sociedade estamos a construir? Mais uma vez a culpa recai sobre os pais que fogem às suas responsabilidades. A propósito da insegurança, uma das federações de pais francesas situava as causas na "demissão dos pais". Filhos sem regras, sociedade sem limites. A questão está, pois, no refazer da família. O desafio de sempre mas agora com muito mais actualidade.