Identificada há um ano na Igreja de Aldeia Viçosa
Pintura de Grão Vasco com projecção internacional

Por Victor Amaral


O que aconteceu passado um ano sobre a descoberta de um painel do pintor Vasco Fernandes, o Grão Vasco, na Igreja de Aldeia Viçosa, concelho da Guarda. O que ficou para lá da polémica que, na altura, se gerou em redor do achado, identificado pelo historiador Vítor Serrão, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa? Por cá quase nada, além fronteiras a pintura tem tido ampla divulgação.
Após uma série de estudos preliminares de análise formal, técnica e estilística, apoiada em métodos laboratoriais seguros, a tábua quinhentista foi alvo de uma primeira comunicação pública na prestigiada revista científica francesa "Revue de L'Art, no seu nº 133, sob o título "Le tableau de Grão Vasco à Santa Maria do Porco". Em 15 páginas, o historiador português desenvolve um estudo global do painel recém-descoberto na igreja de Aldeia Viçosa, outrora aldeia do Porco, e atesta, por análise estilística comparativa, a comprovada autoria do pintor renascentista Vasco Fernandes. Segundo Vítor Serrão, a obra foi executada por volta de 1535-40 a mando de Estevão de Matos, um bacharel de leis da Guarda que fora escudeiro na corte de D. Manuel e na de D. João III.
Para o historiador, esta é uma divulgação importante à escala europeia adiantando que, em termos práticos, "está em planeamento uma terceira fase de estudo, com levantamento de reflectografia de infravermelhos da tábua, que só não teve lugar por causa de uma campanha de desinformação que à altura da descoberta ocorreu". Vítor Serrão refere-se, nomeadamente, ao facto de outros historiadores, como Pedro Dias ou Dalila Rodrigues, de Coimbra e Viseu, respectivamente, terem vindo a público contestar, na altura, a identificação do painel com o mestre Grão Vasco.
Ora, para o autor desta identificação, todas as dúvidas estão postas de parte uma vez que o quadro, "fundamental para atestar a caracterização da evolução plástica e da personalidade do célebre pintor quinhentista, é uma obra maior do nosso Património da Renascença". Entende o historiador que "sé esse facto bastaria, dado tratar-se de peça que se encontrava de todo esquecida e com autoria por identificar, para merecer o interesse e a expectativa positiva de outros estudiosos". O que, pelos vistos, não aconteceu. Vítor Serrão lamenta que, em vez disso, o processo tenha gerado "alguma discordância". Acrescenta, em contrapartida, que em palestras realizadas para auditórios espanhóis, franceses e italianos "tem havido recepção muito interessada à identificação, que honra o património nacional".
Mas o papel da tábua de Vasco Fernandes de Aldeia Viçosa volta a ser equacionado, como peça de grande relevância, na recente "História da Arte em Portugal", da editora Presença, dirigido por José Augusto França.
O historiador acrescenta que a descoberta e o estudo lhe trouxeram alegrias mas também "algumas mágoas e desilusões, pela mesquinhez revelada por quem deveria mostrar outra responsabilidade e sensibilização artísticas em torno destas questões".
Vítor Serrão adianta que uma última fase em redor do painel será vocacionada para questões de conservação e de beneficiação da peça, "cujo estado merece cuidados, consolidação de suporte, limpeza de vernizes e remoção de repintes". Mas, acrescenta, "o assunto da sua localização não seja minimamente discutível, como obra que pertenceu e continuará a pertencer a Aldeia Viçosa".