O tecto recuperado do Salão dos Continentes
Inauguração do Salão dos Continentes
O Mundo visto pelo binóculo da Covilhã

O dia 30 de Abril ficou marcado pela abertura ao público do Salão dos Continentes, na sede do PCP na Covilhã. Após ano e meio de intervenção e um difícil processo de restauro, o salão abriu ao público. Carlos Carvalhas, Jorge Patrão e o Vítor Serrão foram algumas das figuras presentes na inauguração das pinturas que vieram mudar a forma de ver o passado artístico da Covilhã.


Por Ivone Ferreira e Mariana Morais


"Vou dizer pela primeira vez em público que tinha uma ideia muito negativa da Beira raiana e, concretamente, da Covilhã". Foi com estas palavras que Vítor Serrão, presidente do Instituto de História da Arte da Faculdade de Letras de Lisboa (IHAFLL) e responsável pela pesquisa histórica das pinturas setecentistas, iniciou o seu discurso. "Mas verdade é que, fruto do trabalho que há ano e meio arrancou, por convite do PCP, da Região de Turismo e do IPPAR, verificámos que afinal a Covilhã tem um património de grande mérito e valor no contexto do país". "O tecto que estão a ver mostra um modo de actuar, de agir, de decorar, num momento da história de Portugal particularmente complicada, do declínio de Portugal com o domínio espanhol" e testemunha uma atitude de orgulho local.
As obras de restauro foram levadas a cabo em resultado de um protocolo estabelecido entre o PCP, proprietário da Casa das Morgadas, local onde se encontram as pinturas, e a Região de Turismo da Serra da Serra da Estrela. Desde há cerca de 20 anos que este projecto era alimentado mas a falta de verbas e a inexistência de uma política na área do património levou a que só agora a recuperação fosse possível.
Como o Urbi noticiou na edição n º 20 , neste salão encontram-se pinturas barrocas dos séculos XVII/XVIII. Infiltrações de água e um envernizamento descuidado conduziram a uma deterioração progressiva das pinturas: quatro painéis pintados em madeira, que representam figuras femininas alusivas a quatro continentes: Europa, Ásia, África e América e são acompanhados por oito painéis laterais. Ásia e Europa são representadas como damas de estrato elevado. África e América são tidas como selvagens. "Os atributos da figura que personifica a África mostram isso mesmo: a figura com o dente de marfim simboliza o homem da zona tórrida, que tanto medo provocava a todos os descobridores que imaginavam não ser possível contactar essa zona sem ficar queimado", declarou o Dr. Ricardo Silva, mestre em História de Arte.

Abrir caminho a novas descobertas

A pintura representando o continente asiático em forma de mulher

Depois de limpo e restaurado o tecto lança novos desafios aos historiadores, sobretudo nos painéis laterais. A análise destas pinturas vai permitir uma leitura mais detalhada "de modos de ver o mundo através do binóculo da Covilhã. Embora ingénua, é um livro aberto do modo como, a partir da Covilhã, o mundo era entrevisto, revelado e descoberto" frisou Vítor Serrão. Até ao momento já se descobriu o nome da família que encomendou a obra, e a existência de uma escola de pintura na Covilhã, na qual se destacava o nome de Manuel Pereira, responsável pelas pinturas.
O secretário- geral do PCP aproveitou a sua presença na Sala dos Continentes para referir a importância do diálogo das culturas e da abertura ao mundo. "Estamos aqui na afirmação de um acto cultural e também na afirmação de um acto de democracia. Numa altura em que, pela Europa, velhos demónios se levantam, creio que, nesta semana que faz a ponte entre Abril e Maio, estamos numa afirmação de valores no nosso país e também universais."
O presidente da RTSE considerou que "a Covilhã está de parabéns" e realçou a importância das pinturas estarem nas mãos de uma entidade pública, uma vez que "se fossem de uma entidade privada já estariam destruídas." Para os investigadores de história da arte a recuperação dos painéis presentes na Casa das Morgadas veio abrir caminho para novas descobertas na região. O IPPAR e a Proestrela fizeram-se também representar.