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Direitos Humanos, Milosevic
e os Ausentes
A Declaração Universal foi proclamada pelas
Nações Unidas como "um ideal comum
a atingir por todos os povos e todas as nações",
tendo sido criada numa altura em que ainda eram recentes
as memórias das atrocidades causadas pela xenofobia
e a intolerância. Num período em que a Humanidade
e os Estados necessitavam de uma "Carta de Direitos"
para sua protecção e a reconstrução
do mundo devastado pela Segunda Guerra Mundial. Apesar
da forma poética e do seu carácter não
vinculativo para os Estados, a Declaração
aprofunda os Direitos Humanos dos pontos de vista jurídico,
político e social, como até então
nunca havia sido feito, mesmo em constituições
nacionais.
A Declaração Universal é o primeiro
texto de Direito Internacional que consagra a indivisibilidade,
interdependência e ausência de hierarquização
entre os direitos e o seu exercício, avançando
a perspectiva de que privar alguém de um direito
em nome de outros é por em perigo todos os outros.
Infelizmente, nem sempre o avanço das normas jurídicas
corresponde a uma efectiva protecção dos
direitos humanos. Apesar dos progressos realizados, a
sua implementação é imperfeita, demasiado
dependente das razões "de Estado", da
vontade política dos governos, dos seus interesses
económicos e estratégicos, ou dos recursos
(in)disponíveis. Por outro lado, o discurso e terminologia
dos direitos humanos são descaradamente "boicotados"
pelos governos, assessorados de relações
públicas e enquadrados (de acordo com as "necessidades")
por poderosos lobbies políticos, económicos
e/ou militares.
Mantêm-se a duplicidade de critérios dos
Estados hegemónicos quanto à política
internacional de direitos humanos, inclusive na sua estrita
concepção ocidental.
Os EUA têm tido um papel muito "importante"
(preocupante?), sobretudo no período pós-
"guerra fria", jogando xadrez internacional,
isto é, retirando apoio a "ditadores amigos",
patrocinando a sua substituição por regimes
democráticos liberais, mas a condenação
das ditaduras só acontece, quando tal não
colide com interesses geo-económicos e político-estratégicos
americanos (quem não se lembra da intervenção,
liderada pelos EUA, para derrotar, no Médio Oriente,
movimentos democráticos, como o liderado por Mohammed
Mossadegh, em 1953, no actual Irão, sobretudo por
ter nacionalizado a indústria petrolífera).
A pressão em prol dos direitos humanos só
é defendida até ao limite da não
coincidência de interesses, quando não se
põe em perigo as relações político-comerciais
bilaterais.
O dia 12 de Fevereiro de 2002 fica na história
da humanidade como o dia em que, pela primeira vez um
ex-chefe de Estado é acusado e julgado pela Justiça
Internacional. Slobodan Milosevic é acusado de
vários crimes, onde se destacam, o crime de genocídio
morte e deslocação de milhares de pessoas
nas guerras, que ocorreram entre 1991-1999, na Croácia,
Kosovo e Bósnia. Deste julgamento mediático
destaco vários aspectos e umas tantas questões.
Primeiro, o não reconhecimento do réu da
legitimidade e da legalidade (uma das razões apresentadas
pela defesa é o facto das testemunhas de acusação
poderem prestar depoimento à porta fechada ou sob
anonimato) do Tribunal Penal Internacional; segundo, a
possibilidade (algo remota ou quase impossível)
de Bill Clinton e Tony Blair serem testemunhas de defesa,
já que teriam conhecimento dos crimes pelos quais
Milosevic é acusado e mesmo assim continuaram com
a ronda de negociações e acordos, o que
faz deles cúmplices. Terceiro, e último,
porque é que Ariel Sharon não é julgado
pelos crimes contra os palestinianos, pelo episódio,
por exemplo, nos campos de Shabra e Shatila, em que se
massacraram 3 mil famílias de refugiados, em 1982-83?
Porque é que Bill Clinton não é julgado
pela morte de milhares pessoas que dependiam dos medicamentos
produzidos por uma fábrica que ele ordenou bombardear
no Sudão, mesmo sem provas concludentes? Porque
é que os líderes da Unita não são
julgados pelas atrocidades cometidas (ainda a acontecerem)
em Angola? Porque é que os terroristas do UCK,
treinados e municiados pelos Serviços Secretos
Ingleses e pela CIA, não são julgados pelos
crimes mais hediondos que cometeram no Kosovo? Porque
é que os representantes máximos do FMI não
são julgados pelas desigualdades sócio-económicas
que provocaram, sobretudo nos países do "terceiro
mundo" e mais recentemente, no mediático caso
da Argentina ? Porque é que não...?
É impreterível a acção, a
intervenção, o sentimento e a crítica
contra estas e todas as outras situações
similares!
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