José Geraldes

 


Verdade e coerência

Tempo de eleições é tempo de promessas. Na pré-campanha das Legislativas de Março, as promessas sucedem-se já em catadupa. Umas sem hipóteses de cumprimento, outras de um irrealismo total e uma série delas que podem ser executadas.
Os candidatos a primeiro-ministro por respeito aos portugueses, não podem enveredar pelos caminhos do populismo sempre perigosos e traiçoeiros. Nem cair na tentação de dar por adquirido o paraíso aos eleitores. Exige-se aos candidatos o mínimo de verdade e coerência. Até porque os tempos que se avizinham vão ser de "vacas magras." Por exemplo, é impossível investir em obras faraónicas e remediar, ao mesmo tempo, as listas de espera dos hospitais e dar aos idosos pensões condignas. O estado das finanças públicas não permite devaneios de qualquer espécie e os portugueses não podem ser enganados, a este propósito, seja a que pretexto for.
Falar verdade aos eleitores impõe-se, pois, como um dever de consciência. A não observância desta norma é mais uma achega para o descrédito da classe política, já de si tão abalada. A coerência com as promessas feitas só enobrece os candidatos. Para que o eleitorado lhes dê um capital de confiança, elemento fundamental para o exercício pleno das suas funções. Se os candidatos pautarem a sua campanha pela coerência e pela verdade, a democracia fica a ganhar em todas as suas dimensões. E torna-se um exemplo de pedagogia para os cidadãos. Daí a importância de banir de todos os discursos e debates o chamado "vale tudo" só para cativar votos. É que, 27 anos depois de instaurado o regime democrático em Portugal, há ainda muitos défices a corrigir. E, como o exemplo deve vir sempre de cima, os candidatos em liça têm maiores responsabilidades.
E, por favor, não nos dêem espectáculos de circo. A luta política é demasiado séria para brincar com o povo. Debatam e apresentem aos eleitores as suas propostas para a governação do País. Mas não recorram à mentira sistemática e à calúnia de politiquice barata. Sejam sérios nos discursos de campanha. Tenham a coragem de dizer ao povo que os sacrifícios no futuro são inevitáveis. Que não se podem atingir patamares europeus, em qualquer área social, sem "apertar o cinto" e que nada se consegue sem esforço, como muito bem sublinhava o Manifesto sobre a educação. Não adociquem as receitas para regenerar este País atingido por muitas maleitas e vícios. Prometam e apliquem com verdade que os empregos dos "boys" acabaram de vez em Portugal. Enfrentem os lóbis da sociedade portuguesa a defenderem interesses corporativos e que se transformaram em cancros a impedir a igualdade de oportunidades para todos. Digam com clareza que, para distribuir riqueza, é preciso criá-la. E isto só se consegue com o aumento da produtividade. Há países de Leste que até neste ponto já nos ultrapassaram. Mas, para isso, impõe-se uma cultura de rigor e exigência. Ou querem, como escrevia Eça de Queirós, que voltemos a ser o "país da choldra"?
Falem verdade e ajam com coerência, se, de facto, querem um Portugal de que nos possamos orgulhar. Até 2006, ainda temos os fundos europeus. E depois? Nas vossas mãos está o nosso destino que nunca mais pode ser "o da apagada e vil tristeza".
Quem tiver o voto do povo a 17 de Março assume uma responsabilidade histórica. Respeitem o povo.