Tons psicadélicos num sonho de criança
All is Dream

Mercury Rev
V2 Records, 2001


Por Sérgio Felizardo

O ataque sónico-psicadélico dos norte-americanos Mercury Rev em 1991, aquando da edição do seminal "Yerself is steam", marcou eternamente muitos dos que, então, militavam nas fileiras do indie rock (rótulo que, à altura, incluía aqueles que hoje já não contempla e cujos exemplos vão dos Pixies, aos Pavement, sem esquecer os Sonic Youth, ou, deste lado do Atlântico, os Ride ou os My Bloody Valentine, entre tantos outros). Desses tempos do grupo de Buffalo (Nova Iorque) guardam-se no ouvido as corridas vertiginosas de guitarras em chamas, os tapetes hipnóticos de muralhas de distorção apoteóticas e, lá no meio, dissimulado, mas suficientemente presente para não se esquecer, um sentido único e irrepreensível para a construção de canções melodiosas, com refrões cativantes e letras delirantes. Nos anos seguintes, e em boa verdade até à edição em 98 do mundial e unanimemente aclamado "Deserter's Songs", a banda, agora de Jonathan Donahue, Grasshopper, Dave Fridman e Jeff Mercel (núcleo duro a que nos dois primeiros discos se juntavam mais uns poucos, com destaque para o vocalista Dave Backer), deixou que o lado sónico perdesse espaço, para ganhar uma atitude mais arty, mas não menos psicadélica ("Boces" e "See you on the other side"). Depois, quando tudo se julgava perdido devido ao fracasso comercial do terceiro lançamento, os Mercury Rev concentram-se naquilo que, afinal, estava lá desde o inicio: as canções. E é isso que voltam a fazer em "All is dream". Orquestrações de sonho, em ambiente "estranho mundo de Jack", convivem com coros celestiais e melodias quase infantis, que, no entanto, não dispensam crescendos gloriosos de guitarras ou pianos electrizantes sacados aos blues.. O psicadelismo, esse, continua lá, desta vez vem é disfarçado de pacote de rebuçados "pr'ó menino e pr'á menina".