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Estudantes adormecidos
Um dos efeitos da demissão
do Primeiro Ministro na sequência do resultado das
últimas autárquicas foi o congelamento do
Novo Regime de Recrutamento e Colocação
de Docentes, documento já na sua quarta versão,
e que vinha sendo cuidadosamente preparado pelo Ministério
da Educação para entrar em vigor já
nos concursos de Janeiro deste ano. O diploma estava a
ser negociado vírgula a vírgula pelos sindicatos
do sector, e era motivo de preocupação para
muitos professores, não só, por razões
óbvias, os contratados, mas para os milhares de
destacados por esse País fora, a quem fora prometido
que teriam de voltar, sem apelo nem agravo, às
escolas onde um dia efectivaram.
A ratio do ministério, que parecia presidir à
elaboração do documento, por seu turno,
era a seguinte: acabar de vez com os mini-concursos, que
tanta mediática dor de cabeça provocavam
por alturas de Setembro; e acabar, tanto quanto possível,
com as manifestações e movimentações
de professores contratados e não colocados, tendo
em conta a subtil aritmética de que acabar com
manifestações não significa necessariamente
acabar com os problemas que lhes dão origem.
Estranhamente, o documento que trazia os professores em
polvorosa - embora baixinho, porque estavam a ser oferecidas
algumas contrapartidas - nunca preocupou os estudantes.
E devia. E muito. Até 14 de Dezembro, altura em
que o ME apareceu com a sua 4ª e última proposta,
no que toca a estudantes o documento previa o seguinte:
nos concursos, os professores que já tivessem tempo
de serviço concorriam sempre à frente dos
candidatos que nunca tivessem ensinado (em eduquês
diz-se "numa prioridade diferenciada"). Em termos
práticos isto significava que se a Martinha se
licenciasse com 17 valores, e a Ritinha, com 12, mas já
tivesse dado dois dias de aulas, nos concursos, a Ritinha
ficava sempre à frente da Martinha. E se só
houvesse uma vaga e duas candidatas, tanto pior para a
Martinha e o seu 17, que ficava no desemprego ultrapassada
por um 12, e com poucas razões para se manifestar,
pois se nunca tinha trabalhado, não era professora,
e muito menos professora desempregada. Num tempo suficientemente
longo, o sistema acabaria assim, mediante a engenharia
das prioridades, por absorver todas as pessoas que já
lá tinham entrado, colocando um apertadíssimo
torniquete à entrada de mais, novos candidatos.
Ora o preço disto era a subversão do espírito
do concurso público (o melhor candidato para o
lugar) substituído pelo comodismo público
(o que fizer mais barulho para o lugar).
A última proposta do ME prevê agora, no estabelecimento
das prioridades, três anos de serviço docente.
É mais justo, e mais equilibrado, que a versão
anterior. Mas é mais justo em si? A Martinha e
o seu 17 perdem sempre. É que um candidato com
12, e 3 anos de serviço, que para efeitos de concurso
fica com 15 valores, consegue, ainda, ficar sempre à
sua frente - e isso pode ser a diferença entre
a Martinha conseguir, ou não, fazer o tempo de
serviço que lhe permita alcaçar a prioridade
"boa".
Isto não se passa no país ao lado, nem na
lua. É em Portugal, só não entrou
já em vigor por puro acidente. Mas os estudantes
nem repararam. Na UBI, onde há suficientes cursos
via ensino, a Associação de Estudantes e
os alunos não se podem alhear de algo que é
muito mais sério que mais propina, menos propina,
mais tostão, menos tostão. Estão
os estudantes de acordo numa matéria que objectivamente
os prejudica? É hora de acordar e dizerem de sua
justiça, pois seja a proposta congelada, ou outra,
a ver a luz do dia, o espírito que a anima é
este e não mudará a não ser que o
obriguem.
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