Anabela Gradim

Tabagismos


Hipocrisia militante no seu melhor. Não consigo encontrar uma, nem uma única razão sequer para que em Portugal não se proíba a venda de tabaco a menores de idade. Os números falam por si: 11 mil mortos por ano; 85% das iniciações tabágicas a ocorrerem entre os 11 e os 18 anos; são precisas uma média de sete tentativas para deixar de fumar; e, last but not the least, 80% do lucro das vendas de cigarros são impostos arrecadados pelo Estado. Para prevenir a progressão geométrica do vício bastava muito simplesmente proibir a venda - venda, não consumo - a menores de 18 anos. Mas os milhões de contos que a Tabaqueira arrecada todos os para os cofres do Estado pelos vistos falam mais alto.
O pior nem é isto. O pior é ter de suportar o moralismo anti-tabágico e, não poucas vezes, amargas queixas contra os fumadores. Que gastam. Que fazem e acontecem. Que dão grandes despesas ao Serviço Nacional de Saúde. Deixem-se de brincadeiras! Toda a despesa há-de ser largamente compesada pela receita, ou já não existiria.
Note-se, não falo em interditar ou penalizar o consumo de quem quem que seja. Só acho que num País civilizado o sr. da tabacaria não devia poder vender cigarros a menores.
Mas se assim é, se pode e alegremente o faz, podiam ao menos poupar-nos ao patético discurso da prevenção, e da sensibilização das camadas jovens. Ou sim, ou sopas. Este imbróglio do "uma no cravo outra na ferradura" é que não. E já agora, sabiam que ao contrário da metadona, os tratamentos para abandonar o vício do tabagismo não são comparticipados? Nem um tostão. Se querem deixar de participar nesta choruda fonte de rendimentos para o Estado, pois façam-no à própria custa. E está muito bem.
Mas se não matam a galinha porque os ovos são dourados, então deixem-na em paz e parem de lhe torrar a paciência. E assim temos a indústria da produção e venda, e isto está certo, pois há mercado; e a indústria da prevenção, financiada com um por cento dos lucros da primeira, e com uma mensagem para distribuir. Nada de novo. Business as usual. Mas se não há coragem para tomar a medida que verdadeiramente poderia fazer a diferença - proibir a venda a menores - então também não há moral para pregarem o que é melhor e o que deveriamos fazer; além de que a versão cínica - e às vezes, embora raramente, acordo assim de manhã -, traz a patine de uma ópera bufa.
Jovem, queremos o teu dinheiro. Precisamos de ti e do teu pulmão patriótico. Como és frágil e crédulo, empresta-nos também essa orelha, não deixaremos passar em branco esta excelente oportunidade de moralizar. Aí te segredaremos impropriedades de um segredo que bem guardado temos.