Produtor de conteúdos deixa o alerta na Guarda
Escola "desadaptada" às novas exigências

Por Victor Amaral

 

"A escola, com o seu peso, não tem velocidade suficiente para se adaptar às pessoas de hoje, nem para as compreender". O alerta é de António Saraiva, autor, realizador e produtor de TV, um dos oradores nas conferências de Cibercultura que aconteceram na Mediateca VIII Centenário, na Guarda, quinta e sexta-feira passadas. Ao abordar questões como a liberdade e ética na Internet, Saraiva não tem dúvidas de que as escolas, incluindo universidades, "estão desadaptadas" face à forma como as novas tecnologias de informação criam a percepção do mundo.
O especialista, presidente da Associação para a Fronteira Electrónica e editor da "cyber-net" - a primeira revista portuguesa para a Internet -, sustenta que há também um problema curricular por existirem cursos superiores alegadamente desfasados das necessidades reais do País. Dá o exemplo do curso de Antropologia, questionando quantos antropólogos precisa Portugal por ano que o justifique. Acérrimo defensor das vantagens da Internet, na perspectiva da abolição de distâncias e de culturas, António Saraiva considera que tão importante como as auto-estradas e ferrovias é a aposta de qualquer Governo nas vulgarmente chamadas auto-estradas da informação. Vê com bons olhos que estas se alastrem no território nacional mas avisa que "há um preço de interioridade histórico que a Internet, só por si, não resolve". Saraiva reconhece o esforço de recuperação do País, mas os dados de um relatório da Comissão Europeia divulgados a semana passada não deixam margem para dúvidas: As escolas portuguesas são as mais afastadas do computador, o que dá o pior rácio aluno/computador com ou sem ligação à Internet. Esta realidade, politicamente contrariada com a crescente medida de dotar com computador ligado à rede todas as escolas do 1º ciclo, leva António Saraiva a reforçar que a escola "tem de mudar muito nos próximos 20 anos porque está em decadência". Em seu entender, as crianças estão hoje envolvidas num mundo de quantidade e qualidade de informação "drasticamente diferente de gerações anteriores e isso tem efeitos que estão longe de qualquer classificação". Para reforçar esta ideia de necessárias mudanças recorre ao exemplo: "Se formos buscar um médico ao século XVIII e o colocarmos numa sala de operações ele não sabe onde está, se formos buscar um professor e o colocarmos numa sala de aula continua sem problemas". Preocupa-o ainda questão da avaliação dos alunos criticando aquilo que parece ser uma prática corrente no secundário: "Não se pode chumbar os alunos até ao 9º ano de escolaridade". As consequências, em seu entender, são "gravosas" para o futuro porque "quem deveria ter sido chumbado uma ou duas vezes nunca mais vai ser ninguém na vida a partir daí".
António Saraiva foi um dos oito conferencistas desta invulgar iniciativa na Guarda que possibilitou visionar projectos artísticos inovadores e levantou o véu para as mais prementes questões em redor das novas formas de representação da realidade e dos acontecimentos.