José Geraldes

Efeitos "de férias" da lei eleitoral das autarquias


A nova Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias, aprovada no Verão passado, está a gerar efeitos perversos. Antes, os candidatos e suplentes dispunham de pouco mais de uma semana, ou seja, o tempo de duração da campanha eleitoral com direito a ordenado integral e subsídio de refeição.
A nova lei concede-lhes, nem mais nem menos, um mês de dispensa do trabalho com a garantia de todas as regalias. Assim "nos 30 dias anteriores à data das eleições, os candidatos têm direito à dispensa do exercício das respectivas funções, sejam públicas ou privadas, contando esse tempo para todos os efeitos, incluindo o direito à retribuição como tempo, de serviço efectivo". Este é o teor do novo artigo 8 do estatuto dos candidatos.
Em concreto, as empresas ou serviços do Estado estão sujeitas a hemorragias de empregados que podem paralisar serviços essenciais.
Um caso paradigmático acontece já na Câmara do Fundão. Do conjunto de 200 funcionários, 45 pertencem a listas partidárias.
O presidente da autarquia apressou-se a denunciar que "alguns serviços ficarão praticamente paralisados.(...) "Só no serviço de limpeza estão sete funcionários em dispensa".
Imaginemos agora uma média empresa de 25 trabalhadores, 10 dos quais inscritos nas listas de candidatos. A empresa ao fim de um mês fica descapitalizada. Os 15 que permanecem não conseguem fazer o trabalho dos outros.
Os produtos a realizar descem para números irrisórios. E com a conhecida fraca produtividade que temos, a empresa só tem uma alternativa: abrir falência. E aí temos uma legião de desempregados. E o País a andar mais uma vez para trás.
Os deputados que aprovaram a lei estariam certamente a dormir ou não leram sequer o texto com a devida atenção. E será justo que o Estado penalize assim as empresas ?
Como pode uma empresa dispor de capacidade financeira desfalcada durante um mês (!) de trabalhadores qualificados na produção ?
Um outro problema se levanta que tem a ver com a ética. A comunicação social já reportou casos de candidatos inscritos, sobretudo suplentes que aproveitam a nova lei para gozarem de um mês de férias extra. E apontam-se exemplos na função pública. A tentação é forte demais para que possíveis candidatos a ela resistam.
Argumenta-se que a revisão da lei teve em vista cativar mais pessoas para a participação política. Mas não parece que este seja o melhor caminho. Ou seja, causar prejuízos às empresas e aos serviços do Estado.
A participação política, como exercício de cidadania, exige um outro tipo de acção. E a primeira condição centra-se no espírito de missão à comunidade e ao bem comum.
Os partidos políticos têm o grave dever de educar os seus filiados inscritos no uso recto dos privilégios da nova lei. Mas podem levantar-se interrogações, pois a ânsia de caça ao voto cega os candidatos para alcançarem a vitória desejada.
Damos o benefício da dúvida, apesar de tudo, aos responsáveis locais na moralização das dispensas. Caso contrário, os efeitos perversos da lei destroem as empresas, minam a função pública e são uma afronta à ética da política.