Alguns já a conhecem
da campanha a favor do lobo ibérico, outros da sua
longa caminhada para promover a música tradicional.
Né Ladeiras, nome incontornável da música
popular portuguesa, esteve no Café Teatro do GICC
na passada sexta-feira , no âmbito do Festival de
Teatro 2001. "Da Minha Voz" é o seu novo
projecto e a sua parceria com "Milho Rei" espelha
a alma de uma mulher movida pelo amor às suas raízes.
Cansada de uma vida citadina, resolveu vir morar para ao
pé da Serra e fixou residência no Paúl,
onde foi convidada por Benjamim para tocar com os Milho
Rei. " Os Milho Rei são a banda do Benjamim,
do Luís Mugeira e do Márinho" explica
Né Ladeiras, " e, tocar com eles, é dar
asas a um sonho, porque a recolha dos temas tradicionais
da Beira Baixa jamais deixará de fazer parte da minha
vida" acrescenta. O projecto com Leonor, vocalista
que acompanhou a sua actuação com os Milho
Rei, resume-se a um duo, apenas de polifonias, que tem como
único instrumento o adufe. "A Leonor tem uma
grande voz e está a ensinar-me muito, eu nem sabia
tocar adufe" afirma com uma simplicidade que em tudo
a caracteriza.
A luta contra a indiferença
Contudo, a sua prioridade vai
para um projecto que iniciou hà cerca de
dois anos com Chico César e Tiago Torres
e que baptizou de "Da Minha Voz". "Este
trabalho tem dois pais e uma mãe. O Chico
fez a música, o Tiago as letras e eu dei
a ideia" declara sorrindo. Neste projecto,
já com um trabalho editado a sair no próximo
mês, Né trabalha em parceria com
Paulo da Silva, teclas, Nuno Patrício,
guitarra, e Vasco Ribeiro Casais, percussão.
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"Da Minha Voz" dá som a uma revolta
contra o esquecimento do papel das mulheres durante
os Descobrimentos
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"Todos eles são mais novos que eu. Têm
muito talento e são a verdadeira materialização
deste trabalho. Eu tinha tudo dentro da cabeça,
queria certos sons, mas não sabia como os fazer
e eles deram corpo às minhas ideias" confessa
modestamente. O nome que escolheu para o grupo emana o
sentimento que a move. "Da Minha Voz" é
um grito de revolta por todas as mulheres que foram ignoradas
na época dos Descobrimentos onde se enalteceram
os feitos dos homens e se esqueceu o papel da mulher.
A história da negra, da índia, da mulher
que é queimada pela "Santa" Inquisição,
retrata o desespero a que Né recusa a indiferença.
"Há muito que a mulher está sobre a
alçada patriarcal. É característica
do homem fazer a guerra, mas a mulher é dotada
de uma sensibilidade superior" manifesta, apesar
de não se considerar uma feminista, pois não
odeia os homens, apenas exige respeito.
O seu amor pela música e o sentimento de luta que
a move levaram-na ainda a abraçar outro projecto
que retrata a vida de uma mulher suíça que
se converte ao islamismo. "Escritos no deserto"
é a história de Isabel Abrart e da sua caminhada
pelo deserto, onde se perdeu e se encontrou, narrada ao
som da música.
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