José Geraldes
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Imigrantes e tolerância
A presença maciça
de imigrantes em Portugal é um facto novo na nossa
história. Tradicionalmente dava-se o fenómeno
contrário. Os portugueses saíam para outros
países à procura de melhores dias. A emigração
tornou-se uma constante dos nossos hábitos de vida.
E quase não há vila ou aldeia sem um nosso
familiar emigrado.
Nos últimos anos, Portugal foi "invadido"
por gentes das ex-colónias e dos países
de Leste.
A explicação deste fenómeno imigratório
deve-se a várias razões. A independência
das ex-colónias levou a que os seus naturais procurassem
na antiga metrópole trabalho e melhores condições
de vida. A queda do muro de Berlim e o consequente desmoronamento
do Império Soviético deixou milhares de
pessoas na miséria. A procura de emprego noutros
países do Ocidente foi a aventura para russos,
moldavos, ucranianos e romenos.
Com as obras da Expo 98 e a construção das
auto-estradas, Portugal exerceu uma atracção
especial para estes novos desempregados. Hoje contam-se
pelos dedos as obras de construção civil
em que não haja africanos ou imigrantes das antigas
repúblicas soviéticas. E igualmente em outras
áreas tão diversas como as confecções,
restaurantes e trabalhos domésticos. Uma diferença
marca os emigrantes portugueses da década de 60
desta nova vaga de imigração. Os portugueses
em geral eram na maioria analfabetos. Os imigrantes de
Leste têm estudos superiores e cursos técnicos
qualificados. E, como os portugueses na França,
Alemanha, Inglaterra ou Canadá, encontram-se disseminados
por todo o País com predominância para os
grandes centros urbanos.
É impossível saber, em números exactos,
quantos são actualmente. O governo português
procedeu a um acto de legalização. Mas ficaram
muitos de fora. Os clandestinos somam milhares que ninguém
conhece.
A situação destes imigrantes presta-se a
muita exploração por parte das entidades
empregadoras e à marginalização social.
As condições de habitação
não são as melhores. E a aceitação
pelos portugueses não corresponde às tradições
da nossa secular hospitalidade e experiência histórica
no contacto com outros povos no tempo das descobertas.
Sem exagero, um fundo de racismo tenta vir ao de cima.
E nós que nos considerávamos acolhedores
e tolerantes! A xenobofia manifesta-se mais contra os
africanos. Esta atitude não está de acordo
com as nossa raízes cristãs. João
Paulo II dizia, em Agosto último, que "toda
a consciência recta não pode deixar de condenar
decididamente o racismo, seja qual for o coração
ou lugar em que se manifeste."
É preciso sublinhar que passou o tempo das sociedades
monolíticas. O filósofo Popper explicou-nos
que vivemos em sociedades abertas. Daí a recusa
do domínio dos outros qualquer que seja a forma
adoptada. A tolerância é a norma que deve
presidir às relações humanas. Tolerância
não significa cedências fundamentais mas
leva ao reconhecimento do ser humano com os seus direitos
e deveres. Como um outro igual a mim.
É de lembrar, a este propósito, a definição
de pluralismo do dicionário de língua inglesa
: "Condição da sociedade na qual numerosos
e distintos grupos étnicos, religiosos ou culturais
coexistem dentro de uma nação."E o
Simpósio dos Bispos Europeus de 1996 conclui :
"Educar para o pluralismo é uma exigência
actual. Isto significa educar para o diálogo, para
a confiança recíproca, para o respeito para
o outro, seja ele quem for, para uma linguagem nova e
compreensível."
O fenómeno da imigração tão
vasto em Portugal confronta-nos com um novo desafio ao
qual, sem complexos, devemos responder. A presença
dos imigrantes pôe à prova as nossas capacidades
de povo historicamente tolerante e hospitaleiro. E de
sabermos aproveitar uma nova cultura e uma riqueza humana
que só nos engrandece. Trata-se de uma janela de
oportunidade para o nosso crescimento como pessoas e dignidade.
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