José Geraldes

Terrorismo e barbárie


Horror. Barbárie. O Inferno de Dante em directo pelas televisões. O que se julgava, à primeira vista, ser mais um possível acidente aéreo, nos Estados Unidos, veio a revelar-se num atentado refinado de terrorismo planeado ao milímetro. E com uma técnica de precisão altamente qualificada.
Os dados disponíveis do ataque terrorista contra as torres do World Trade Center e contra o Pentágono, com o sequestro de aviões comerciais, demonstra que os seus autores se moviam à vontade. E não é difícil descortinar o envolvimento de pessoas com imunidade diplomática.
A dúvida coloca-se na fiabilidade dos serviços secretos americanos. Como é possível que o FBI se tenha mostrado tão vulnerável? Não sabemos quando haverá uma resposta a esta pergunta.
A questão do Médio Oriente e o fundamentalismo islâmico com a proclamação da "guerra santa" estão na origem do pretexto de tais ataques bárbaros. Mesmo que haja negações dos seus responsáveis. Aliás só um louco podia desencadear um atentado desta natureza. E nem mesmo a causa palestiniana pode justificar este tipo de ataques suicidas para a sua resolução.
Os alvos atingidos têm um significado simbólico em relação à civilização ocidental. E os símbolos das culturas devem ser respeitados. A não ser assim, entramos no reino dos bárbaros. Helena Rocha Pereira, professora jubilada das civilizações antigas, lembrava, há pouco tempo, numa entrevista, que hoje os homens cometem actos de barbárie porventura mais repulsivos que os seus antepassados anteriores e posteriores à era cristã primitiva.
A natureza do homem continua a ser a mesma. Só que em contextos históricos diferentes. Com idêntica capacidade para o bem e para o mal.
Este ataque suicida representa um regresso à barbárie. Na expressão do Concílio Vaticano II trata-se de "uma nova forma de guerra". O terrorismo surge assim como uma ameaça mundial à estabilidade e ao diálogo civilizado entre as nações.
Sem o tom de profetas da desgraça, estamos em crer que a escalada vai enfrentar sérias dificuldades para ser travada a bem da Humanidade e progresso da civilização. E as 40 bombas atómicas desaparecidas a seguir à queda da antiga União Soviética e até agora nunca encontradas não augura nada de bom. Pode ser pessimista a nossa posição mas uma atitude realista prepara-nos para os imprevistos do futuro. O domínio das armas químicas é fundamental para o equilíbrio do mundo.
O dia 11 de Setembro de 2001 marca uma data negra que baliza a história da nossa civilização. O papa Paulo VI na célebre visita à sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, pronunciou uma frase emblemática : "Nunca mais a guerra." Agora temos de acrescentar : "E nunca mais tais práticas de terrorismo."
O terrorismo baseia-se na intolerância. E põe em cheque a liberdade dos cidadãos. Esta liberdade é "uma exigência da Razão humana", segundo a expressão de Karl Popper. Daí o "tolerarmo-nos uns aos outros", conforme o que somos e representamos.
Júlio Verne previu a ida do homem á Lua. O facto aconteceu. E hoje já se passeia no espaço. No caso do atentado na América, dois escritores em ficção descreveram actos terroristas semelhantes. Larry Collins e Dominique Lapierre , no livro O Quinto Cavaleiro, imaginaram cenas de terrorismo em solo americano. Tom Clancy , na obra Executive Orders, previu mesmo a queda de um avião comercial sequestrado, no edifício do Capitólio.
A imaginação literária transformou-se numa realidade totalmente abominável com requintes de barbárie. A democracia foi atingida no seu coração.
O atentado dos Estados Unidos é um alerta para que cessem os discursos de retórica sobre a defesa dos valores democráticos e se elimine esta nova forma de guerra que é o terrorismo. A punição dos criminosos deve ser exemplar mas com base na matriz da civilização ocidental. Para que os valores da democracia gritem mais alto do que a barbárie.