Clube de Combate

de Chuck Palahniuk

 

"Enquanto estiveres no clube de combate, não és o dinheiro que tens no banco. Não és o teu emprego. Não és a tua família e não és quem dizes a ti próprio que és. (...) Não és o teu nome. (...) Não és os teus problemas. (...) Não és a tua idade. (...) Não és as tuas esperanças."

Por Catarina Moura

Desta vez só li o livro depois de ver o filme. Por causa do filme. Não costuma ser assim mas desta vez foi. Mesmo tantos meses depois, foi difícil escapar à visão caleidoscópica e vertiginosa de David Fincher, aos rostos que ele escolheu. Mas no combate entre a imagem e a palavra, esta saiu vencedora. A escrita de Chuck Palahniuk é uma forte teia que enreda e absorve quem nela mergulha. Classificado como uma das mais carismáticas revelações da literatura americana dos finais do século XX, em Clube de Combate, o seu primeiro romance, Palahniuk despe a alma de toda uma geração - a nossa. Uma geração que nunca viveu uma grande guerra. Uma geração cuja única depressão é a das suas próprias vidas, prisioneiras no vazio que o capitalismo obriga a alimentar, a escavar cada vez mais fundo, a deixar instalar e criar raízes. Uma geração desperdiçada em empregos monótonos e pouco atraentes para conseguir comprar coisas de que, na realidade, não precisa, mas sem as quais acredita não conseguir viver. Uma geração criada por mulheres, dilacerada por um passado de ausência e separação. Uma geração que vai morrer sem nunca ter vivido, sem experienciar a verdadeira perda, sem saber o que é uma cicatriz.
Aprisionado na monotonia de uma vida demasiado completa, dividida entre a rotina das viagens de avião que o emprego-fato-e-gravata exige e o apartamento situado no 15º andar de um arranha céus ("uma espécie de arquivo de ficheiros para viúvas e profissionais jovens"), cheio do conforto de irresistíveis catálogos que, página a página, nos apresentam peças sem as quais - descobrimos então - já não saberemos viver, há alguém que deixa de dormir. Este "alguém", que nunca revela o seu verdadeiro nome, é quem nos conta a história da sua vida. Uma vida que começa no dia em que conhece Tyler Durden.
"Estava cansado, marado e cheio de pressa e sempre que entrava para um avião só queria que o avião se despenhasse. Tinha inveja das pessoas com cancro. Odiava a minha vida." Então surge Tyler. O anjo louro. O terrorista da indústria de serviços domésticos. O criado guerrilheiro. O fabricante de sabão. "Adoro tudo no Tyler Durden, a coragem dele, a esperteza. O atrevimento. O Tyler é divertido e encantador e convincente e independente, e os homens admiram-no e esperam que ele lhes modifique o mundo. O Tyler é competente e livre e eu não sou." Tyler Durden, o fundador dos clubes de combate. Tyler Durden, a lenda viva. Tyler Durden, a mente por trás do Plano da Destruição. Tyler Durden, o amante da Marla Singer. Tyler Durden, o alter ego de alguém que passa anos sem conseguir dormir e, nesse limbo da insónia (onde tudo é uma cópia de uma cópia de uma cópia de uma cópia...), perde toda a noção da realidade à medida que é sugado numa espiral de decadência. Se calhar o auto-aperfeiçoamento não é a resposta, diz-nos Tyler. Se calhar a autodestruição é a resposta. Revolução. A violência como catarse. A violência como forma de auto-conhecimento. A violência como libertação.
Dogma de Tyler Durden: o ódio de Deus é melhor que a sua indiferença. "A não ser que consigamos obter a atenção de Deus, não podemos ter a esperança nem da redenção nem da condenação. O que é melhor? O inferno ou o nada?" Segundo o dogma de Tyler Durden, só depois de bateres no fundo poderás ser salvo. "Quanto mais baixo caíres, mais alto subirás. Quanto mais longe fugires, mais Deus te quererá de volta". Só depois de bateres no fundo poderás ser o filho pródigo. Ele bateu no fundo. Foi salvo? Não? Isso já era dizer de mais.