MUDANÇA


Edmundo Cordeiro

É a mudança social. Já não é possível estar com alguém sem estar com o telemóvel. E ele toca e fala-se sem nenhum pudor, isto é, sem o mínimo sentido do outro. Actualmente, só quando outrem surge couraçado na forma policial, aí sim, outrem passa a ser outrem. Outrem mete medo, prontos, então é mesmo outrem! Se não, é sempre o salve-se quem puder, a mesma falta de horizonte de sempre, o mercedes que ocupa a cabeça toda de um português médio, agora que é mais baratinho trazê-lo de fora - 'bora aí meu, c'o gajo não topa! (Isto numa outra situação, porque, prosseguindo no mesmo assunto, eu posso dizer que sei de restaurantes onde as pessoas são revistadas à entrada, não vá alguém entrar com telemóvel. Cada vez mais é preciso isso.)

É pois tempo de mudança, o que dá sempre uma imensa trabalheira. E o Sol não tem misericórdia. Logo de manhã, atafulha-se o carro com tudo o que é preciso: bóia, prancha, toalhas, geleira grande, quatro cadeiras de lona. E o caminho para a Costa só se faz em bicha. Pára-arranca, pára-arranca, pára-arranca, pára-arranca… Viva! Viva o pára-arranca! É tempo dele!

E chegámos. Mudámos, a bem dizer. Agora só falta encontrar um lugar para estacionar. Mudar e estacionar. (Deve assinalar-se que neste país não é preciso saber latim para ensinar português. São poucos os que acham isso estranho, menos os que se importam com isso. Donde, deve estar bem assim.)