Sainkho Namchylak encantou os presentes no III Ethnicu

Os concertos marcaram as duas últimas noites do III Festival Internacional de Música Étnica da Beira Interior (ETHNICU). Os Ódagaita e Comvinha Tradicional, dia 10, foram os primeiros a pisar o palco do renovado Teatro-Cine.
"Somos um grupo de amigos que gostamos muito de música tracional portuguesa e fazemos questão de a manter viva, à nossa maneira", afirma o director musical dos Ódagaita, João Frazão.
O nome do grupo surgiu como alusão à gaita de foles, instrumento que teve fortes raízes no norte de Portugal. Mas enquanto na Galiza se intensificou a utilização da gaita de foles como intrumento étnico e tradicional, em Portugal, tem-se registado um abandono progressivo e cabe aos grupos de música popular e tradicional preservarem a gaita de foles.
Com sede na Nazaré, o grupo musical gravou há três anos o seu primeiro trabalho intitulado Ódagaita composto apenas por covers. Para este ano está previsto o lançamento de um novo trabalho.
Os Ódagaita combinam instrumentos como o sintetizador e a guitarra eléctrica com a gaita de foles, o cavaquinho e o bandolim. " É isto que dá alma a este tipo de música", sublinha João Frazão. Pela primeira a actuar na Covilhã, o grupo animou pela sua boa disposição. Do repertório faziam parte músicas de Fausto, Zeca Afonso e Júlio Pereira. Quanto ao pouco público presente, os Ódagaita sabem que o "mal é geral", sublinha o director musical.
A animação do resto da noite coube aos Comvinha Tradicional, do Porto. "O nome surgiu ao telefone e associa-se ao vinho, à parra da uva" explica Miguel Oliveira, um elemento do grupo. Ainda que façam questão em dizer que a música que tocam é de raíz tradicional portuguesa, não abdicam de alguns temas galegos e irlandeses.
Apesar de não terem nenhum trabalho editado, isso não parece preocupá-los. "Queremos fazer muitos espectáculos e só depois partir para o estúdio", esclarece Miguel Oliveira.
Confrontados com uma adesão muito aquém das expectativas, o grupo musical elogiou os presentes: "são muito simpáticos e portaram-se muito bem". No final, os Comvinha Tradicional não quiseram deixar de fazer uma chamada de atenção para a inexistência de um circuito de música tradicional, tal com já existe para o jazz, música ligeira e clássica.

Da Sibéria a Monsanto

A siberiana da região da Tuva, Sainkho Namchylak, e as Adufeiras de Monsanto encerraram mais uma edição do ETHNICU.
Detentora de uma extraordinária capacidade vocal, usando dois tons fundamentais e respectivos harmónicos nas cordas vocais, Sainkho Namchylak, pela primeira vez em Portugal, cantou e encantou.
Saltando da Tuva para Monsanto, na Beira Baixa, as despedidas foram ditadas pelas Adufeiras de Monsanto. O colectivo feminino esteve, uma vez mais, na Covilhã.
O adufe é o único instrumento de suporte ao canto tradicional das Adufeiras de Monsanto. É também nesta vila da Beira Baixa que a arte de tocar adufe, pelas mulheres do povo, se distingue pela sua graciosa beleza rítmica. Oriundas do Rancho Folclórico de Monsanto, as Adufeiras têm recolhido bastantes sucessos em inúmeras actuações de norte a sul do país e no estrangeiro.
O espectáculo ficou marcado pela recriação de várias manifestações tradicionais do povo da "aldeia mais portuguesa" de Portugal. Continuando envolvidas no projecto "Espectáculo do Adufe", as Adufeiras de Monsanto primaram pela simpatia e ficaram surpreendidas com a assistência, ainda que pouca, mas marcadamente jovem. "A aceitação é realmente maravilhosa. Há muitos jovens que gostam da nossa música e isso surpreende-nos muito", referiu o elemento do grupo, Amélia Fonseca.




  Etnias na Beira Interior

A programação do ETHNICU, ofereceu ainda oportunidades para se trocarem algumas ideias. Foi isso mesmo que aconteceu na conferência As etnias na Beira Interior, realizada no dia 10, quinta-feira. O anfiteatro da sede da AAUBI foi o palco para uma conversa entre oradores e assistência, uma vez mais marcada pela fraca participação. O direito à multidiferença, o relativismo cultural foram alguns dos assuntos discutidos nesta conferência
Henrique Dias, professor envolvido no projecto da Coordenação Concelhia do Ensino Recorrente, no Fundão, foi um dos convidados. Faz alfabetização de adultos e a sua turma é bastante heterogénea, incluindo-se nela alunos de etnia cigana, africanos e chineses. "Querem uma aprendizagem rápida de maneira a conseguirem fazer-se entender na sua actividade",refere Henrique Dias..
Também Fernando Palouro Neves, do Jornal do Fundão e Antonieta Garcia, docente do curso de Língua e Culturas Portuguesas na UBI estiveram presentes e contribuíram com as suas ideias e opiniões. Para Antonieta Garcia, é importante saber que "todos temos responsabilidades étnicas". Já para o jornalista do Jornal do Fundão, Fernando Paulouro Neves, o essencial é percebermos que no mundo em que vivemos, há "uma enorme diversidade e biodiversidade. E há que fazer o elogio da diferença", apela o jornalista.



  Workshops, exposições e cinema

O Festival ficou, ainda, marcado por outras iniciativas, nomeadamente workshops e exposições.
O workshop de danças europeias, dia 8 de Maio, juntou algumas pessoas que dançaram ao som de músicas galegas, irlandesas, gaulesas e portuguesas. O ensino das danças ficou a cargo da professora Mercedes Prieto, da Escola Pédexumbo, de Évora. Para esta professora, a iniciativa é uma forma de preservar as tradições das danças e cantares próprios de cada país. Do reportório apresentado por Mercedes Prieto, os participantes tiveram a oportunidade de dançar o Scotisch, da Irlanda, Ball del Rogle, da Catalunha, Hunter-dro, da Bretanha (França), entre outras. Quanto à participação das pessoas, ainda que poucas, a professora destaca a "forma extraordinária" como se empenharam. O motivo para tal falta de adesão, passou, na opinião de Mercedes Prieto, "pelo desconhecimento do que são as danças europeias".
Já o workshop de gaita de foles foi cancelado por "motivos pessoais" do monitor, explica o responsável da Associação Académica da Universidade da Beira Interior, Pedro Fonseca.
As exposições também sofreram algumas alterações. Assim, a exposição Monsanto, de Carla Paiva, foi concelada. Presenças, de Michel Giacometti, vai ser apresentada ao público hoje, dia 14, no pólo IV da UBI em vez do previsto dia 7 de Maio. Estará exposta até ao fim do mês.
Pela primeira vez, foram exibidas curtas-metragens em parceria com outras universidades, nomeadamente, a Universidade Del Cine, da Argentina e a Universidade Moderna, de Lisboa. A par desta iniciativa, decorreu, também, a II Mostra de Curtas Metragens Académicas da Beira Interior (1/2 FITA).

"Ethnicu completamente engolido"

Organizado pela Associação Académica da Universidade da Beira Interior (AAUBI), em parceria com a Câmara Municipal da Covilhã, "o Ethnicu é um festival que já se impôs no panorama cultural da cidade", sublinha Pedro Fonseca, da AAUBI.
No entanto, o responsável da Associação Académica lamenta a pouca adesão do público e aponta a Semana Académica, realizada pouco antes, como um dos principais entraves à participação das pessoas. " O Ethnicu foi completamente engolido, mas as pessoas que participaram divertiram-se", sublinha.
Ainda que reconheça que o cartaz não era dos melhores para cativar o público, Pedro Fonseca acredita que "pouco a pouco as mentalidades vão mudando" e que "a Covilhã deve deixar de se ver como uma cidade do interior, a nível cultural". "O timing pode não ter sido o melhor, mas foi o possivel", finaliza.
Para os apreciadores da música e tradições étnicas resta esperar pela próxima edição do ETHNICU.