José Geraldes

O bispo


"Ninguém faça, sem autorização do bispo, nada do que diz respeito à Igreja". Quem escreveu esta afirmação foi Santo Inácio de Antioquia, no séc. II.
Então o bispo é assim tão importante na Igreja Católica? E porque nada se pode fazer sem a sua autorização? Temos de o comparar a um governador civil?
Diga-se, desde já, que a comparação com um governador civil não faz sentido. Com efeito, o bispo faz parte da sucessão apostólica ou seja é um sucessor do apóstolo de Cristo. A expressão sucessão apostólica é um termo técnico que a teologia católica usa para dizer que o bispo é realmente sucessor dos doze apóstolos.
Apóstolo significa enviado. Depois do Pentecostes, os apóstolos tomaram a seu cargo a evangelização do mundo, sempre unidos, sob a autoridade de S. Pedro, dentro do que se chama o colégio apostólico. Segundo a teologia católica, os bispos formam, em comunhão com o Papa, o colégio episcopal, sucessor do colégio apostólico.
Esta sucessão foi assegurada de forma permanente ao longo dos séculos. Na Igreja primitiva, os apóstolos nomeavam responsáveis das comunidades cristãs chamados presbíteros (em grego, o mais velho) ou epíscopo (em grego, protector, vigilante). Com o tempo, ficou só o título de bispo para designar o responsável da Igreja local.
Com o objectivo de assegurar a continuidade da missão confiada aos apóstolos por Cristo, o bispo ordenava também novos bispos, escolhidos entre os padres. Pela história, sabemos também que o bispo não se posicionou somente como responsável da diocese, mas esteve sempre associado à corresponsabilidade da Igreja Universal. Esta corresponsabilidade foi aprofundada pelo Concílio Vaticano II. Ao longo dos séculos bispos da mesma região ou de um país ou de toda a Igreja se reuniram em concílios para deliberar sobre questões comuns à Igreja. Actualmente os concílios ecuménicos, os sínodos dos bispos e as conferências episcopais continuam a mesma tarefa.
A ordenação episcopal confere ao bispo a plenitude do sacramento da Ordem. Por este sacramento, são-lhe confiados o poder de ensinar (anunciar a Palavra de Deus ou como antigamente se dizia a doutrina, de Santificar pelos sacramentos e sobretudo pela Missa) e de governar (encargo pastoral) em nome de Cristo "a porção do Povo de Deus sob sua responsabilidade". É nestes termos que o Vaticano II define a missão do bispo.
Claro que esta missão não pode ser cumprida sem a ajuda dos padres da diocese que formam com o bispo um colégio: o presbitério diocesano. Além disso, conforme sublinha ainda o Vaticano II, as relações entre o bispo e os padres não são puramente da natureza de superior para subordinado. Bispo e padres participam do mesmo sacerdócio. Daí o bispo assegurar uma comunhão com os seus padres e não somente dirigi-los. A grande tradição do bispo não se assemelha à de um bispo-governador civil mas, conforme diz S. Cipriano, bispo de Cartago, no séc. III: "Tenho como norma nada decidir sem o vosso conselho de padres". Por isso, existe o Conselho Presbiteral que o bispo consulta para tomada de decisões para a diocese.
Os diáconos (em grego, servidor) recebem também do bispo uma missão. E aos leigos o bispo pode confiar mandatos concretos nas tarefas da evangelização.
Por vezes, questiona-se o facto de os bispos tomarem decisões que a opinião pública tem dificuldades em compreender. O Cardeal Carlo Maria Martini, arcebispo de Milão, escreve a este propósito:
"Quando me acontece ouvir juízos sobre irmãos no episcopado, sobre a sua maneira de governar a diocese, penso sempre que até mesmo os melhores juízos não conseguem tocar o verdadeiro pulso da acção pastoral, de quanto um Bispo fez ou não fez, porque se trata de juízos exteriores, recolhas de opiniões e de opiniões humanas, ao passo que as razões últimas de certas decisões, as graves motivações que estão por detrás de certas tomadas de posição, passam-se no segredo perante Deus. No segredo da consciência, no segredo de uma escolha evangélica que quer ser fiel a Cristo e não tem, no fim de contas, que justificar-se perante os homens".
Porquê falar da missão do bispo, aqui e agora? D. António dos Santos, bispo da nossa diocese, celebra os seus 25 anos de ordenação episcopal. É uma data a que todos nos associamos. Por um acto de justiça e de fé. E de partilha na corresponsabilidade da evangelização.