José Geraldes
José Geraldes

 

 

 

 


LIBERDADE RELIGIOSA: UMA GUERRA DESNECESSÁRIA E INÚTIL

A questão da discussão sobre a lei da liberdade religiosa está a dividir os portugueses de forma despropositada e inútil. Não que a lei não fosse necessária de forma a contemplar as confissões religiosas representativas, em Portugal, além da Igreja Católica maioritária. A este propósito, a própria Conferência Episcopal está de acordo.
D. José Policarpo, Cardeal-Patriarca de Lisboa e Presidente da Conferência, na homilia de Páscoa, considera-a "urgente" por "preencher o vazio jurídico-legal das outras confissões".
O Partido Socialista ao apresentar o projecto-lei, da autoria de Vera Jardim, aprovado, na Assembleia da República, a 6 de Abril de 2000, estabelecia claramente que, no artigo 58 as disposições se aplicavam a todas confissões com excepção da Igreja Católica. A razão prendia-se com o facto da respectiva regulamentação pela Concordata. E é preciso desde já sublinhar que a Concordata é um tratado internacional que só pode ser negociado entre a Santa Sé e o Estado Português.
A chamada "ala jacobina" dos deputados do PS assim não entendeu e toca de mexer naquilo que não era da sua competência. Daí o esclarecimento de D. José Policarpo: "O Parlamento não é sede de uma possível revisão concordatária, porque os interlocutores são a Santa Sé e o Estado Português e porque é diferente a natureza intrínseca dos diplomas, prevalecendo a Concordata sobre as leis do Parlamento nacional".
O líder da bancada socialista veio logo a terreno dizer que não faz sentido nenhum abrir uma querela com a Igreja Católica. É errado, inoportuno e ineficaz". E acrescenta que a laicidade do Estado está assegurada na versão original da lei.
Se a não confessionalidade do Estado se encontra garantida, que faz correr os deputados ditos da "ala jacobina" do PS nesta matéria? Aliás é de estranhar que o jacobinismo ressurja das cinzas a que se tinha reduzido.
A objecção é recorrente: e os privilégios da Igreja Católica! Quais privilégios? Um Igreja roubada e espoliada na I República de todos os seus bens e escolas, ainda tem privilégios? Se o Estado tivesse de pagar, o que nunca fez, os roubos, as dívidas ascendiam a somas astronómicas. E depois foi o que se viu. A fúria jacobina anti-clerical da I República teve efeitos catastróficos na sociedade portuguesa. E não havia necessidade disso. A separação da Igreja e do Estado até foi um bem.
Mas, por amor de Deus, os "jacobinos" não pretendem remeter a Igreja para a sacristia ou retirar-lhe acção na sociedade. Se se fizesse um inventário da presença social da Igreja na sociedade portuguesa, nos domínios da saúde, ensino, assistência à juventude, aos idosos, aos toxicodependentes, doentes terminais, à reinserção social - coisas que o Estado devia fazer pela sua função - O haver pende para as instituições da Igreja.
Porquê, então, ressuscitar uma guerra religiosa? E nem se argumente com o "prolectorado" do Vaticano como fez Vital Moreira (Público, 17 de Abril de 2001). Aliás os militares já se manifestaram com a manutenção dos capelães nos quartéis, 60 ao todo. O n.º 3 do artigo 1 do Decreto-lei n.º 93/91 de 26 de Fevereiro já resolveu a questão: "O Serviço da Assistência Religiosa poderá ser extensivo, através de ministros próprios e em condições a estabelecer, aos militares fiéis de outras confissões religiosas que não a Católica". Nos hospitais, a saúde dos capelães é uma machadada contra a humanização destes estabelecimentos de saúde. E quem já passou por problemas de saúde nos hospitais sabe o que isso significa.
A conduta de Mário Soares, a seguir ao 25 de Abril, foi exemplar ao afirmar com toda a clareza que não se deviam repetir na II República, os erros da I República. Pelos vistos, certos deputados têm a memória curta. E nem sequer tomam consciência da gravidade que representa tocar no foro íntimo das pessoas. E até esqueceram a dimensão religiosa que mesmo os que se dizem ateus ou agnósticos, possuem, sem o exprimirem exteriormente.
E depois: legisla-se a favor dos eleitores ou contra os eleitores? O povo português declara ser 90 por cento católico. E toda a população é de matriz baseada nos valores do catolicismo.
Os senhores deputados não têm outras prioridades a bem do povo português? Ou trata-se de uma forma de diversão para esconder aquilo de que não foram capazes de fazer exactamente a bem do povo que os elegeu?

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