"Na manhã
do dia 25 de Abril de 1974, quando cheguei ao trabalho, ouvi
os meus colegas dizerem, muito agitados, que tinha havido uma
revolução em Lisboa e que o governo de Marcelo
Caetano tinha caído. Eu não sabia o que era uma
revolução, mas relacionei logo com o fim da repressão
e da polícia política", recorda Maria José
Tomás, na altura secretária de Craveiro de Sousa,
presidente da Câmara Municipal da Covilhã.
Às 11 horas ouviu-se uma algazarra nas escadas e um grupo
de pessoas entrou no gabinete do presidente. "Lembro-me
do Raposo de Moura e do Jerónimo dos Santos a gritar:
"Isto agora acabou. Vamos para a varanda. Vamos abrir as
portas da Câmara". Enquanto isto, cá fora,
no largo do Pelourinho, a multidão crescia à medida
que a manhã avançava.
O Montiel
era o quartel general
A notícia
do fim do regime de Marcelo Caetano ia-se espalhando. José
Lemos, técnico de contas, era o presidente do Sindicato
dos Lanifícios. Quando, de manhã cedo, soube o
que se estava a passar em Lisboa não foi trabalhar. Telefonou
aos amigos e juntaram-se no sítio do costume: o café
Montiel que funcionou como quartel general. Apesar de terem passado
muitos anos, José Lemos tem bem viva a memória
dos acontecimentos desse dia. "A partir do meio dia, e até
à meia noite, distribuímos oito comunicados à
população, quase de hora a hora. Escrevíamos
no Montiel e íamos imprimi-los no Sindicato dos Lanifícios.
Pedíamos aos trabalhadores dos lanifícios e à
população que se juntassem em frente ao edifício
da Câmara". José Manteigueiro, um dos mais
antigos fotógrafos da Covilhã, recorda que "às
9 horas da manhã já se via gente nas ruas. As fábricas
fecharam, as escolas também. Sentia-se um ambiente de
alegria. Parecia uma festa". Da parte da tarde estavam milhares
de pessoas no largo do Pelourinho.
Durante essa noite um grupo de pessoas, conhecidos opositores
do regime de Marcelo Caetano, reuniu-se para nomear uma comissão
administrativa para a Câmara Municipal.
Três
noites sem dormir
Também
Gregório Arroz viveu intensamente os acontecimentos do
dia 25 de Abril de 1974. Operário tecelão, fazia
parte do Sindicato dos Lanifícios e era perseguido pela
Polícia Internacional de Defesa do Estado (PIDE). Três
dias antes de se dar a Revolução, Gregório
Arroz estava na fábrica a trabalhar no tear quando foi
levado pela PIDE para ser interrogado. Valeu-lhe o sangue frio
para não se contradizer nas respostas às muitas
perguntas que lhe fizeram. Por isso, para este operário
"a melhor dádiva foi o 25 de Abril. Foi um grito
de liberdade e democracia para os trabalhadores" salienta.
Gregório Arroz soube de manhã, pela rádio,
que estava a acontecer um levantamento militar em Lisboa. "Vim
para o Pelourinho. Começou-se a juntar gente. Havia alegria
na cara das pessoas. Não conseguíamos acreditar
que a opressão de 48 anos tinha acabado". O Pelourinho
era o local onde as pessoas se juntavam para acompanhar o desenrolar
dos acontecimentos e saber as últimas notícias.
"A emoção foi tanta que nos dias a seguir
nem conseguia dormir com tanta alegria", recorda Gregório
Arroz.
A população dos arredores da Covilhã também
partilhou desta alegria. Francisco Marques trabalhava como adjunto
de chefe de secção duma empresa de lanifícios
do Teixoso, localidade a cinco quilómetros da Covilhã.
"Lembro-me que os operários da FIPER, empresa onde
trabalhava, quando souberam da acção desencadeada
pelo movimento dos capitães, largaram o trabalho. A alegria
era tanta que ninguém cabia na pele". Para este antigo
tecelão, o 25 de Abril de 1974 foi a melhor coisa que
podia ter acontecido depois de 48 anos de ditadura. "Desde
1940, quando tinha 17 anos, que sonhava com a liberdade e ela
chegou naquele dia", salientou Francisco Marques.
"Um
feriado qualquer"
E o que significa
para os jovens de hoje o 25 de Abril? Marta Alves, de 26 anos,
pensa que para a maior parte dos jovens o 25 de Abril não
passa de uma data abstracta. "Na escola, os programas da
disciplina de História dedicam muita atenção
a épocas distantes da nossa vida colectiva como, por exemplo,
os Descobrimentos. O que passou no século XX é
dado a correr quase no final do ano lectivo. Por isso, se perguntarem
a um jovem o que é o 25 de Abril le responde que é
um feriado qualquer", desabafa esta professora de Fotografia
e Audiovisuais. Pedro Ramos, de 24 anos, pensa que os objectivos
do 25 de Abril não se concretizaram. "O programa
do Movimento das Forças Armadas não se cumpriu.
O nosso País não se desenvolveu. A indústria
estagnou. Quase tudo o que comemos é comprado no estrangeiro.
Vivemos num estado de dependência económica que
nos conduz à dependência política. Na minha
opinião, o nosso País precisa de outro 25 de Abril",
declarou este estudante de Gestão da Universidade da Beira
Interior.
[ler
artigo sobre comemorações na cidade da Covilhã,
alterações ao programa] |