O Salão
Nobre dos Paços do concelho da Covilhã foi, na
passada sexta-feira, 20 de Abril, o palco escolhido para a conferência
"Ciência e Comunicação" integrada
no ciclo "Século XXI - Perspectivas", uma organização
da Câmara Municipal. O convidado, Fernando Carvalho Rodrigues,
o 'pai' do satélite português PO-SAT 1 e um dos
primeiros doutores honoris causa da Universidade da Beira Interior,
falou da importância de comunicar a ciência e de
homens partilharem esse conhecimento. As crescentes exigências
sociais e profissionais têm conduzido o Homem no sentido
de uma sociedade em que a comunicação se processa
cada vez mais à distância. Um telefonema, um fax,
ou um e-mail tornaram-se frequentes enquanto formas de comunicação
com os outros. Carvalho Rodrigues, professor e investigador,
salienta a sua preocupação com a perda da importância
do tempo: "Hoje em dia encontramo-nos no circuito das telecomunicações
sem nos tocar".
Segundo Carvalho Rodrigues, o Homem conquistou algo da natureza
através da ciência. No entanto, esta conquista implicou
"a perda da simetria", da harmonia entre os homens:
"Fomos encarando a possibilidade de nos auto-destruirmos
apesar de sermos os únicos que conhecemos o Bem",
alerta o cientista.
Carvalho Rodrigues realça que "é um erro acreditar
que os humanos mudem por causa da tecnologia". Deste modo
torna-se necessário adaptar a ciência aos homens,
fazer com que seja partilhada, comunicada, entendida. Usar um
telefone é fácil porque basta carregar no botão.
Também a tecnologia do multibanco se encontra adaptada
aos seres humanos. Por exemplo, para nos certificarmos do dinheiro
que temos recorremos frequentemente ao talão do multibanco:
"Nos últimos 10 anos, todos passámos a acreditar
que é possível sermos pagos em electrões",
comenta.
O mundo, visto pela profundidade do olhar deste pensador, tem
um céu que reside sobretudo na América do Norte
e na Europa. O primeiro dom que Deus nos oferece é a vida,
sendo a tecnologia o segundo. Deste modo, todos somos capazes
de aprender ciência e tecnologia. Se pudéssemos
observar o planeta Terra do espaço, concluiríamos
que as fontes de comunicação e a energia iluminam
estas zonas do planeta. No entanto, a falta de harmonia é
bem patente. "Fome, peste e guerra, são os três
Cavaleiros do Apocalipse que se situam em zonas onde não
estão as fontes de comunicação e o consumo
de energia", lamenta Carvalho Rodrigues.
"As
sete idades do Homem"
A idade da
humanidade, o tempo que por nós passa, as memórias
dos nossos avós são fundamentais. Carvalho Rodrigues
expôs uma filosofia que revela o que se faz do tempo, as
vivências que ele nos oferece e a sabedoria que existe
para além da ciência. Tudo o que fazemos é,
segundo o orador, "o produto de nos alimentarmos do tempo".
Deste modo, em 10 anos educamo-nos, podemos começar uma
família. Em política uma década é
o limite da previsibilidade. Em 100 anos, alimentamo-nos das
memórias dos nossos avós, das histórias
e saberes que nos transmitem. Num milénio, pode-se construir
uma língua, uma cultura, uma moeda.
Há 100 mil anos atrás, as ideias do Homem eram
plásticas, a sua comunicação passava pela
criação de pinturas rupestres. Há um milhão
de anos os seres humanos começaram a ter consciência
da morte, a venerar os antepassados, a descobrir que tínhamos
avós. "Há um milhão de anos inventámos
o futuro, quando descobrimos que tínhamos avós",
esclarece Carvalho Rodrigues. "Daqui a 10 mil anos o Homem
estará espalhado por galáxias", prevê
o cientista.
Assim se compreende o fio condutor do pensamento deste investigador:
a necessidade de nos alimentarmos do tempo, do saber dos nossos
avós, que foi transportado de geração em
geração. "Quem não se alimentar do
tempo e quiser fazer engenharia com os seres humanos, cometerá
enormes erros se não souber integrar todo o conhecimento
da humanidade", alerta o professor.
A ciência só se justifica quando é partilhada,
comunicada. Só é objecto de ciência aquilo
que é possível que todos sejam capazes de comprovar.
Foi deste modo simples, e com algum humor, que Carvalho Rodrigues
comunicou o seu saber científico, enriquecendo os que
viveram o tempo desta palestra e a aplaudiram de pé. |