HOMERO E BRILHANTINA
Ethan e Joel Coen
E Ulisses chegou a Ítaca.
Ítaca, Mississipi. Ulisses Everett McGill chega a Ítaca,
Mississipi, fugindo da prisão e da perseguição
implacável do misterioso Cooley, diabo de óculos
escuros e cão de guarda. Com ele, Delmar e Pete, o duo
desastrado com quem Ulisses, o "falinhas mansas", fugiu
da quinta onde cumpriam a sua pena com trabalhos forçados.
Ítaca, Mississipi, após uma viagem cheia de perigos,
surpresas e estranhos personagens, mergulhados em pó,
sépia e sol. Ulisses chega a Ítaca e Homero volta-se
no túmulo. Ulisses chega a Ítaca e encontra o tesouro.
"O Brother Where Art Thou?" é o melhor filme
dos Coen. O humor refinado que os caracteriza, a sensibilidade
estética e estilística, o rigor dos seus puzzles
perfeitos, atingem nota máxima nesta adaptação
da "Odisseia" de Homero. Uma adaptação
livre, claro está, que coloca o destemido Ulisses na pele
de um Clooney em quem o bigodinho Clark
Gable e a brilhantina Dapper Dan se conjugam perfeitamente com
a língua de prata que os Coen lhe emprestaram.
Ítaca, Mississipi, tostada de sol e poeira na altura da
depressão americana. Na altura do Mississipi racista.
Do racismo feroz. Pano de fundo: eleições. E tudo
- fuga, eleições, racismo, armadilhas e sucessos
- tudo impregnado de música. Música que é,
ela mesma, um filme. Brilhante banda sonora que, sem transformar
o filme num musical, nos deixa na deliciosa incerteza de descobrir
quem gera o quê. História gera música? Música
gera história? Coen geram obra-prima.
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