António Fidalgo

 

 

 

 


Tragédia e revolta

A morte de cerca de 70 pessoas provocada pela queda da ponte sobre o Douro em Castelo de Paiva no Domingo à noite abate-se tragicamente sobre um Portugal zonzo. Como foi possível? Sim, sabemos que o inverno vai rigoroso, as chuvas são mais que muitas, e que as tragédias espreitam a qualquer momento e em qualquer local. Mas mais do que o sentimento de impotência face às forças da natureza, que é o que acontece nas tragédias inevitáveis, tremores de terra e erupções vulcânicas, o que sentimos neste momento é revolta. É que a tragédia poderia ter sido evitada. Não faltaram avisos de que a velha ponte já não se encontrava em condições de segurança, já tinha havido promessas de uma nova ponte. As pessoas morreram por negligência e omissão humanas.
Importa agora não ficarmos pelas consequências imediatas, pela demissão do Ministro Jorge Coelho e por outras demissões. É que a tragédia revela no fundo um Portugal de desleixo, de que todos somos responsáveis. Em Portugal sacode-se com facilidade a água do capote. Isto está mal, aquilo está mal? Que tenho eu a ver com isso? Ninguém se sente responsabilizado por aquilo que é de todos. O Portugal que acorda em choque com estas tragédias é o mesmo que tolera serviços de saúde a funcionarem mal, escolas onde pouco se aprende, uma justiça ineficaz, impostos a alimentarem a sede insaciável da despesa pública. A culpa não é só dos governantes, é de todos. Porque é muito mais fácil acomodar-se do que protestar, pedir do que exigir, olhar para o lado do que enfrentar. Cada um por si, a safar a sua pele, e ninguém por aquilo que é de todos.
Os portugueses devem acordar com a tragédia, devem meter as duas mãos pela consciência dentro, e sentir-se responsáveis. E a responsabilidade começa desde logo no local de trabalho de cada um. Há que não pactuar com a negligência e a omissão, em suma, com a mediocridade.

Clique aqui para regressar à primeira página