José Geraldes
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Paz e solidariedade
"Tudo se perde onde se
perde a paz e primeiro que tudo a liberdade". O verso é
de Jorge de Sena, poeta português de renome. Procurar e
salvaguardar a paz em todas as circunstâncias, eis uma
tarefa sempre actual dos responsáveis políticos
e de cada homem, crente ou não crente, na sua esfera de
acção.
Foi com este objectivo que Paulo VI instituiu, em 1967, no Séc.
XX, o Dia Mundial da Paz. A divulgação de uma mensagem
a 1 de Janeiro de cada ano, para assinalar a celebração
do Dia Mundial, tornou-se um acontecimento que é sempre
notícia.
A mensagem João Paulo II para o séc. XXI intitula-se
Diálogo entre as Culturas para uma Civilização
do Amor e da Paz. Trata-se de um texto de grande densidade e
que aborda a identidade cultural na construção
da paz. O diálogo entre as culturas é o fio condutor
desta mensagem. Diálogo que João Paulo II diz ser
urgente "propor novamente a um mundo atribulado por demasiados
conflitos e violências, por vezes desanimado e incapaz
de perscrutar os horizontes da esperança e da paz".
Paulo VI havia escrito uma encíclica sobre o diálogo
em 1964.
Mas para haver diálogo, é preciso haver uma base
comum. No caso concreto da cultura, há valores que são
património da Humanidade. A partir destes valores, pode
construir-se um diálogo prometedor.
João Paulo II aponta uma série de valores de que
se deve tomar consciência para a instauração
deste diálogo.
O primeiro destes valores chama-se solidariedade. Ninguém,
nos tempos actuais, consegue realizar uma obra sozinho. Nem tal
é desejável. Já Thomas Mann escrevia que
"nenhum homem é uma ilha". Com o fenómeno
da globalização, todas as sociedades estão
dependentes umas das outras. E não se lê na Bíblia
"ai do só"? A solidariedade está também
ligada à justiça. Qualquer homem tem direito ao
mínimo necessário para uma vida digna. E todos
temos o dever de ajudar e partilhar pelos que precisam.
A solidariedade leva à paz. "Promover a causa da
paz e da compreensão entre os homens" é um
dever de todos. E João Paulo II pergunta: "Que dizer
do risco permanente de conflitos entre nações,
de guerras civis dentro de vários estados e de uma violência
tão generalizada que as organizações internacionais
e os governos nacionais se mostram quase impotentes para debelar"?
Outro valor fundamental para o diálogo passa "por
uma viva sensibilidade pelo valor da vida". O Papa usa uma
fórmula feliz: "Não se pode invocar a paz
e desprezar a vida". E a vida é desprezada nos "homicídios,
formas de injusta coacção, suicídios, abortos,
torturas físicas e psicológicas, recurso desnecessário
à pena de morte, deputações, escravatura,
prostituição, comércio de mulheres e crianças".
A educação é outro elemento a ter em conta.
Educação que leva a olhar as experiências
de outras culturas, sem preconceitos. E a valorizá-las
na diversidade das suas componentes religiosas.
Depois há o perdão e a reconciliação.
Paul Ricoeur é bem explícito: "Só o
perdão cura a memória e lhe oferece o futuro".
João Paulo II anota que "em nome de um realismo desencantado,
muitos consideram esta estrada utópica e ingénua".
Mas não há outro caminho, na perspectiva cristã,
para alcançar a paz.
Basta que, para alcançar este objectivo, haja vontade
sincera em cada homem.
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