Apesar de não haver perigo
Escolas eliminam carne de vaca

As escolas da Covilhã suspenderam as refeições com carne de vaca. A procura nos talhos e restaurantes desceu para metade. Do outro lado da barricada, produtores insistem na qualidade dos bovinos.

 Por Rodolfo Silva
NC/Urbi et Orbi

Nos talhos, à medida que diminui a procura de carne de vaca, aumenta a de outras variedades

O conhecido ditado popular "mais vale prevenir do que remediar" está a guiar os habituais consumidores de carne de vaca na Covilhã. Numa altura em que aparecem, um pouco por toda a Europa com Portugal incluído, novos casos de animais infectados, a BSE volta a ser uma preocupação pública. Na Covilhã o decréscimo da procura tem acompanhado o estrangeiro e, num restaurante contactado pelo NC, o consumo de pratos preparados à base de carne bovina desceu para metade. Apesar dos alertas, os produtores pecuários continuam a afirmar que a carne bovina portuguesa é de qualidade e não apresenta riscos. O facto é que, só no último ano, foram identificados 100 casos de animais com BSE, números que não se confirmam na região. Segundo números dos produtores, nos últimos quatro anos apareceram, apenas, três casos confirmados, o último dos quais já remonta a 1998.
O ano de 1990 marca o início do aparecimento do primeiro caso em Portugal. Sete anos mais tarde, em 1997, fruto da suspeita de que uma nova variante da Creutzfeldt-Jacob (DCJ) estaria ligada à BSE, o nosso país proíbe a venda de miolos, vísceras e medúla de vaca. No entanto, não está provada a ligação entre as duas doenças, uma vez que nenhum dos testes laboratoriais realizados até hoje mostrou uma relação evidente. A única certeza é que a DCJ tem características semelhantes à BSE, tanto ao nível da proteína identificada com a doença, como nos sintomas: perturbações sensitivas, descoordenação motora e demência. A nova variante, ao contrário da forma clássica que atinge maioritariamente idosos, inicia-se antes dos 40 e em muitos casos por volta dos 20. Em todo o mundo já foram diagnosticados 80 casos, mas nenhum em Portugal. Recentemente, suspeitou-se que uma doente da Sertã tivesse contraído a doença, mas a hipótese não foi confirmada.

Procura diminuiu 50 por cento

O facto é que as notícias vindas a público, nos últimos meses, tem provocado diminuições significativas na procura, quer nos restaurantes quer nos talhos. Paulo Tomás, é funcionário do "Só peixe e carne". Atrás do balcão do talho, revela ser "notória a preocupação das pessoas". Um dos reflexos da situação são as perguntas, agora mais insistentes, acerca da proveniência dos animais vendidos. Contudo, a diminuição das vendas não tem reflexos no lucro do estabelecimento: "Baixaram um pouco mas como aumentou o procura de outros animais, ajuda a contrabalançar. Julgo que quem mais sofre com a situação são os produtores".
Na restauração, o número de pessoas que consome pratos confeccionados com carne de vaca, também, desceu. Rogério Valério é gerente do restaurante "Montalto" e estima uma perda de "50 por cento". "Mas há ainda um número de clientes que se preocupam menos e continuam a consumir o bife da casa, ou outras alimentos como o rosbife", acrescenta. Para o gerente do "Montalto", a carne consumida no restaurante "é da máxima confiança. Comprámo-la a armazéns credenciados que a importam do Brasil, onde é submetida a rigorosos testes de qualidade".

Campanha para destruir produção nacional

Opinião diferente tem Bruno Ribeiro, presidente da Associação de Criadores de Gado (SANICOBE). "Todos estão preocupados com os problemas do gado português, mas há casos muito mais graves, como aqueles que são importados da América do Sul, de qualidade muito inferior", acusa. Com conhecimento de causa, Ribeiro continua a desfiar criticas à forma como o caso tem sido abordado: "O número de casos em Portugal é insignificante. Os nossos animais só comem uma sexta parte de rações, se comparados com o gado espanhol e que eleva o tempo de engorda em mais um ano. E temos um sistema de controlo dos mais apertados". Razões suficientes para o representante dos produtores de pecuária assegurar que a "carne produzida na Beira Interior não oferece qualquer risco".
O facto é que as declarações similares produzidas pelas associações dos criadores de animais, não têm servido para acalmar os consumidores. Bruno Ribeiro explica o facto com facilidade: "Há sociedades secretas interessadas em destruir a agricultura empresarial do País e os principais responsáveis são as multinacionais da carne, os EUA, a Espanha e os países do Norte da Europa". Conspiração ou não, o facto é que os rendimentos dos produtores caíram 50 por cento e o presidente da SANICOBE avisa que "casos como este, vão levar à falência os agricultores no final de 2001".
As escolas da Covilhã não estão tão seguras de estarem a salvo do risco da BSE e, mesmo sem qualquer directiva do Ministério da Educação, já suspenderam, como medida de precaução, os pratos de carne de vaca ou outros alimentos seus derivados.

  

Contornar os riscos

Desde que, em 1986, no Reino Unido, se identificou o primeiro caso de BSE, têm sido tomadas medidas de restrição de certos produtos derivados da carne bovina e alertado os consumidores para redobrarem os cuidados com o seu consumo. Alguns tecidos classificados como perigosos, caso da mioleira, espinal medula, amígdalas, olhos e intestino delgado, são proibidos e extraídos aquando do abate do animal. Mas nem por isso o consumidor pode estar seguro da qualidade da carne.
Uma das principais recomendações é que se adquira o costume de ler cuidadosamente o rótulo no acto de compra. É fundamental ter em atenção que não há diferenças visíveis, a olho nu, na carne de vaca infectada e a boa para consumo. Outra das atenções a ter em conta é a local de compra. Deve escolher-se um talho de confiança e exigir informação sobre o gado, como a sua proveniência, de que é alimentado, se são utilizadas hormonas ou produtos geneticamente modificados na engorda dos animais. Consumir derivados de carne bovina como patês, croquetes, hamburgers, rissóis, pasteis e folhados de carne quando não se não conhece o modo de fabrico deve ser evitado.
Uma forma de contornar o risco da BSE é ter uma alimentação variada. A carne deve ser consumida com moderação e na proporção ideal, tal como o prevê a roda dos alimentos. O ideal é constituir uma dieta composta de muitos vegetais, frutos, cereais e leguminosas. Alguns vegetais, como por exemplo a soja, lentilhas, favas e feijão seco, fornecem doses de aminoácidos idênticos aos da carne, constituindo um boa alternativa aos tecidos animais.
A quantidade de carne consumida não assume especial importância no que respeita aos riscos de contrair a doença. Estudos laboratoriais chegaram à conclusão de que as características genéticas de cada um estão directamente implicadas na possibilidade de contrair a doença.
As autoridades sanitárias alertam, ainda, para que os cidadãos denunciem, ao Ministério Público, qualquer caso suspeito.

 

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