José Geraldes
|
"Palavra de Honra"
"Ninguém sabe medir
as consequências da palavra que se diz, escreve ou proclama".
(...) "O culto da palavra servidora da verdade é
o grande desafio não só para os que usam a palavra
na Igreja mas também para os que servem a palavra nos
meios de comunicação". Quem o disse foi o
patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, no domingo passado,
na celebração do Jubileu dos Jornalistas, na Igreja
de Santa Maria de Óbidos.
A palavra escrita ou falada traz consigo uma série de
responsabilidades para todos os que a usam com o objectivo de
comunicar uma mensagem. E há palavras que tanto podem
ser assassinas ou agentes de paz e concórdia. A. Maurois
considera que as dez palavras mais belas são: silêncio,
ordem, beleza, melancolia, encanto, sorriso, terno, frágil,
honesto, cordial. Já Paul Valléry enumera: puro,
dia, oiro, lago, cume, só, onda, folha, nascente, flauta.
As primeiras referem-se mais ao quotidiano, as segundas têm
uma carga mais poética.
No século da imagem, a palavra mantém-se como elemento
fundamental de comunicação. Latino Coelho escreveu:
"De todas as artes, a mais bela, a mais expressiva, a mais
difícil é, sem dúvida, a arte da palavra".
Por isso, quando se cita um hipotético provérbio
chinês - uma imagem vale dez mil palavras - torna-se necessária
repor a verdadeira origem da história.
Afinal o provérbio nasceu de uma frase de um publicitário
americano que o atribuiu a um publicitário japonês,
em ordem a levar os anunciantes a servirem-se da fotografia...
A força da palavra é maior do que se julga no tempo
dos audiovisuais. A própria Internet recuperou, com uma
evidência meridiana, o poder da palavra. Razão tem
Ribakov quando, na boca de um dos seus personagens, põe
a frase: "A palavra é a única coisa que tem
vida eterna".
Como se usa por aí a palavra? Hoje toda a gente quer ter
a palavra. A propósito de tudo ou de nada. Trata-se de
um desejo natural e legítimo. Daí o haver um especial
cuidado para escolher o momento próprio de usar da palavra.
E as palavras. Um ditado moçambicano adverte que "uma
palavra usada vezes demais transforma-se em baba".
E servem as palavras a verdade? Há tanta mentira através
das palavras mais belas! Aliás, a ordem vem de Voltaire
que sabia do que falava: "Menti, menti que algo ficará".
Mas, se a palavra não serve a verdade, transforma-se num
embuste. Que nega o princípio do "dar a minha palavra",
sinal de honra e de honestidade entre os cidadãos.
Quantos actualmente empenham a palavra? Nesta época de
vazio que se criou, a palavra arrisca-se a não ser sinal
de honra. A confirmar o provérbio latino: "as palavras
voam".
Para servir a verdade, impõe-se restituir à palavra
o sentido de empenhamento e de confiança. Antigamente
não se dizia "palavra de honra"? Quem dá
hoje crédito a esta expressão? Muitos negócios
e compromissos se tomaram à base da "palavra de honra".
O desafio da palavra ao serviço da verdade requer o respeito
mais escrupuloso das normas éticas, deontológicas
e profissionais.
Na transmissão da verdade não pode haver meias-verdades.
Então estaremos no reino da desonestidade. O Papa João
XXIII, na sua simplicidade, mas com ar irónico, disse
um dia aos jornalistas da imprensa internacional: "Às
vezes dizei a verdade, se for possível".
Palavra. Palavras. Eugénio de Andrade, em 30 Poemas, resume:
"São como um cristal, as palavras. Algumas, um punhal,
um incêndio. Outras, orvalho apenas".
Para os que da palavra fazem a sua profissão, só
a classificação de "incêndio" deve
ser norma no seu uso. Para que o mundo "arda" no calor
da verdade.
|