Cidade, Universidade,
Banca e Administração, terão os dois razão?
Pedro
Guedes Carvalho
Foi com inestimável prazer
que li no URBI o artigo do "cidadão" António
Soares. Prazer aumentado pelo facto de o conhecer pessoalmente,
com ele privar de há longos anos e de o "rever"
desta terra distante, através deste poderoso meio de comunicação.
O tema da cidade despertou-me a curiosidade e coloca uma questão
deveras importante na vida: a de "quem merece quem?".
Em minha opinião, para que o resultado de uma relação
seja considerado de sucesso, será necessário que
ambas se mereçam, se respeitem e dignifiquem como num
casamento. A. Fidalgo, em anterior artigo sobre a UBI, enfatizou
o papel desta Universidade e "provocou" a cidade; A.
Soares, como parte dessa cidade retorquiu, questionando se a
UBI estaria a fazer tudo que deveria para ser merecida.
Num artigo que escrevi em Fevereiro de 1999 para o jornal "Ideias
& Negócios" , defendia que a cidade era um Ser
Vivo, que se transforma com os tempos e por isso vive; e, tal
como o exercício físico no ser humano pode servir
de municiador de maior longevidade, a transformação
de uma cidade é um meio para a sua centralidade. Mas exercício
e transformação terão de ser bem executados,
sob pena de se morrer de ataque cardíaco no primeiro caso,
ou de se perder competitividade e "desaparecer", no
caso da cidade. E neste ponto, estaremos de acordo, não?
Dizer apenas que a cidade não merece a Universidade que
tem, ou que a Universidade não esteja a fazer tudo o que
poderia é demasiado redutor da realidade. A relação
é construída por pessoas, poderes, instituições;
é verdade que a UBI nasceu muito relacionada com a indústria
têxtil, fez um bom trabalho e os últimos números
dizem que a procura de quadros qualificados têxteis continua
a exceder a oferta sendo que esta é ditada pelo ingresso
de jovens que desejem o curso. Mas simultaneamente a sociedade
portuguesa mudou e a indústria têxtil, se bem que
recuperada em parte, não é tão apelativa
como os cursos com novíssimas tecnologias, os serviços,
os meios de comunicação . O problema é que
entra mais dinheiro na região devido à indústria
têxtil, como dirá o tal responsável político
a que se refere A. Soares; contudo, esse rendimento já
não se reparte pelos cerca de 10.000 trabalhadores que
existiam em 1974, mas apenas por cerca de 3.000 registados no
ano 2000. Acresce que, os trabalhadores desta "velha"
indústria continuam a auferir ordenados de nível
semelhante ao do salário mínimo nacional e, por
outro lado, o Indíce de Poder de Compra por habitante
covilhanense passou de 83 em 1993, para 79 em 1995 e 70 em 1997;
sabendo que a média nacional é de 100, isto quer
dizer que Covilhã não só está abaixo
da média dos concelhos nacionais, mas ainda que perde
progressivamente Poder de Compra. Dito de outra forma, perde
capacidade de atracção e aí, meu caro A.
Soares, as cidades podem não ser eternas e há conhecer
as responsabilidades!
Na Economia Regional fazem-se estudo de impacto interessantes
onde se pode comprovar que por muito investimento público
que se faça numa região deprimida, o dinheiro acaba
por cair num funil cuja parte de baixo está colocada nas
regiões mais ricas. E porquê? Porque são
estas que vão acabar fornecer as "importações"
que as regiões deprimidas irão fazer, uma vez elas
mesmas não têm produtos e serviços próprios
(e por isso são deprimidas). Parece por isso um ciclo
vicioso e sem fim, não é?
Assim acreditam os políticos (e por isso não há
regadio, IP2 e aeródromo que nos valha).
Assim não acreditamos alguns de nós, que fazemos,
cada um à nossa moda, esforços para que assim não
seja. E aqui os dois têm razão, porque escrevem
sobre os assuntos, o que quer dizer que se preocupam e preocupação
é fonte de progresso.
O A. Soares diz, e bem na minha opinião, que é
preciso criar sinergias e apostar não tanto na quantidade
mas sim na qualidade, marca e prestígio. E aqui estou
plenamente de acordo. Esta Universidade não pode ser apenas
mais uma Universidade Portuguesa que quer muitos alunos (para
se poder financiar já se sabe) e vê os seus melhores
licenciados a regressar às terras de origem onde vai ficar
o rendimento que ganhem.
Mas esta cidade não pode também continuar a olhar
para o umbigo, contentando-se com o fogo de vista e as aparências.
É preciso criar riqueza, capacidade de compra, diversificar,
para que dos milhões que se possam vir a investir, uma
parte reverta para os residentes da região. E perdoem-me
a malvadeza, mas não será com salários como
os que se pagam na maioria dos serviços (quase todos não
qualificados) e na têxtil, que se vai aumentar o poder
de compra . No fundo entra mais dinheiro que antigamente, sim
senhora, a distribuir por menos pessoas, sim senhora, então
quem fica com ele?
E aqui vejo o ponto de união: a Universidade deveria assumir
esse papel de revitalizador de sinergias e de estratégia,
utilizando a sua arma específica: o conhecimento.
É para esse lugar da UBI que apontam os resultados preliminares
da investigação que estou a realizar: a maioria
dos agentes da terra, coloca a UBI com um papel de extrema centralidade
na teia de relações da cidade. Aqui pelos States
e em cidades de dimensão semelhante, são os bancos.
Porquê? Porque os directores bancários de cá
são pagos em função de resultados e por
isso fazem várias coisas: encomendam estudos às
Universidades que assim podem testar o que ensinam, desenvolver
nova investigação e cobrir 'buracos' financeiros;emprestam
dinheiro a quem não tem, para que possa ter e dessa forma
criar nova riqueza; impulsionam o aparecimento de novos negócios.
Os "mayors" (equivalentes aos nossos presidentes das
Câmaras, mas melhores em média) apoiam os gestores
bancários e com eles fazem parcerias, porque sabem que
novos negócios criam riqueza e até lhes melhoram
os impostos, pois então.
E por aí, alguém sabe como funciona o crédito?
Sabem que os nossos bancos são privados? Mas não
parecem pois não? Ainda têm que pedir a Lisboa ou
Porto para aprovar 'spreads' para 5.000 contos!
E as Câmaras? São elas que autorizam as obras não
é? Pois então continuem a deixar fazer o que estão
a deixar (um amontoado de betão sem um único espaço
verde que se preze) e depois, meu caro Soares, lá se vai
a eternidade de algumas cidades a que alude. Por agora parece
bem, o povo aplaude e ri porque vê obras a andar. Daqui
a uns tempos, quando a febre dos gastos essenciais passar (espero),
que tipo de trabalhadores queremos atrair para viver em prédios
amontoados em volta dos hipermercados? Assim as pessoas fogem
e a Covilhã fica a depender apenas das pedras antigas
amontoadas em novos edifícios (a UBI), belos pois não,
mas ainda com muita carência de estratégia participada.
Por favor continuem, mas não entrem na defesa das posições
tomadas, porque essas estão claras e a cidade falou. Cidade
essa que para o estrangeiro continue a vender "o real pano",
mas aposte nos outros bens que tem e tanta falta vão fazer
no futuro: ar, água, paisagem, tranquilidade e localização
na Península Ibérica! Utilizando este poderoso
meio de comunicação, pois então. |