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Opinião      


 


Luís Nogueira

Cinema doméstico

Não é fácil viver no Interior sem sentir, aqui e acolá, um perturbante atrofiamento. O que fazer, o que ver, onde ir, como escapar ao correr sempre igual dos dias? Que armas usar contra a letargia? Como interromper o fio às vezes monótono dos dias? Há sempre um livro para ler, a televisão por cabo ou a internet, um disco com que preencher um bom pedaço de tempo, um concerto ocasional, uma exposição. E claro, os bares, os cafés ou a discoteca. Com estas opções todas é fácil perceber que o tão usado "não há nada para fazer" por vezes é mais uma justificação para a inércia do que uma deficiência real. Mas faltam coisas, claro.
Para aqueles que gostam de cinema, o panorama não era nada motivador. A programação das duas salas do circuito comercial deixam inevitavelmente a desejar. Um bom filme chega quando chega, e na maior parte das vezes não chega. Há filmes então que era preferível que nunca chegassem. Por tudo isto é obrigatório saudar o reinicio da actividade de exibição do Cine Clube da Beira Interior. E não apenas pela diversidade que necessariamente representa em termos de oferta, que é naturalmente um serviço valorizado por todos os cinéfilos (e não se entenda este termo como elitista, como tantas vezes acontece, mas apenas como um meio de denominar aquelas pessoas para quem o cinema não é um troféu ou uma obsessão, mas tão simplesmente um gosto), mas também pela dinâmica e a atmosfera das próprias sessões.
A sala é pequena sem ser acanhada, a sua disposição é bastante singular, por vezes uma corrente de ar arrepia, aqueles que chegam tarde vêm as suas sombras na tela, há uma ou outra falha na projecção. Não são imperfeições de monta, são até curiosas, têm a sua piada, dão um ar doméstico ao acontecimento, não ensombram em nada o trabalho dos cineclubistas que diariamente trabalham para nos oferecer melhor cinema, mais cinema, outras visões. São até um modo de comunhão, criam uma empatia entre quem exibe e quem assiste, um sentimento de familiaridade. Une as pessoas no propósito que as levou ali, sublinha o gosto de quem ali está em lá estar, percebe-se melhor porque lá foram. Não mais que uma vontade de ver mais, disfrutar mais, se possível aprender e reflectir. E isso nenhuma corrente de ar, nenhum ruído, nenhuma desfocagem faz esmorecer. Em boa hora o CCBI voltou ao trabalho. Espera-se agora a correspondente e desejável resposta do público.

 

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