CONVERSA
por
Edmundo
Cordeiro
As conversas são uma forma,
têm imperativos formais: conveniências, conteúdos,
tempos, velocidades. Têm um começo e um fim.
Mas por que é que se começa
uma conversa? Supor, como um idiota, uma conversa pela conversa?
E porquê pôr fim a uma conversa? Responder a esta
pergunta é supor o mesmo. (São muitas, evidentemente,
as razões para começar e pôr um fim. Mas
não é disso que se trata.) Tal como não
há conversa pela conversa, também não se
começa uma conversa e também não se acaba
uma conversa, não se começa uma conversa quando
se começa uma conversa e não se acaba uma conversa
quando se acaba uma conversa.
É indigno termos começado
certas conversas - o seu começo era já o seu fim.
A conversa era outra. É perturbador termos de acabar certas
- ter de ir embora, cansaço, fome, sono? - conversas.
A conversa era outra.
Ilusão do começo,
falácia da necessidade do fim. Não há fim
nem começo necessários. Nem para uma conversa.
O que é que vem interromper o que prossegue, o que se
prossegue, o que foi sempre já começado? Não
é o fim nem o começo.
Só quem conversasse por
conversar, verdadeiramente (essa suposição idiota),
poderia começar e acabar uma conversa, verdadeiramente.
Este "Se" é no entanto o horizonte de todas
as conversas, seja daquelas mais limitadas a uma forma, imbecil
ou socialmente conveniente, seja das que são habitadas
pelo informe - amizade, amor ou devir.
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