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Nunca foi fácil
falar de imagens. Menos ainda o é quando elas são
mágicas. Quando não sabemos bem donde provêm.
Que mecanismo, que iluminação, que irrupção
as fez surgir na imaginação do autor?
Lars Von Trier é um desses incansáveis, arrojados
e insondáveis inventores de imagens. E Europa talvez o
filme mais assombrado: a fotografia a preto e branco selecciona
o que se oculta e o que se deixa ver, as sombras predominam e
sublinham, quase nos adormecem, a cor incide em ideias e factos
(a morte, o pesadelo, o amor) e adensa-os, os espaços,
os cenários, os enquadramentos, tudo é pensado,
composto, como se cada elemento fosse obrigado a uma busca formal
até encontrar o seu espaço preciso. Há momentos
que nos recordam a pintura e a encenação clássicas,
há olhares femininos de pura volúpia e enigma,
há flocos de neve que parecem chuva de pétalas,
há uma montagem que faz estender e concentrar o tempo,
que nos prende e move como se uma hipnose nos fizesse entrar
dentro do ecrã para aí nos perdermos.
É um filme mágico porque nas transparências
e nas opacidades nos lembra a alquimia das primeiras imagens
fotográficas e o espanto dos primeiros filmes. Se não
fosse um filme tão obcecado com a experimentação
das formas, quase lhe chamaríamos um filme patológico.
Ou então tenta chegar às duas coisas ao mesmo tempo,
às imagens e às paixões, como parece acontecer
sempre na obra de Von Trier. |
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