Os filhos da
Mãe
Se está
a ler este texto, pode concluir desde já que sucumbiu
mais uma vez a uma das estratégias fundamentais que a
publicidade actual utiliza para chamar a atenção
dos potenciais destinatários: o choque (pela palavra,
pela imagem, pelo som, por tudo isto simultaneamente). A "moral"
(publicitária) é, obviamente, a de que todas as
estratégias são "boas" se são
boas para conseguirem tal objectivo, sendo tanto "melhores"
quanto melhor o consigam.
Mas, de facto, não era sobre a publicidade em geral que
queríamos chamar a sua atenção, mas sim
sobre uma campanha publicitária concreta - a "campanha
da Mãe" (reside aqui a verdadeira razão da
escolha do nosso título). O "choque" desta campanha
tem a sua origem na seguinte ideia: se é possível
vender políticos como se fossem sabonetes, então
também é possível vender sabonetes (os bens
de consumo) como se fossem políticos. A política
e o consumo são assim colocadas dentro da mesma lógica,
que é simultaneamente a lógica da aparência
(o que parece bom é bom), do descartável (consumir
e deitar fora) e do maquiavélico (os fins justificam os
meios).
Mas o mais chocante desta campanha é vermos que o seu
"choque" traduz aquela que é, em grande medida,
a realidade do nosso tempo. Basta percorrermos as páginas
dos jornais e revistas, as imagens dos noticiários televisivos:
a simpatia artificial esconde cada vez mais a ausência
das ideias, a palavra fácil a inexistência dos projectos,
a encenação mediática a falta das medidas
concretas. A política mostra-se cada vez mais como política-espectáculo,
como política dos políticos-sabonetes. A questão
que se coloca a cada um de nós é, então,
a de saber se a esta transformação da política
em publicidade e dos políticos em sabonetes só
poderemos responder como os "filhos da Mãe"
da campanha publicitária.
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