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Opinião      


 


José Geraldes

Audiências, dinheiro e parolice

Audiências e dinheiro. Este é o mote que se pode aplicar, sem exagero, à programação actual das televisões portuguesas. Não que se negue a legitimidade de as televisões quererem ter lucros. Mas haja, ao menos, um pouco de pudor!
Tudo se justifica para atingir a maior quota de percentagem das audiências. Faz-se contraprogramação à televisão concorrente. Mudam-se os horários dos programas sem preocupação de avisar os telespectadores. E com um total desprezo por eles.
Os concursos de dinheiro fácil tomaram de assalto os ecrãs. Concursos onde se espelha um País com manifesta falta de cultura geral a demonstrar um analfabetismo de arrepiar os cabelos. E um desejo incontido de ganhar dinheiro, sem esforço!
E, claro, há o Big Brother, o programa que bem se podia chamar de parolice nacional. Que já conseguiu bater a SIC, líder de audiências. E num dia em que Jorge Sampaio apresentava a sua recandidatura! Só pela saída de um senhor chamado Marco, por ter pontapeado uma tal Sónia que o havia provocado no ensaio da peça A Relíquia, de Eça de Queiroz.
A sujeição na casa do Big Brother de um grupo de indivíduos entre os 20 e os 30 anos de idade, a uma vida sem qualquer tipo de privacidade, acaba por ser uma tortura para a sua personalidade. E uma destruição de valores que definem o homem e a mulher, no seu todo.
Estes rapazes e raparigas, quando regressarem à vida real, nunca poderão ser os mesmos. Terão decerto notoriedade mediática, como aliás aconteceu já noutros países e está a verificar-se entre nós. Mas com franqueza! Um País colado às conversas parvas daquelas meninas e daqueles meninos, cheias de palavrões de mau gosto, cenas ridículas e de um vazio total nas suas vidas, mostra que "há algo de podre no reiono da Dinamarca".
Não pretendemos fazer moralismos. Mas ao sairmos nos nossos juízos do politicamente correcto sentimos nisso grande orgulho.
Os concursos do dinheiro criam nos telespectadores a promessa de "novos Eldorados". Enriquecer à custa de um concurso, em poucos minutos, será tão gratificante como em anos de trabalho ao serviço do bem comum numa empresa, no Estado, numa associação?
E a mentalidade que incrustam aos concorrentes? Copiados todos na América, estilo americano de viver, para quem o lucro é tudo na vida. Mas o dinheiro - todos o sabem por experiência - está longe de satisfazer as mais profundas aspirações humanas. E de encontrar um sentido para a vida.
É evidente que ninguém pode viver sem um mínimo de base financeira para se realizar como pessoa humana. E cumprir os deveres para com a família e a comunidade.
As televisões servem-se da tendência humana para este tipo de jogos de forma a terem o máximo de audiências. E nem a televisão vocacionada para prestar um serviço público, que suga dos impostos do contribuinte milhões de contos todos os anos, foge a este método.
Será servir o público basear a programação no binómio audiências e dinheiro? Nem o argumento de que quem não gosta muda de canal nos convence inteiramente. Os telespectadores não são um "rebanho de carneiros". Ou devemos concluir com Popper que a televisão acaba por ser nas nossas vidas não só "ladra" do tempo mas também "um perigo para a democracia"? E, como acrescenta Bourdieu, igualmente "faz correr um não menor risco à vida política"?

 

 

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