Audiências,
dinheiro e parolice
Audiências
e dinheiro. Este é o mote que se pode aplicar, sem exagero,
à programação actual das televisões
portuguesas. Não que se negue a legitimidade de as televisões
quererem ter lucros. Mas haja, ao menos, um pouco de pudor!
Tudo se justifica para atingir a maior quota de percentagem das
audiências. Faz-se contraprogramação à
televisão concorrente. Mudam-se os horários dos
programas sem preocupação de avisar os telespectadores.
E com um total desprezo por eles.
Os concursos de dinheiro fácil tomaram de assalto os ecrãs.
Concursos onde se espelha um País com manifesta falta
de cultura geral a demonstrar um analfabetismo de arrepiar os
cabelos. E um desejo incontido de ganhar dinheiro, sem esforço!
E, claro, há o Big Brother, o programa que bem se podia
chamar de parolice nacional. Que já conseguiu bater a
SIC, líder de audiências. E num dia em que Jorge
Sampaio apresentava a sua recandidatura! Só pela saída
de um senhor chamado Marco, por ter pontapeado uma tal Sónia
que o havia provocado no ensaio da peça A Relíquia,
de Eça de Queiroz.
A sujeição na casa do Big Brother de um grupo de
indivíduos entre os 20 e os 30 anos de idade, a uma vida
sem qualquer tipo de privacidade, acaba por ser uma tortura para
a sua personalidade. E uma destruição de valores
que definem o homem e a mulher, no seu todo.
Estes rapazes e raparigas, quando regressarem à vida real,
nunca poderão ser os mesmos. Terão decerto notoriedade
mediática, como aliás aconteceu já noutros
países e está a verificar-se entre nós.
Mas com franqueza! Um País colado às conversas
parvas daquelas meninas e daqueles meninos, cheias de palavrões
de mau gosto, cenas ridículas e de um vazio total nas
suas vidas, mostra que "há algo de podre no reiono
da Dinamarca".
Não pretendemos fazer moralismos. Mas ao sairmos nos nossos
juízos do politicamente correcto sentimos nisso grande
orgulho.
Os concursos do dinheiro criam nos telespectadores a promessa
de "novos Eldorados". Enriquecer à custa de
um concurso, em poucos minutos, será tão gratificante
como em anos de trabalho ao serviço do bem comum numa
empresa, no Estado, numa associação?
E a mentalidade que incrustam aos concorrentes? Copiados todos
na América, estilo americano de viver, para quem o lucro
é tudo na vida. Mas o dinheiro - todos o sabem por experiência
- está longe de satisfazer as mais profundas aspirações
humanas. E de encontrar um sentido para a vida.
É evidente que ninguém pode viver sem um mínimo
de base financeira para se realizar como pessoa humana. E cumprir
os deveres para com a família e a comunidade.
As televisões servem-se da tendência humana para
este tipo de jogos de forma a terem o máximo de audiências.
E nem a televisão vocacionada para prestar um serviço
público, que suga dos impostos do contribuinte milhões
de contos todos os anos, foge a este método.
Será servir o público basear a programação
no binómio audiências e dinheiro? Nem o argumento
de que quem não gosta muda de canal nos convence inteiramente.
Os telespectadores não são um "rebanho de
carneiros". Ou devemos concluir com Popper que a televisão
acaba por ser nas nossas vidas não só "ladra"
do tempo mas também "um perigo para a democracia"?
E, como acrescenta Bourdieu, igualmente "faz correr um não
menor risco à vida política"?
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