Público
por
Edmundo
Cordeiro
Os directores e os produtores
de televisão costumam justificar as suas escolhas com
o gosto do público. Fazem o que fazem e a televisão
é o que é porque é assim que o público
quer, e o esforço deles está em saber corresponder
o melhor possível às expectativas do público.
Dizem isto respondendo aos críticos de televisão
que consideram maus os conteúdos da televisão.
Reconhecem por isso que os conteúdos são maus e,
mais que isso, reconhecem que fazem conteúdos maus deliberamente,
estimando que fazer conteúdos maus deliberadamente requer
um rigoroso empenho profissional, tanto mais que, as audiências
provam-no, é isso que o público de televisão
quer. Os críticos de televisão criticam os conteúdos
de televisão porque acham que podiam não ser maus
ou, pelo menos, podiam ser melhores. Mas reconhecem que, as audiências
provam-no, estes conteúdos maus correspondem ao que o
público quer, donde, concluem eles, estes conteúdos
correspondem ao triunfo do público, do pior gosto do público,
a que chamam o gosto do povo. O pressuposto é que o povo
tem um gosto reles e que os directores e os produtores de televisão,
emboram tenham um gosto que não é reles ou que
é menos reles, são completamente dominados por
esse imperativo.
Mas um ligeiro desvio dos conteúdos de televisão
para a forma dos conteúdos de televisão, para o
media, um pequeno salto cheio de consequências, faria ver
que os produtos da televisão não são os
conteúdos mas o público, que as audiências
não avaliam o gosto do público mas o processo de
produção do público. A televisão
produz público.
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