Autoritarismo
na Academia
Um novo ano lectivo começa
e com ele retorna uma praga que parece assolar a nossa Academia,
bem como quase todas as outras neste país, por esta altura,
e que responde pelo nome de praxe.
Tal mal académico grassa pela UBI nos primeiros meses
de cada ano lectivo e no entanto parece ser tolerado abertamente
por quase toda a gente. Quase toda.
Existe uma enorme pressão na camada estudantil, e sei
disso porque já fui cá estudante, para que te 'integres',
ou melhor, para que pies fino e não vás contra
o status quo instituído. Isto é, que sejas carneirinho
nas tuas escolhas, que faças o que os outros te dizem,
para que mais tarde possas ser tu a mandar outros fazer o que
tu queres.
Este tipo de acção é claramente de teor
autoritário, assente em grande medida no medo que os recém-chegados
têm de vir a perder oportunidades académicas, como
a partilha de cadernos, a participação na latada,
etc., ou que sejam ostracizados. No entanto, a verdade é
bastante diferente - aqueles que praxam são, em boa parte
dos casos, aqueles que depois esquecerão aos praxados.
Existem excepções, como em tudo, mas o problema,
creio, está na base da questão: uma figura que
se julga com poder, exerce coacção sobre outra.
Mesmo que as intenções sejam boas, seja lá
isso o que for, só demonstra incapacidade do praxante
de integrar o praxado sem ser por esse mesmo meio absurdo - a
praxe.
Os argumentos da tradição e do espirito académico,
espécie de bandeira tímida que os praxantes gostam
de abanar quando se mostra a natureza das suas acções,
são facilmente abanáveis. Uma tradição
importada da Coimbra pré Maio de 68, onde as praxes serviam
para aniquilar qualquer espírito inconformista e anti-fascista
só poderá ser considerada como aberrante num Estado
de Direito e que se quer Democrático como o nosso. Por
outro lado, o espírito académico vê-se na
luta pelos direitos estudantis e não pelo vinho que se
emborca.
Uma situação que foi sempre silenciada, mas que
está, creio, mais 'leve', é a respeitante ao que
se passa nas Residências Académicas. Verdadeiro
palco de praxe, as residências, sobretudo as masculinas,
tiveram, ao longo da história ubiana, um rol de abusos
a serem cometidos diarimente durante os primeiros três
meses de cada ano lectivo. Privação de sono, jogos
de humilhação e espírito geral de caserna
de infantaria definiram, durante muito tempo, o teor autoritário
e militarista que lá se vivia, em que os 'sargentos' domavam
os 'magalas'. Desconheço se ainda será assim, mas
se o ambiente for tão coercivo como era 'no meu tempo',
então a Academia continuará alegremente a fazer
vista grossa desses abusos. E os estudantes a clamarem por justiça
no orçamento e por mais respeito pelos seus direitos,
quando entre eles existem muitos que, com 'poder' nas mãos,
fazem exactamente o mesmo que o Ministério da Educação
com eles. Mas claro, quando somos nós a oprimir não
é opção, é integração,
certo?
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